Jose Alvaro Moises
10 de fevereiro próximo a São Paulo
Não estou seguro de que todas as pessoas responsáveis desse
país - inclusive meus colegas da universidade e, especialmente, os cientistas
políticos - estão se dando conta de modo completo das implicações e das
consequências do retorno da violência na vida pública brasileira. Só não vê
quem não quer que o clima de mal estar com o funcionamento da democracia - e em
grande parte com o governo de Dilma Roussef e do PT - está dando lugar a
iniciativas as mais variadas que, antes de se apoiar no diálogo, na negociação
e nas instituições de representação - usam a violência como forma de protesto,
de ação e de expressão. A morte de um jornalista, os ônibus queimados, os
abusos das milícias, e também das polícias, o pânico da população - tudo está
dando sinais de que, aos poucos, em todas as esferas da vida o conflito
legítimo de sociedades complexas como a nossa está sendo tratado como se sua
única solução fosse o uso da força, da violência e da depredação. Não me digam,
por favor, que os governos ditos de esquerda ou seus opostos, os conservadores,
estão sabendo o que fazer, nem que os partidos de qquer orientação estão
conectados com a população. Não importa mais a controvérsia se o
presidencialismo de coalizão funciona ou não, o que precisamos perceber é que o
país está entrando em um clima e em uma atmosfera perigosa, que ameaçam a
democracia, a convivência social e tranquilidade das pessoas. Acho melhor olhar
isso de frente logo, com clareza e percepção, e começar a pensar em saídas para
tudo isso do que esperar o caos se instalar. Desculpem-me o desabafo, mas estou
sufocado pela apreensão pelo que estou vendo ocorrer no Brasil contemporâneo,
sem vislumbrar saídas de lado nenhum. Queria saber aonde estão as nossas
lideranças, e o que elas têm a dizer de tudo isso.
Vera Zaverucha "Que ameaçam a democracia, a convivência
social e a tranquilidade das pessoas"..
Na verdade, a força, a violência e depredação são artifícios
de guerra para espantarem a população. Ninguém quer mais ir às ruas pois temem
serem rechaçadas. Os black blocs são uma farsa. São pessoas programadas para
desfazer manifestações e causar transtornos.
.
Adilson Simonis Caro Professor, solidarizo-me com seu
oportuno desabafo. Apenas tento agregar a ideia de que este lamentável episódio
dos Blacs está muito parecido com o assassinato em Sarajevo do Arquiduque
Império Austro-Húngaro Francisco Ferdinando pelo sérvio nacionalista Gavrillo.
Adilson Simonis Continuando: não foi a causa mas uma
manifestação de muitas variáveis que levaram ao ato violento. Cabe-nos trazer a
complexidade a toma. Você tem um papel merecido neste aspecto. Abraços
Jose Alvaro Moises Pois é Adilson, tem algo de muito
estranho nisso, tudo a indicar que se trata de algo articulado e não
espontâneo, embora não seja claro ainda com que objetivos. E a perplexidade
parece ser geral, porque agora, com exceção de uma ou outra pessoa públic...Ver
mais
Jose Alvaro Moises A esquerda tem medo de constatar a
violência e suas consequências por que já flertou e ainda flerta com ela. A
direita só vai até o pedido de repressão sem querer olhar as causas. M
Jose Alvaro Moises Mas o mais grave é que as chamadas
lideranças democráticas não tenham nada a dizer, estão guardando um silêncio
sepulcral como se o país não estivesse entrando - em ritmo ainda local e de
pequenas proporções - em convulsão.
Jose Alvaro Moises Não acho que seja o caso de exagerar no
diagnóstico, mas os sinas não são bons e pedem atenção e soluções, rápidas,
eficazes, antes que se acumulem os efeitos negativos do que está ocorrendo.
Adilson Simonis Pois caro amigo, a questão econômica está
pegando. A incapacidade do modelo vigente se sustentar e a falta de proposta da
oposição (no máximo manter o tripé do Palocci via Rede) fazem que a pasmaceira
reine. O que tah pegando como dizem os jovens eh a crise energética (dizem que
o apagão derrubou FHC) . Pois bem, cade os pensadores para propor avanços
sociais aos que terão que devolver o carrinho pois não conseguem pagar o Ipva
(35 porcento do Pibinho em postos) significa uma barreira capitalista de
acumulação que, mesmo ela, não pode gerar riquezas sem estabilidade política.
Vocês sociólogos tem que se manifestarem; nos estatísticos estamos vendo a
coisa feia e pode piorar. Abraço
Ernesto Heine O grande trunfo do governo é ter amarrado
muitos setores da indústria ao BNDES e a empréstimos com prazos a vencer em
período que precede eleições. O BNDES, empreiteiras, imprensa e etc são
máquinas muito eficientes de manipulação e em um período de crise a quantidade
de setores endividados é imensa. Ninguém quer abrir a boca e ser liquidado.
Como as lideranças políticas tem uma corda atrelada ao setor econômico.... não
restam dúvidas que está tudo muito amarrado. Esta corda precisa ser rompida
através da reforma política. É o ponto alto da questão.
Adilson Simonis Caro Ernesto; defina reforma política, por
favor. Voto distrital, fundo partidário diferente do de hoje ou manter o
financiamento público. Onde reformaram?
Jose Alvaro Moises Adilson, ao menos penso que não podemos
mais continuar com financiamento privado no volume que ocorre no Brasil. A
França e a Alemanha proibiram as empresas de financiar partidos e candidatos. Pode
ser um começo. E precisamos mudar o sistema político, o sistema proporcional
atual retira poder dos eleitores, não é bom. E o presidencialismo de coalizão
concentra poderes demais nas mãos do Executivo, enfraquece no Legislativo e
estimula o Judiciário a judicializar a política. Temos de reequilibrar o
balanço de poderes republicanos, e restaurar o interesse público na vida
política.
Claudia N. Paiva Eu não entendo quem é chamado de direita ou
esquerda nesse caso, pq o grupo no poder se diz esquerda, e os manifestantes
nas ruas, anarquistas.
As manifestações começaram pacíficas e foram reprimidas
violentamente até que só sobrassem black blocs nas ruas. Essa repressão foi
aceita pela opinião pública, única revista a reclamar foi a isto é. Agora está
formada a confusão.
Ernesto Heine Adilson Simonis, estava escrevendo, mas o
Prof. Moisés respondeu de modo ainda mais completo. Restaurar o interesse
público na vida política é essencial também. A juventude está muito
despolitizada. Não há uma geração de pensadores e quem é mais pensante, hoje
tem medo de opinar... ou então carece de liderança.
Adilson Simonis O setor privado não joga dinheiro fora. O
estado deve intervir onde falta dinheiro (Monte Belo jah deveria estar pronta).
Na época da UDN havia tão pouco dinheiro que chamar aquilo de financiamento
privado foge ao meu entendimento histórico. De qualquer maneira, gostei da sua
resposta.
Para a Claudia Paiva, chamo a atenção ao conceito que ajudou
a condenar alguns no processo do mensalão; domínio do fato.
Adilson Simonis Ernesto, obrigado pela resposta. Eu não
procuro lideranças (jah basta minha mulher que manda em mim) e como dizia um
personagem de quadrinhos; soja tenho medo que o céu caia na minha cabeça. Boa
noite a todos, sempre aprendo com os amigos da área de Humanas...
Jose Alvaro Moises A esquerda está no governo, mas não no
poder, embora compartilhe partes dele. A direita está em alguns estados, tem
poder econômico e dirige o capitalismo no país. Os manifestantes não são todos
anarquistas, apenas alguns, a maioria pediu mais democracia. Agora, os black
blocs... além de vândalos são provocadores, mas não está bem claro a serviço de
quem... talvez do crime organizado, os traficantes e contrabandeadores de
armas.
Jose Alvaro Moises E também expressam um fenômeno mais
profundo de marginalidade, desigualdade e deslocamento social - mas nada disso
justifica o uso da violência e da força. Isso é próprio da direito, como
fizeram durante a ditadura, no nazismo e na fascismo; e, infelizmente, as vezes
também na antiga União Soviética.
Angélica Salazar Pessôa Mesquita Prof. Jose Álvaro Moisés,
como sempre o senhor foi brilhante nos seus comentários. Mas, na minha opinião
a esquerda já deixou de flertar com a violência. Elas estão de braços dados,
defendendo direitos para bandidos e mais deveres para os cidadãos de bem.
Claudia N. Paiva Duvido muito q black blocs estejam a
serviço de quem quer q seja. Acompanhei as discussões das pag do anonymous e
dos black blocs, fui as manifestações maiores. Houve um momento (está no
youtube) em frente a prefeitura em q acredito q a guera começou. Um homem
bombado (e talvez cheirado) q a multidão pedia à polícia p retirar e a polícia
ameaçava quem pedia de cadeia. Depois a polícia usou esse homem de pretexto p
iniciar a repressão. Acho q existiu uma sensação de massacre e injustiça pela
polícia quando eles começaram a reprimir as manifestações sem nenhuma
justificativa moral razoável, e mais revolta ainda quando ficou patente o uso
de p2 pela polícia para culpar manifestantes. O caso do Bruno mostrou q a
polícia pode incriminar um inocente a hora q quiser. Muitas prisões
injustificadas foram flagradas por populares. Os black blocs tomaram a função
de "defesa da multidão", são equivocados no seu entendimento do
problema e nas suas táticas q estão longe de ser só defesa, mas não são coesos,
de fato, pela própria natureza anarquista da maioria de seus integrantes.
Renato Perissinotto Penso que existem diferentes violências
oriundas de diversos lugares na sociedade, mas me parece que elas se unificam a
partir de um lugar: o Estado brasileiro. Seja pela presença seja pela ausência,
o Estado brasileiro é fonte/incentivo à violência. Quando ausente, cria uma
estrutura de oportunidades para que a violência entranhada na sociedade
brasileira se manifeste, como no caso do garoto amarrado ao poste; quando se
faz presente humilha a população pela ineficiência (seja ao prestar serviços,
seja quando os regula) ou pela repressão. Como você disse, isso gera um ambiente
perverso, em que a direita demanda mais repressão e parte da esquerda (?),
ultraminoritária, aposta na violência como fim em si mesmo, como um primeiro
recurso. Na minha opinião, o problema da reforma do Estado brasileiro, para
além da bobagem do Estado mínimo ou da antinomia infrutífera entre empresas
estatais ou privadas, é o tema ausente mais importante da agenda política.
Reforma no sentido de, por um lado, recapacitá-lo a ser coordenador de ação
coletiva e implementador de um projeto de longo prazo que transcenda o curto
prazo das eleições e, por outro, no sentido de republicanizá-lo, de colocá-lo a
serviço da população e não contra ela. Mas para isso, seria preciso um pacto
entre lideranças políticas e forças socioeconômicas em nome de um projeto de longo
prazo. Quem seria capaz de encaminhar isso? Não vejo ninguém à altura e isso
também me preocupa muito.
Alba Zaluar Em março do ano passado fui gratuitamente
ofendida e agredida por jovens, aliás com sotaque paulista, alguns com
máscaras, na saída da inauguração do MAR, museu na cidade do Rio de Janeiro.
Barraram a minha passagem por um corredor (polonês), depois me deixaram passar
gritando que eu fedia e era uma burguesa! Portanto muito antes de qualquer
manifestação de rua no Rio de Janeiro. Não havia PMs no local, apenas a
segurança da presidente Dilma que nada fez. E eu saí mais cedo porque cansei de
esperar pela comitiva dela para ouvir os discursos e finalmente visitar o
museu. Esse movimento estava sendo gestado há muito, alimentado lamentavelmente
pelas ideias de alguns professores. A partir desse momento, comecei a me
perguntar o que estava acontecendo e, claro, me postei contra essa inútil forma
de agredir quem não tem nada com quem manda no país.
Jose Alvaro Moises Me solidarizo inteiramente com minha
querida colega Alba Zaluar. O relato dessa experiência humana horrível que a
atingiu é um exemplo importante dos riscos que estão surgindo ao direito à
vida, à livre expressão e à participação irrestrita na vida política e social.
Quando um de nós é ameaçado, todos estamos sendo ameaçados e, nesse caso, é
sinal de desconhecimento e de desprezo pela inestimável contribuição da Alba,
precisamente ao nosso tema, o uso da violência na vida pública.
Evelyn Levy Me identifico com aqueles que estão perplexos e
igualmente expresso minha profunda preocupação. Também acredito que não estão
surgindo lideranças para interpretar e propor caminhos. Nesse sentido seria
muito bom se você, Moisés - e o NUPPs- pudessem abrir o espaço para o debate.
Especialmente por que acho que a situação é mais complexa do que estamos
acostumados: há novos atores e novas formas de expressão se misturando a velhos
interesses. Também não acredito que possamos atribuir a responsabilidade
exclusivamente ao Governo Federal. Acredito que se não formos capazes de fazer
uma interpretação correta dessas múltiplas influências - a economia da droga,
por exemplo, como indicou ontem o Governador Anastasia -não saberemos formular
propostas eficazes de ação política.
Wagner Iglecias Caro Prof. José Jose Alvaro Moises, sua
preocupação é muito legítima e pertinente, ainda mais neste momento em que o
ambiente político-partidário anda tão envenenado. Entendo sua mensagem como um
convite a que todos aqueles da comunidade acadêmica interessados em debater de
maneira franca o país e saídas para seus problemas que o façam. Apenas não
creio que avançaremos se partimos da premissa de que o esgotamento da paciência
da população é com o partido A ou o partido B. Parece-me que é geral, e não
apenas com partidos ou com este ou aquele nível de governo. Muita gente anda
farta do governo federal, dos governadores, dos prefeitos. E não só. As pessoas
estão também cansadas do Congresso Nacional, dos deputados estaduais,
vereadores, juízes, promotores de justiça, de certos comunicadores da midia
etc. Estão ainda fartas da forma como são tratadas pelas empresas de telefonia,
bancos, operadoras de cartão de crédito, companhias aéreas, TVs a cabo e tantos
outros segmentos.
Jose Alvaro Moises O debate está aberto e todos podem participar
dele. Por outro lado, concordo que a insatisfação é geral, atinge a todos. Mas
alguns tem mais responsabilidade do que outros, especialmente, os que fizeram o
seu prestígio e sucesso eleitoral em torno da ideia de que estavam reformando a
política. Ao não reformarem, e pelo contrário a degradarem mais ainda, deixaram
um vazio ético, moral e político que agora está deixando o país sem rumo e as
pessoas sem esperança. Todos os partidos estão falhando e são deficitários, mas
alguns são mais do que outros, a história registra isso sem piedade. Temos de
ter clareza e cobrar isso de quem deve ser cobrado, sob pena de fraudarmos a
nossa própria percepção, mas não acho mais que o momento é para isso.
Jose Alvaro Moises João, não dou brecha nenhuma, sou bem
conhecido - e, aliás, criticado - por ser um crítico duro do PT, não apenas por
causa da sua política nos últimos 11 anos, mas por causa do seu projeto de
poder, e dos seus objetivos de longo prazo. Como fui fundador do partido, e
participei dele por mais de 10 anos, sei bem do que estou falando. Quanto ao
mais, respeito suas opiniões e da maior parte dos que tem participado do
debate, embora não de todos.
João Weber Jose Alvaro Moises, meu ponto não é esse, e nem
você especificamente. O "projeto de poder" do PT é o projeto de poder
da esquerda por excelência.
Os governos Lula e Dilma representam DE FATO a esquerda - em
todos os aspectos. Dissociar o "projeto de poder" petista da esquerda
é problemático. Não acho possível separar uma coisa da outra, assim como não é
possível dissociar a TFP da "direita".
Sei que não há mais consenso acadêmico a respeito dos termos
"direita" e "esquerda", e portanto trato a dicotomia como
uma questão autointitulada. É de esquerda quem se diz de esquerda.
Jose Alvaro Moises Então, aos poucos o mistério está se
revelando... resta saber como o governo vai reagir, assim como os líderes da
oposição - o momento exige uma tomada de posição clara das pessoas responsáveis
Ernesto Heine Isso no fundo é bom. Antes da copa e bem
próximo às eleições, está se desenhando um clima de novos protestos. Desta vez
com envergadura ainda maior. A mudança acontecerá.
Os pedidos dos manifestantes não foram atendidos. Nenhum...
Apenas alguns elementos de agenda foram apressados. Para piorar a questão da
copa está machucando demais. Pensou-se que o povo queria só futebol. Isso
acabou.
Seria muito bom que estas investigações sejam concluídas
rapidamente, para que o momento eleitoral seja ao gosto da população. Para que
haja um clima de confraternização, de alegria democrática...
Joel Formiga Acreditar que os black blocs são um movimento
popular legítimo, independente do julgamento que se faça dos seus métodos e
táticas, seria um ato de fé e uma esperança na capacidade de mobilização
política da população da qual não comungo. Infelizmente, são, na minha opinião,
jovens alienados comoois demais brasileiros, aliciados por uma remuneração, e
no máximo unidos por uma aversão à Polícia e às autoridades. Movimento legítimo
seria o dos rolezinhos, interessados em fazer uma farra aqui ou ali, e
indiferentes às questões sociais, raciais ou políticas que, por mais que a
mídia tenha tentado, não colaram. Legitimamente apolíticos.
Me resta compartilhar das preocupações e do pessimismo do
Prof. Moisés - ainda vai piorar muito antes de melhorar. O atual ambiente tem
potencial explosivo e destrutivo na hipótese possível se não improvável de uma
crise econômica.