devo
chegar com meus lábios
aos seus olhos iluminados
e então hei de me surpreender com as veias pulsando de
leve,
suboculares,
e hei de compreender: é por causa de sua transparência
e de seu incorpóreo
que são assim claros e doentes
esses olhos ligeiramente trêmulos
e eu hei de amá-la com minhas mãos e meus lábios,
com o silêncio, o sono e as ruas dos meus versos
com a mentira - para o Estado
com a verdade - para a vida.
Guenádi Aigui
*tradução Boris Schnaiderman
domingo, 23 de janeiro de 2011
NUVENS
Nesta
aldeia de ninguém
trapos indigentes nas cercas —
teréns de ninguém.
E sobre elas nuvens de ninguém,
e adiante — anúncios sobre a infância:
crianças esquálidas, bravias;
e música sobre o nu
de mulheres hunas e citas;
e aqui, no leito, ao rés dos olhos,
algures, junto a pestanas úmidas,
alguém morria e chorava,
enquanto eu compreendia
de uma vez por todas — era
minha mãe.
1960
Tradução: Haroldo de Campos e Boris Schnaiderman
aldeia de ninguém
trapos indigentes nas cercas —
teréns de ninguém.
E sobre elas nuvens de ninguém,
e adiante — anúncios sobre a infância:
crianças esquálidas, bravias;
e música sobre o nu
de mulheres hunas e citas;
e aqui, no leito, ao rés dos olhos,
algures, junto a pestanas úmidas,
alguém morria e chorava,
enquanto eu compreendia
de uma vez por todas — era
minha mãe.
1960
Tradução: Haroldo de Campos e Boris Schnaiderman
Para falar de poesia
Falar de poesia é falar do nada
ou possivelmente de algumas raias externas
(onde a língua se devora)
discernindo ou determinando um desejo
penetrar este nada, uma lei, um olho
para encontrá-lo em si mesmo, presente em nada
Impossível !
A morte não pode ser trocada por outra coisa.
Sinceridade – é o processo insaciável
de transição, de flutuação, em sentido oposto,
ou seja, eu-te-amo-não-te-amo
desaparece à beira da consciência
Não há mais tempo para a expressão
Eliminada pela simultaneidade
Onde achar um homem dançando como uma vela?
Escute, como o segundo milênio
a água avança sobre as margens – algas
A pétala-da-abelha seca seus lábios: pó em seus pés
seus quadris e ombros expostos
Lembro-me do tempo quando a lâmpada de querosene
noite fria o lilás brilhava verde, como um nervo
O halo da chama do querenosene, um hemisfério esmeralda
atraía mariposas do escuro.
O arco zênite de agosto, uma foice estrelada,
revelando os traços honestos da matéria,
pálpebras rasgadas.
Uma tela e letras, esta é a estória,
arquivo pulsante do nadir e nele, como a queima
de mariposas,
a descrição da noite aparece. Os ramais
do jardim pegam fogo,
campos magnéticos de palavras aparecem, tensos,
entrelaçados ao nada. O que mais posso falar!
O que mais dizer?
Deslizando dentro de você, no delta no meio do rio
abrindo-se, como um arco,
cuja corda está corroída
pelo silêncio.
Arkadii Dragomoshchenko
Tradução: Régis Bonvicino
ou possivelmente de algumas raias externas
(onde a língua se devora)
discernindo ou determinando um desejo
penetrar este nada, uma lei, um olho
para encontrá-lo em si mesmo, presente em nada
Impossível !
A morte não pode ser trocada por outra coisa.
Sinceridade – é o processo insaciável
de transição, de flutuação, em sentido oposto,
ou seja, eu-te-amo-não-te-amo
desaparece à beira da consciência
Não há mais tempo para a expressão
Eliminada pela simultaneidade
Onde achar um homem dançando como uma vela?
Escute, como o segundo milênio
a água avança sobre as margens – algas
A pétala-da-abelha seca seus lábios: pó em seus pés
seus quadris e ombros expostos
Lembro-me do tempo quando a lâmpada de querosene
noite fria o lilás brilhava verde, como um nervo
O halo da chama do querenosene, um hemisfério esmeralda
atraía mariposas do escuro.
O arco zênite de agosto, uma foice estrelada,
revelando os traços honestos da matéria,
pálpebras rasgadas.
Uma tela e letras, esta é a estória,
arquivo pulsante do nadir e nele, como a queima
de mariposas,
a descrição da noite aparece. Os ramais
do jardim pegam fogo,
campos magnéticos de palavras aparecem, tensos,
entrelaçados ao nada. O que mais posso falar!
O que mais dizer?
Deslizando dentro de você, no delta no meio do rio
abrindo-se, como um arco,
cuja corda está corroída
pelo silêncio.
Arkadii Dragomoshchenko
Tradução: Régis Bonvicino
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