domingo, 12 de dezembro de 2010

Também possuo uma vida e devo vivê-la. Nada


de vinganças;

que poderia, mais uma morte, arrancar à morte,

sobretudo uma morte violenta? E que poderia

acrescentar à vida? Os anos

passaram. Não sinto ódio; esqueci, talvez?, estou

cansado? Não sei.

Até sinto uma relativa simpatia pela criminosa;

ela mediu abismos imensos,

um grande crescimento fez crescer-lhe os olhos

na obscuridade

e ela vê - vê o inesgotável, o irrealizável, o imu-

tável. Ela vê-me.

Também eu quero ver o assassínio de meu pai na

totalidade apaziguadora da morte,

esquecê-lo na morte completa

que também nos espera. Esta noite revelou-me

a inocência de todos os usurpadores. E todos somos,

de um modo ou outro, usurpadores - estes dos

povos, dos tronos,

aqueles do amor ou da morte; minha irmã

usurpadora da minha única vida; e eu da tua.


Yannis Ritsos. poemas. Selecção e Trad. de Egito Gonçalves. Prefácio de Carlos Porto. 1ª ed. Fevereiro, 1984. Editora Limiar., p.66

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