17/08/2015 Flavio Morgenstern
Texto publicado na edição impressa da Gazeta do Povo de 17 de agosto de 2015
Nenhuma palavra é mais usada no vocabulário político do que
“fascismo”, e nenhuma parece mais apartada da realidade. Vendo os discursos de
políticos, jornalistas e intelectuais no Brasil, parece que sairemos à rua e
nos depararemos com camisas negras, glorificações a Mussolini e exigências de
tudo ser colocado dentro do Estado, nada fora do Estado, nada contra o Estado.
Na vida real, não vemos nada disso. Aliás, vemos o último: mas quem pede a
estatização total da vida são justamente os que mais acusam os outros de
fascistas.
Isso tem explicação. Lew Rockwell já alertou, em A ameaça
fascista, que nenhuma outra palavra é mais pesada no vocabulário político.
“Fascismo” é visto como o mal em si, algo que une a direita e a esquerda em seu
repúdio. Entretanto, ao se pedir para as mesmas pessoas que detestam fascistas
que descrevam o sistema político que defendem, muitas acabarão justamente
defendendo o fascismo.
Sobretudo graças ao Holocausto promovido pelos nazistas,
espécie de ultrafascistas, a narrativa histórica parece apenas promovê-los como
assassinos desmotivados. Pelo contrário: o genocídio fascista do século 20
tinha profunda base filosófica – o que é uma violência ainda mais perigosa. E
esta base continua movendo corações e políticas mundo afora.
O grosso do fascismo é justamente o que é defendido pelos
supostos “críticos”, que adoram chamar seus adversários de fascistas
O jornalista John T. Flynn analisa os pontos que definem um
governo fascista. O governo é totalitário, pois desconhece limites para seu
poder. É uma ditadura, baseada no princípio da liderança. Permite algum
mercado, mas atolado numa imensa burocracia. A economia é cartelizada e
controlada por sindicatos. O planejamento econômico é baseado no princípio da
autarquia. O governo se sustenta com gastos e empréstimos. Os gastos são sobretudo
militares, e com fins imperialistas. Excetuando-se estas últimas definições,
nada muito diferente do sistema atual do Brasil, por exemplo. Para subir ao
poder, fascistas disputam eleições livremente, e logo começam com conchavos com
empresários que aceitem trocar a livre concorrência no mercado por monopólios
com o Estado. Familiar?
Tentar encarar o fascismo apenas pelo militarismo tampouco
convence. Fascistas promovem amplas campanhas de desarmamento para concentrar o
poder nos líderes do Estado. Parece com os militares brasileiros ou com seus
críticos, hoje no poder?
O coletivismo é a tônica, com total subordinação das
liberdades individuais – seja ter uma opinião, escrever em um jornal ou criar
uma empresa e lucrar o quanto quiser – aos ditames de um Estado total, com um
planejamento central. Parece mais algo de “coxinhas” ou justamente dos
progressistas atuais?
Na narrativa típica, vemos o fascismo por seus aspectos
periféricos. Na realidade, o grosso do fascismo é justamente o que é defendido
pelos supostos “críticos”, que adoram chamar seus adversários de fascistas.
Inclusive os judeus, as maiores vítimas dos fascistas, foram vítimas justamente
por serem a “burguesia”, a elite de hoje.
Xingar um fascista de fascista não ofende. Todavia, chamar alguém
que repudia o fascismo disso ofende. Sem perceber, ao chamar tudo de
“fascista”, progressistas não percebem que provam que os liberais são
radicalmente adversários do fascismo.
Flavio Morgenstern é analista político e autor de “Por trás
da máscara – do passe livre aos black blocs”.