«Todos os impulsos, as emoções, as manifestações
de vontades imagináveis, todas estas contingências da alma humana lançadas pela
razão na imensidade negativa da noção de «sentimento», podem ser expressas por
meio da multidão infinita das melodias possíveis, mas sempre exclusivamente na
generalidade da forma pura, sem a substância, sempre somente como coisa em si,
e não como aparência, de algum modo como a alma da aparência, incorporalmente.
Esta relação íntima, que existe entre a música e a verdadeira essência de todas
as coisas, explica-nos também por que, quando com pretexto de uma cena, de uma
ação, de um evento, de um ambiente qualquer, ressoa uma música adequada, esta
parece revelar-nos a significação mais secreta e afirmar-se como o mais exato e
mais luminoso dos comentários; compreendemos igualmente como é que aquele que
se abandona sem reservas à impressão produzida por uma sinfonia julga ver
desenrolar-se perante os seus olhos todos os acontecimentos imagináveis da vida
e do mundo.»
Nietzsche, 1872
in A Origem da Tragédia
Guimarães Editores, p.130