Por Paulo
Nogueira
Até quando nossa paciência vai aguentar o ministro Gilmar
Mendes? A grande sentença de Cícero contra o conspirador Catilina lembrada esta
semana na operação da PF que enfim deu um tranco em Eduardo Cunha se aplica a
Gilmar. Até quando vamos aturá-lo? O Brasil está se reconstruindo. Haverá lugar
para um juiz que toma decisões políticas, sem nenhum pudor, e não técnicas?
Para um juiz que vai de microfone a microfone na mídia amiga para fazer pronunciamentos
políticos? Há tempos Gilmar age de maneira incompatível com a dignidade de um
juiz, mas esta semana ele escalou degraus. Na sessão do STF que definiu o
procedimento do impeachment, seu voto foi uma torrente de insultos ao governo.
Ninguém mais fez isso. Mesmo os que voltaram com ele se detiveram em sua
interpretação da Constituição. Não bastasse isso, num protesto patético num
homem de sua idade, saiu no meio dos debates sob a alegação de que teria que
viajar. Ora, ora, ora. Que viagem seria tão importante assim para ele abandonar
o plenário num momento de tamanha relevância para o país? O mais provável é que
ele tivesse ficado revoltado ao ver que o voto de Fachin, que ele endossou,
fora surpreendentemente atropelado depois da divergência de Barroso, este sim
um exemplo de compostura. Não foi tudo. No dia seguinte, numa entrevista à
Jovem Pan, Gilmar desqualificou seus pares ao dizer que o STF foi cooptado pelo
governo. Ele usou, mais uma vez, a palavra bolivarianismo, que para ele
simboliza uma Justiça que se pauta pela política. De novo: ora, ora, ora. Que
juiz é mais bolivariano que Gilmar? Ele faz do STF uma tribuna política desde
sempre. Quem o indicou foi FHC, que promoveu um aparelhamento terrível da
Justiça. Num perfil louvatório escrito para uma revista da Folha anos atrás,
Eliane Cantanhede citou as ligações de Gilmar com o PSDB. Repare. Eu escrevi
citou, e não acusou. Também ela pertencente ao Planeta Tucano, Eliane não se
deu conta da gravidade do que escrevera num texto em que as adulações não se
limitaram a Gilmar e se estenderam para sua mulher. A semana da infâmia de
Gilmar se completou com uma entrevista dada à jornalista Mariana Godoy. Ele
chamou Dilma de poste, sem nenhuma hesitação. Mariana ficou desconcertada. Tudo
isso posto, até quando vamos ter que aturá-lo? Há uma evidente quebra de decoro
no comportamento de Gilmar. Juízes não podem agir assim. Tente encontrar em
sociedades avançadas um juiz como ele. Impossível. Num Brasil melhor, não cabem
Gilmares. Não estou dizendo que um juiz não possa ser conservador como ele.
Pode. É do jogo. Mas é inaceitável que aja como um torcedor de futebol, como um
bolivariano exaltado e tolo. Quebra de decoro num juiz do STF pode resultar em
processo e afastamento, diz a Constituição. É uma decisão que caberia, na etapa
final, ao Senado. Está escrito. É crime de responsabilidade, num juiz,
“proceder de modo incompatível com a honra, a dignidade e decoro de suas
funções”. Alguém tem definição melhor para o que Gilmar vem fazendo?