sexta-feira, 14 de abril de 2017

Comentários soltos ao Relatório Parcial da Comissão Especial da Reforma Política na Câmara dos Deputados


BRUNO P. W. REIS·SEXTA, 7 DE ABRIL DE 2017

Recortes do relatório em pílulas, seguidos de minhas impressões em itálico.
 
Dois eixos essenciais e imediatos:
1) o estabelecimento do financiamento público de campanhas combinado com doações de pessoas físicas
A criminalização das doações privadas, alcançando agora até as doações legais, tornam efetivamente inviável, pelo menos por algum tempo, a existência de doações privadas volumosas. Mas isso não é um bem em si. Não é uma conquista. É um preço que pagaremos pela aberração que foi a adoção de tetos proporcionais à renda dos doadores (só o Brasil tem isso). Se as fontes forem devidamente pulverizadas por tetos nominais da ordem de uns 5 mil reais para pessoas físicas (aí incluídas as autodoações) e 50 mil para pessoas jurídicas por ciclo eleitoral (valores altos o bastante para viabilizar uma campanha por esforço próprio de arrecadação, mas baixos o bastante para impedir que um doador exerça patronato exclusivo sobre uma campanha), então a existência de um mercado pujante de financiamento privado será um sintoma de saúde da democracia, baixando as barreiras à entrada e viabilizando desejável arejamento do sistema partidário, sem necessariamente desestabilizá-lo. O financiamento público é necessário, mas não deveria ser exclusivo – ou tão esmagadoramente dominante.
2) a instituição de listas partidárias preordenadas para as eleições proporcionais.
Sou até suspeito pra falar. Sou o mais enfático defensor da lista preordenada que eu conheço. Já escrevi rios de bytes sobre isso aqui no Facebook, e pelo menos dois artigos um pouco mais extensos: este aqui (http://interessenacional.com/index.php/edicoes-revista/tirando-os-partidos-do-armario/), de 2010, e este outro, talvez mais amadurecido (http://www.fpabramo.org.br/publicacoesfpa/wp-content/uploads/2015/06/Reforma-política-BAIXA.pdf, pp. 121-141), de 2015.
Entre várias reações contrárias às listas e, sobretudo, uma óbvia hostilidade da imprensa, tem sido possível detectar certa hostilidade por jovens militantes em início de carreira, preocupados com suas perspectivas eleitorais sob a lista. Como me disse um amigo, estes jovens, atraídos pela possibilidade de se elegerem, “rejeitam veementemente a possibilidade de ter de entrar na fila, pra quem sabe um dia se elegerem”. Isto me parece uma claríssima ilusão. Vão ter de se submeter muito mais duramente ao tacão de algum chefe eterno, inamovível, para terem chance sob a lista aberta. Em convenções, basta a exigência de voto secreto para o controle dos dirigentes sobre os resultados ser gravemente erodido.

Outras mudanças, para complementar os dois eixos.
a) o aprimoramento dos instrumentos de democracia direta
Campo minado, a ser explorado com extremo cuidado. A tentação nessa direção é grande numa conjuntura como a nossa. Mas tudo o que menos precisamos nesse momento é que penosos acordos políticos nessa quadra difícil venham a ser desautorizados por plebiscitos explorados taticamente por demagogos para fins estratégicos pessoais. Estão aí o Brexit e, principalmente, o acordo de paz na Colômbia, para nos advertir da gravidade dos riscos implicados. Mesmo no que toca à vida partidária, na forma da exigência de prévias, eu iria com cuidado. Um diretório regional orgânico, constituído por facções de longa militância, com convivência arduamente construída sobre compromissos políticos longamente decantados, pode se ver atropelado numa prévia por um esforço de filiações por aventureiros bem financiados com precário vínculo partidário. É preciso lembrar: alargar a abrangência de uma disputa é aumentar o peso do dinheiro no seu resultado.
b) a alternância de gênero na composição de listas partidárias,
A viabilização de quotas variadas (gêneros, raças etc.) é um dos principais trunfos da lista preordenada. Eu não correria direto para uma quota 50/50 de gêneros, porém. Pois esta é a melhor maneira de se neutralizar politicamente um tema muito relevante e que deveria ser melhor explorado. Se todos os partidos são obrigados a intercalar homens e mulheres pela metade, imediatamente todos os partidos atendem a quota, e vai ser difícil explorar nas campanhas a eventual diferença entre uma lista repleta de mulheres com histórica militância partidária de uma lista repleta de esposas e filhas de caciques. Já se a quota é um piso de, digamos, no mínimo uma mulher a cada três nomes, o partido que quiser emitir um recado mais claro nessa matéria terá a oportunidade de, ao superar o piso, emitir um recado, tematizar o assunto agressivamente na campanha e tentar capitalizar o debate.
c) ajustes no processo de registro de candidaturas
Brevíssimo comentário adiante.
d) mais rigor na fiscalização da divulgação de pesquisas eleitorais.
O melhor antídoto contra a existência de más pesquisas eleitorais é a existência de muitas pesquisas eleitorais. Ainda mais com a viabilização contemporânea de mecanismos de identificação de tendências pela agregação quase instantânea dos resultados de todas as pesquisas que quisermos, em busca das médias perceptíveis por debaixo do ruído produzido pela inevitável variação de cada uma. Por isso é contraproducente a introdução de mecanismos que podem inibir a divulgação de pesquisas. Quanto menos pesquisas houver, maior a chance de manipulação das expectativas pela divulgação de um resultado "fora da curva". E, não importa o rigor adotado, sempre é possível um resultado anômalo. O Brasil já é um país que impõe exigências consideráveis para a divulgação de pesquisas. Criar dificuldades ainda maiores é um tiro no pé. O simples blecaute ao final da campanha proposto deixa o eleitorado no escuro enquanto a elite política, sozinha, consome suas “internas” e decide se vale a pena propalar boataria. Não, obrigado: quero ser bem informado até o dia da eleição, e entendo que eu tenho o mesmo direito que os candidatos quanto a isso.
As mudanças propostas para o sistema eleitoral devem valer apenas para as eleições de 2018 a 2022. A partir de então, caso aprovada Proposta de Emenda à Constituição também aqui incluída para análise, passaria a vigorar o sistema distrital misto.
É meritória a tentativa de, ao propor algo que pareça viável aqui e agora, não se perder de vista algum objetivo de longo prazo, que se exprima numa proposta eventualmente considerada ideal mas de adoção impraticável para já. Pessoalmente, considero os sistemas mistos arranjos engenhosos e defensáveis, em que pese as dificuldades imediatas em sua operacionalização. Contudo, os legisladores devem ter em mente que, uma vez introduzida qualquer mudança, ela produz efeitos imediatos no alinhamento dos interesses atuantes no sistema, mudando a configuração de forças. Ou seja, na ausência de um aprofundamento contínuo da crise, é provável que os vencedores em 2018 e 2022 venham a se mostrar interessados na manutenção das regras eventualmente adotadas agora e passem a obstruir a mudança prevista para 2026. E se por acaso a crise continuar a se agravar, de todo modo a mudança produzida agora será fragilizada e todo o processo poderá ser abortado, revertido, ou receber nova direção. Ou seja, é bastante improvável que a trajetória imaginada aqui agora se viabilize até 2026. Nada disso impede a proposição de um plano, claro. Acredito que os legisladores tenham clareza quanto a isto.
70% dos recursos provenientes do FFD em pleitos para cargos do Poder Executivo e 30% em pleitos para cargos do Poder Legislativo.
Por que não deixar os partidos decidirem quanto a isso? A única razão que consegui imaginar foi evitar possível "predação financeira" das campanhas ao legislativo pela voracidade da chapa para o executivo. Nesse caso, deveria ser fixado um piso de 30% como o mínimo a ser gasto nas campanhas para o legislativo.
Extinção das coligações proporcionais.
Até que enfim! Já vem tarde... A sugestão das federações partidárias, no entanto, previstas no relatório Caiado em 2003, é engenhosa, e pode se constituir em oportuna bóia de sobrevivência para partidos menores. Poderia ser usada para negociação no Congresso. Ela é bem superior às coligações porque os partidos federados na campanha terão de continuar a atuar como um único partido durante a legislatura. Por isso eu sugeriria que sua duração mínima fosse de quatro anos (o relatório de 2003 sugeriu três anos).
Exigir que a formação das listas seja precedida de convenções, prévias ou primárias para a escolha de seus candidatos.
Convenções, claro que sim. O relatório de 2003 determinava também que, nelas, o voto fosse secreto. Quanto a prévias ou primárias, esse é um terreno onde eu só avançaria com extremo cuidado. Como eu disse antes, tipicamente elas favorecem o poder econômico – mais do que as convenções.
Vedar o repasse de financiamento público para partidos que mantenham para além de um período razoável a provisoriedade de seus órgãos dirigentes.
Excelente medida. É preciso fazer disseminar os diretórios regionais e municipais, e coibir a eternização das comissões provisórias.
Proporção de pelo menos um gênero distinto para cada 3 colocações.
Agora vi que o piso é de pelo menos 1/3. Apoio a proporção, pelo motivo que já expus acima.
Regulamentação do “Recall”
Como regular de maneira justa o "recall" sob sistema proporcional em distritos com magnitudes altas como as nossas? Ninguém vai sobreviver, e a ameaça pelos adversários vai servir para a intimidação de parlamentares em sua atuação política.

Apresentação de projetos de Decreto Legislativo destinados a convocar plebiscitos e referendos,
I. apresentados por qualquer membro ou comissão do parlamento, sem  necessidade de apoiamento de um terço dos pares exigido pela lei atual
Relativamente inócuo. De todo modo, o projeto tem de ser votado e aprovado por maioria qualificada, não? O único efeito que imagino é seu eventual uso pela minoria como eventual integrante de arsenal obstrucionista, com parlamentares da oposição propondo plebiscitos a toda hora para botar maiorias governistas na defensiva. Não sei se gosto do cenário...
II. tramitar a partir de solicitação específica do Presidente da República
Acho altamente problemático e indesejável. Será uma excelente maneira de presidentes tentarem pressionar e eventualmente intimidar o Congresso, ameaçando-o com a convocação de plebiscitos toda vez que tiverem dificuldades com sua agenda no Congresso.
III.  tramitar a partir de solicitação específica dos cidadãos, desde que observados os  mesmos requisitos de subscrição da iniciativa popular de leis
Só se o Congresso puder emendar o projeto proposto, caso aprovado no plebiscito. É preciso notar que, na iniciativa popular de leis, o povo propõe, mas depois o projeto tramita normalmente no Congresso. Se for possível substituir a tramitação por um plebiscito, o debate parlamentar e a necessária barganha entre os interesses afetados ficarão prejudicados.

Explicitar a possibilidade da realização de plebiscitos e referendos concomitantemente com eleições gerais e municipais.
Boa ideia.
Subscrição eletrônica de projetos de iniciativa popular
Ok. Entendo que seria oportuno viabilizar também sugestões de emendamento popular de projetos em tramitação, a partir de plataformas wiki. Naturalmente, tais sugestões poderão ser acatadas ou não pelos relatores dos projetos. Além de poder fornecer desejável massa crítica às discussões, essa iniciativa também viabilizaria a vocalização de interesses por grupos menos organizados, num esforço de contrabalançar a influência desproporcional de alguns lobbies mais poderosos.

AJUSTES NA LEGISLAÇÃO
É a parte que contempla, digamos, as mudanças mais gratuitas. Poderão vir ou não a produzir melhorias, é difícil dizer, em alguns casos. Podem também servir para negociação posterior durante a tramitação da reforma, mas poderão também vir a onerar a proposta, desviando o foco de discussões bem mais importantes.
Fim dos vices.
É a proposta mais inesperada, mas talvez não seja má ideia... É uma função frequentemente ociosa, e ocasionalmente desestabilizadora. Provavelmente seria melhor que não existisse mesmo.
Fim da reeleição, com mandatos únicos de cinco anos.
Mais controvertido. A experiência sob FHC e Lula foi positiva, e mesmo no âmbito municipal há alguma pesquisa que sugere bons resultados da continuidade administrativa, embora haja queixas também sobre esquemas de poder relativamente invulneráveis que teriam sido criados. Mas não acho interessante a troca por mandatos de cinco anos. Isso não apenas produzirá desencaixe entre as eleições para o executivo e o legislativo, mas fará com que cada mandato no executivo tenha um encaixe específico com as eleições legislativas. Ok, em princípio, que haja eleições parlamentares a meio mandato do governante. Mas é mais problemático que isso se dê de maneira ora coincidente, ora no meio, ora no último ou no primeiro ano de mandato do governante. Cada mandato executivo terá um encaixe diferente com o calendário legislativo, e receio que isso dificulte sobremaneira o estabelecimento de alguma rotina associada à articulação e à composição de maiorias parlamentares. Levaríamos décadas para experimentar e tentar entender como se dá a dinâmica esperável em cada tipo de encaixe.
Proibição de que parlamentares ocupem postos no Poder Executivo.
Discordo. Isso enfraquece ainda mais o Congresso numa relação que já é assimétrica e desfavorável com o Poder Executivo. Ministério é função política, não técnica. Idealmente, ministros devem ser políticos, assessorados por técnicos, que deveriam se restringir ao segundo escalão. Que eles tenham inserção parlamentar é uma consequência natural da participação dos partidos na formulação das plataformas e prioridades dos governos, bem como na negociação das maiorias no parlamento. Impedir parlamentares de participarem de ministérios diminui o peso dos partidos na formação dos governos e diminui a importância das plataformas partidárias nas eleições legislativas. Vai na contramão daquilo que se espera ganhar com as listas preordenadas.
Mudanças nas regras para suplência de mandatos de Senador.
Um suplente apenas (hoje são dois), e eleição de senador na eleição seguinte em caso de substituição definitiva. Ok, melhora.
Mandatos de membros de tribunais.
Dada a deterioração do decoro na conduta pública dos atuais ocupantes de cadeiras em tribunais superiores, a introdução de mandato fixo é imperiosa. Dez anos me parecem adequados, para se começar. Medida muito bem-vinda.
Registro prévio de candidaturas.
Sim, a Justiça Eleitoral se ressente hoje dos prazos exíguos com que tem sido cada vez mais confrontada. Outra coisa que se poderia cogitar é a antecipação das eleições ou o adiamento das posses, buscando assegurar que todo recurso contra resultados eleitorais possa ser julgado de modo terminante antes da diplomação dos eleitos. É grave a possibilidade de que um político possa ter sua eleição contestada quando já exerce o mandato. Isso poderá ser (e de fato tem sido) utilizado de maneira estratégica por seus adversários, desestabilizando o exercício do poder democrático pelos eleitos.
Tornar mais rígido o processo de contratação e divulgação de pesquisas eleitorais.
Discordo enfaticamente, dei minhas razões no início.

Íntegra do relatório aqui: http://www.camara.gov.br/proposicoe...


Viva a sociedade alternativa, mais uma metamorfose ambulante, como diria Raul Seixas ! Manoel Correia Defreitas (Paranaguá, 1851- Curitiba, 1932) foi um dos mais importantes republicanos históricos do Paraná e de Santa Catarina. O resgate existencial, familiar, social, cultural e político deste importante personagem, praticamente "esquecido" pela memória oficial, foi o tema da tese de doutorado em sociologia brilhantemente defendida ontem por Ana Vanali. A tese avançou nas relações entre biografia e teoria sociológica, as origens sociais das velhas famílias da "nobreza da terra" do Litoral entre Paranaguá e São Francisco do Sul, o fim da escravidão, as mudanças sociais no fim do Império, os ideais da República. Manoel estava no Rio de Janeiro no dia 15 de novembro de 1889 e presenciou os acontecimentos da Proclamação da República. As intensas lutas pela institucionalização republicana, as exclusões e a Revolta Federalista. Os cargos e o impedimento no Senado. A oligarquização familiar e as estruturas políticas elitizadas das primeiras décadas republicanas. A morte de Vicente Machado e Manoel Correia Defreitas como parlamentar estadual e federal, depois da Coligação Repúblicana de 1908. As novidades na virada do século e associações como o Clube Curitibano, a maçonaria, o espiritismo, os círculos católicos. As lutas populares, a Revolta do Contestado. A oligarquia Camargo-Munhoz da Rocha, o afastamento e ostracismo final de Manoel Correia Defreitas. A vida cultural e intelectual do ativista. Os cadernos pessoais de recortes, os panfletos, textos, os materiais políticos e culturais preservados. A família de Manoel redescoberta pela tese e os descendentes ocultos pelos biógrafos do passado. Ainda no final da vida um encontro com o quiromante Sana Khan e a previsão de poder com Getúlio Vargas ! A República que ainda não "aconteceu" de Manoel Correia Defreitas pela falta de cidadania e de justiça no Paraná e Brasil. Uma tese e um futuro livro a serem estudados por todos os interessados nestas temáticas. Agradecemos a participação e presença de todos colegas na banca, acadêmicos e amigos no processo coletivo de todos e novamente parabéns à nova Doutora Ana Vanali !

RCO

O temido dia seguinte após a liberação do Listão da Odebrecht mostra que a montanha pariu o rato. A maior consequência imediata deveria ser o afastamento sob suspeição, até para que possam se defender, dos 8 ministros do governo golpista de Temer denunciados, o que inviabilizaria as reformas golpistas em crise no executivo. Eliseu Padilha, Moreira Franco, Kassab, Aloysio Nunes, Bruno Araújo, Blairo Maggi, Barbalho e Marcos Antonio Pereira deveriam sair se o protocolo mínimo democrático fosse aplicado, o que não é o caso de um governo golpista, impopular e ilegítimo. Para a manipulação da grande mídia oligárquico-familiar o ataque principal é contra Lula e depois Dilma. Um dos telejornais abriu com a "imensa" quantia de 15 mil Reais supostamente aplicados no tal sitiozinho popular, que nem está no nome ou pertence a Lula, o que mais uma vez torna ridículas as acusações sem provas e a notória e abjeta perseguição dos marajás do judiciário e mp contra o maior líder popular brasileiro. As denúncias no legislativo misturam propinas abertas, como a de Serra e muitos no PSDB, com outras doações legalizadas oficialmente em campanhas. O Presidente do Senado Eunício Índio e o da Câmara, Rodrigo Botafogo, membros de oligarquias familiares, também deveriam ser afastados das presidências pelo protocolo não cumprido. Para os parlamentares que não são petistas o caminho será a morosidade intencional do sistema judicial e a prescrição, como sempre acontece nesses casos. Somente quadros do PT são presos e o partido é o grande alvo da seletividade judicial, como praxe do partidarismo dessas operações. O impacto prático do listão tende a ser muito menor do que se imaginava e para os interesses de muitos na classe dominante, cada vez mais desmoralizada, os golpes dentro do golpe estão chegando nos seus limites finais já bastante confrontados pelas novas lutas populares, como a greve geral marcada no dia 28 de abril. As denúncias da Odebrecht apenas revelaram as entranhas do sistema político e a cultura da impunidade nas atuais instituições políticas. Sem eleições diretas a credibilidade, o crescimento e a legitimidade política não voltarão ao Brasil

RCO
Marcelo Odebrecht disse o óbvio: "Não existe ninguém no Brasil eleito sem caixa dois". Não é o partido x ou y, mas o sistema político que condiciona a vitória eleitoral ao recebimento de todo tipo de doação irregular, muitas das quais baseadas no "toma lá, dá cá". Podem crucificar este ou aquele, para fingir que houve justiça, mas, sem a mudança do modelo como os partidos e os candidatos financiam suas campanhas, as eleições continuarão sendo definidas pelo Caixa 2 e a relação público/privado será movida à propina. Não é razoável que seja imposto ao candidato uma barreira econômica, transponível apenas quando aceita estas regras do jogo. Hoje, por uma decisão do STF, de fato, os candidatos não podem mais receber doações de empresas e há um teto para os valores de campanha. Isso é positivo. Mas, se esses recursos empresariais chegam por meios ilícitos e representam a maior parte das receitas das campanhas, então a norma torna-se inócua. Penso que o sistema eleitoral, bem como o funcionamento das instituições políticas, precisam de mudanças radicais para superarmos esse modelo degenerado, permitindo uma fiscalização efetiva e uma disputa mais programática. Todavia, cada dia fica mais claro que não serão os atuais deputados federais, eleitos por esse atual modelo, nem os próximos, caso a estrutura seja a mesma, que o farão. Seria necessário uma constituinte soberana, com deputados eleitos por listas e com financiamento exclusivamente público, para promover essas transformações. Em 2014, mais de 7,4 milhões de brasileiros já disseram querer essa alternativa. Agora, diante ao desmonte da Constituição e dos direitos sociais por esse Congresso de ladrões, é necessário reabrirmos esse debate.

ACBM

1863: Estados Unidos abolem a escravidão


Em 1° de janeiro de 1863, entrava em vigor o Ato de Emancipação assinado pelo presidente Abraham Lincoln. O ponto central da lei era a libertação de cerca de 4 milhões de escravos negros.


A abolição visava também acabar com os maus-tratos impostos aos negros nos EUA

"Não haverá tranquilidade nem sossego na América enquanto o negro não tiver garantidos os seus direitos de cidadão… Enquanto não chegar o radiante dia da justiça… A luta dos negros por liberdade e igualdade de direitos ainda está longe do fim", declarou Martin Luther King na lendária marcha pelos direitos civis rumo a Washington em 1963.

Essa era a situação nos Estados Unidos cem anos após a abolição da escravatura através da chamada Emancipation Proclamation, promulgada a 1° de janeiro de 1863 pelo presidente Abraham Lincoln.
Desde o início da colonização, em 1619, quando os primeiros escravos chegaram a Jamestown, os problemas da escravidão e a luta pela libertação dos negros marcaram a história dos EUA e, muitas vezes, dividiram a nação.

Às vésperas da Guerra da Secessão (1861–1865), 8 milhões de brancos e 4 milhões de negros (cerca de 500 mil livres) viviam no Sul dos EUA. A estrutura agrária servia de argumento para se afirmar a necessidade da escravidão na região. A discriminação racial era justificada pela crença na suposta desigualdade entre os seres humanos.

Estopim do conflito

Quando o Congresso proibiu oficialmente a importação de escravos em 1808, ninguém imaginava que as divergências entre o Norte industrializado e o Sul agrícola fossem se agravar tanto, a ponto de culminar numa guerra civil. A escravidão foi o estopim do conflito, mas suas causas foram um complexo emaranhado de fatores socioeconômicos e político-culturais.

Na primeira fase do conflito, o Norte lutou pela unidade da nação e não pela abolição da escravatura. Tanto que o presidente Abraham Lincoln escreveu a um jornalista: "Se eu pudesse salvar a união sem libertar um único escravo, eu o faria".

Ao ver que os nortistas não conquistavam vitórias decisivas, Lincoln aderiu às reivindicações dos republicanos radicais e abolicionistas, e transformou a guerra contra os "Estados rebeldes" numa luta contra a escravidão.

Proibição tardia

Os Estados do Norte vincularam ao Ato de Emancipação de 1° de janeiro de 1863 uma reestruturação do sistema social do Sul. Os negros passaram a ser recrutados pelo exército nortista, mas a proclamação de Lincoln não significou uma abolição institucionalizada da escravatura.

Os 4 milhões de negros ainda tiveram de esperar até dezembro de 1865, quando o Congresso proibiu oficialmente a escravidão nos Estados Unidos através da 13ª Emenda Constitucional.

Pelo artigo suplementar 14, os negros obtiveram direitos iguais aos brancos em 1868. Dois anos mais tarde, o artigo 15 garantiu-lhes a igualdade de direito eleitoral. Estados como Carolina do Sul, Mississippi e Louisiana, porém, deram um jeito de burlar os direitos dos escravos libertados, mantendo restrições legais, os chamados black codes.

Alguns Estados e municípios, não só no Sul dos EUA, encontram ainda hoje meios e caminhos para "manter o negro em seu lugar". Vinculam, por exemplo, o direito de votar a complicadas provas ou inatingíveis patamares de renda mínima.

Igualdade não concretizada

Uma situação que persiste até a atualidade, segundo Martin Luther King 3º, filho do líder negro assassinado: "Naturalmente, hoje temos liberdade de opinião, imprensa e religião. Mas algumas outras liberdades faltam. Basta pensar, por exemplo, nos altos escalões empresariais, claramente dominados por homens brancos. Por isso, temos de nos esforçar para sermos a nação que pretendemos ser".

A Declaração de Emancipação de Lincoln não conseguiu acabar, de repente, com a humilhação da raça negra. Ela também não impediu a violência contra os negros. Ao contrário, motivou até mesmo a criação de sociedades secretas, como a Ku Klux Klan, que estabeleceram como objetivo manter a hegemonia branca no Sul do país. Uma prova do êxito desse tipo de organização é que somente em 1967 foram anuladas as últimas leis de proibição de casamentos mistos.

Autoria Michael Kleff (gh)


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1865: Abraham Lincoln é assassinado


Em 14 de abril de 1865, Abraham Lincoln foi assassinado num teatro. O 16º presidente dos EUA impediu a divisão do país em norte e sul e entrou para a história como abolicionista.


Maior trunfo de Lincoln foi manter país unido

Às 22h15 de 14 de abril de 1865, no Teatro Ford, pouco antes do último ato da peça Our American Cousin ("Nosso primo americano") a porta do camarote onde estavam o presidente dos Estados Unidos, Abraham Lincoln, e sua esposa abriu-se de repente e o chefe de Estado foi baleado na nuca pelo ex-ator John Wilkes Booth. Assim morria o 16º presidente dos EUA, que impedira a divisão do país em norte e sul, entrando para a história como abolicionista.

Cinco dias antes, em 9 de abril, o general dos estados do sul, Robert Lee, havia admitido sua derrota. Um público entusiástico presenciou, nas escadarias da Casa Branca, em Washington, o anúncio do fim da guerra civil. Ao ouvir as palavras do presidente, principalmente a promessa de conceder o direito ao voto aos ex-escravos, o ex-ator – um sulista fanático – decidiu assassinar Lincoln.

Em meio à guerra civil, no verão de 1864, Booth já havia tentado, sem sucesso, sequestrar o odiado presidente e usá-lo como refém para exigir a libertação de prisioneiros de guerra dos confederados. Diante da derrota dos estados do sul, abandonou a ideia do sequestro e passou a planejar o assassinato.
Foi o primeiro de uma série de atentados contra os presidentes dos EUA. Lincoln faleceu na manhã de 15 de abril, deixando como herança de governo um país que procurava se reconciliar, após quatro anos de sangrenta guerra civil.

Biografia

Abraham Lincoln nasceu em Hodgenville, Kentucky, em 12 de fevereiro de 1809. Filho de lavradores, teve que interromper várias vezes sua formação escolar para trabalhar, seja na roça, numa serraria ou em barcos dos rios Ohio e Mississipi. Em 1836, formou-se em direito e passou a exercer a advocacia. No ano seguinte, mudou-se para Springfield, Illinois, à procura de melhores oportunidades profissionais.

Filiado ao partido Whig (que deu origem ao partido Republicano), elegeu-se quatro vezes para a assembleia estadual, entre 1834 e 1840. No início de sua carreira política, era um abolicionista reservado. Embora considerasse a escravatura uma injustiça social, temia que a abolição dificultasse a administração do país. Entre 1847 e 1849, foi representante de Illinois no Congresso, onde propôs a emancipação gradativa dos escravos, desagradando tanto aos abolicionistas quanto aos escravistas. Opôs-se à guerra no México, o que lhe custou a reeleição.

Depois de cinco anos afastado da política, candidatou-se ao Senado, em 1858. Foi derrotado pelo democrata Stephen Douglas, mas tornou-se líder dos republicanos, sendo eleito presidente dos EUA em 1860. Ao iniciar seu governo, em 4 de março de 1861, Lincoln teve que enfrentar o separatismo de sete estados escravocratas do sul, que formaram os Estados Confederados da América.

O presidente foi firme e prudente: não reconheceu a secessão, ratificou a soberania nacional sobre os estados rebeldes e conclamou-os à conciliação, assegurando-lhes que nunca partiria dele a iniciativa da guerra.

Os confederados, porém, tomaram o Forte Sumter, na Virgínia Ocidental, em 12 de abril de 1861, desencadeando um conflito que só terminou em 1865, com a vitória do norte e um saldo de 618 mil mortos em batalhas e vítimas de epidemias.

Histórica batalha de Gettysburg

Lincoln encontrara o governo sem recursos, sem Forças Armadas e com uma opinião pública pouco favorável. Armou rapidamente um Exército para enfrentar os confederados que, apoiados por 11 estados sublevados, chegaram à Pensilvânia e ameaçaram Washington. Em 3 de julho de 1863, travou-se a histórica batalha de Gettysburg, vencida pelos unionistas do norte.

Alguns meses depois, ao inaugurar o cemitério nacional de Gettysburg, Lincoln pronunciou o célebre discurso em que definiu o significado democrático do governo do povo e para o povo, que alcançou repercussão mundial. Reeleito presidente em 1864, anunciou um programa de educação dos escravos libertados e a concessão imediata do direito de voto a determinados negros.

Cedeu também à exigência dos radicais que pediram uma ocupação militar provisória de alguns estados do sul, para implantar uma política de reforma agrária. Seu grande mérito, no entanto, foi ter mantido a unidade do país.

Autoria Jens Teschke (gh)


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