sexta-feira, 9 de junho de 2017

Guerra de classes



Não há dúvidas de que adentramos uma quadra histórica marcada pela guerra da burguesia contra o povo pobre e trabalhador.

Publicado em 09/06/2017

Por Ruy Braga.

Enquanto o julgamento da chapa Dilma-Temer desenrola-se no Tribunal Superior Eleitoral, o governo golpista faz de tudo para avançar com a contrarreforma trabalhista nas comissões que avaliam o mérito das propostas no Senado Federal. Aparentemente desconectados, tratam-se de dois debates intimamente ligados. Não é segredo que a sobrevivência do governo depende da aprovação das contrarreformas trabalhista e previdenciária em curso. A natureza do golpe parlamentar de 2016 revela-se muito mais na pilhagem aos direitos dos trabalhadores do que na tentativa de políticos acuados pela operação Lava Jato de livrarem-se da cadeia.

Afinal, caso não demonstre plena operacionalidade na aprovação das contrarreformas, o governo Temer não terá servido ao seu propósito original: promover o ajuste estrutural da economia brasileira no sentido de consolidar um regime de acumulação por espoliação no país. Eis a razão, mesmo diante da profundidade da crise política que assola Brasília, dos parlamentares preferirem avançar com a votação da contrarreforma. O interesse das empresas deve ser assegurado a qualquer custo, ainda que as medidas em trâmite no Congresso conduzam o país de volta ao século XIX.

Foram mais de cem alterações na CLT. O pacote de maldades contra o trabalhador brasileiro é muito grande pra ser detalhado neste espaço. No entanto, do ponto de vista da essência do projeto, isto é, a dominância do negociado sobre o legislado, é importante destacar que dos cerca de 13.000 sindicatos atuantes no setor privado existentes hoje no país, a esmagadora maioria funciona como uma espécie de fiscal da CLT, pois, simplesmente não tem condições de negociar com as empresas benefícios reais para os trabalhadores.
Neste contexto, afirmar a dominância do negociado significa eliminar, em termos práticos, muitas conquistas históricas da classe trabalhadora brasileira. O avanço da mercantilização do trabalhador levará, fatalmente, ao aumento da insegurança das próprias relações trabalhistas. Afinal, imaginem o que não aconteceria se, subitamente, os trabalhadores representados por um sindicato inexpressivo percebessem que seus representantes assinaram um acordo que, em termos práticos, acabará com o décimo terceiro salário, etc. A aprovação da contrarreforma criará uma situação potencialmente explosiva no país, com um compreensível aumento da violência nas relações de trabalho.

Em relação à flexibilização da jornada, o grande risco é a generalização do trabalho intermitente com a multiplicação daquilo que na Europa é chamado de “mini job”. O trabalhador fica em casa esperando receber uma mensagem de texto do empregador dizendo onde e quando ele deve se apresentar para o trabalho. Assim, o trabalhador permanece totalmente à mercê das flutuações da demanda e sem nenhuma previsão de quanto receberá no fim do mês, tendo em vista que o empregador paga apenas pelo tempo efetivamente trabalhado. Trata-se de um retrocesso que nos remete aos primórdios do capitalismo, quando a forma típica de remuneração era exatamente o salário por peça produzida pelo operário.

Além disso, as formas precárias de contratação, normalmente associadas aos contratos terceirizados para os trabalhadores subalternos e ao chamado “pejotismo” para os quadros mais qualificados, deverão se banalizar em um futuro próximo. Em suma, todos perdem renda e têm sua carga de trabalho aumentada. Jornadas mais longas e salários menores: os empresários desejam impor aos trabalhadores um verdadeiro desmanche do sistema de proteção do trabalho. Assim, além dos ganhos imediatos em termos de espoliação dos rendimentos do trabalho, os empresários buscam alcançar outro objetivo igualmente importante: deslegitimar as formas de reivindicação historicamente criadas pelos trabalhadores em seu processo de construção classista.

Quando nos referimos à CLT, estamos falando sobre um momento decisivo de um longo ciclo de mobilizações dos grupos subalternos brasileiros que, em termos globais, vai da Greve Geral de junho-julho de 1917, até meados dos anos 1930, com a mal sucedida insurreição comunista contra a ditadura do Estado Novo. A promulgação da CLT coroou este ciclo por meio de uma série de concessões materiais aos trabalhadores e que foram estratégicas para o esforço industrializante do país. Além disso, a legislação trabalhista delimitou, pela primeira vez na história brasileira, um espaço de conflitos políticos reconhecido como legítimo para as classes subalternas. Em outras palavras, por meio da mobilização pela efetivação dos direitos trabalhistas, existentes na forma da lei, mas ausentes na realidade das empresas, os subalternos apropriaram-se de uma gramática política que foi largamente empregada nas lutas sociais dos anos 1950, 1960 e 1970. Isso sem mencionar a influência desta dinâmica coletiva na conquista dos direitos sociais universais garantidos pela Constituição de 1988.

Neste sentido, o atual desmanche da CLT faz parte de uma ampla reação antipopular cujo vértice consiste em deslegitimar as lutas sociais no país a fim de aprofundar a exploração e a dominação dos trabalhadores. E caso a contrarreforma trabalhista seja aprovada, os golpistas sepultarão um século de lutas sociais em benefício de uma cidadania salarial inclusiva. Nesse contexto, os trabalhadores pagarão o pato da crise por meio da evaporação dos rendimentos e da ampliação das jornadas de trabalho. A desigualdade social vai aumentar, minando as bases da retomada do crescimento econômico. Não há dúvidas de que adentramos uma quadra histórica marcada pela guerra da burguesia contra o povo pobre e trabalhador.

Cenário de guerra em Brasília durante o ato que reuniu 150 mil manifestantes pela saída imediata de Michel Temer da presidência, eleições diretas já e o fim das reformas previdenciária e trabalhista. Foto: Mídia Ninja.

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Ruy Braga, professor do Departamento de Sociologia da USP e ex-diretor do Centro de Estudos dos Direitos da Cidadania (Cenedic) da USP, é autor, entre outros livros, de Por uma sociologia pública (Alameda, 2009), em coautoria com Michael Burawoy, e A nostalgia do fordismo: modernização e crise na teoria da sociedade salarial (Xama, 2003). Na Boitempo, coorganizou as coletâneas de ensaios Infoproletários – Degradação real do trabalho virtual (com Ricardo Antunes, 2009) e Hegemonia às avessas (com Francisco de Oliveira e Cibele Rizek, 2010), sobre a hegemonia lulista, tema abordado em seu mais novo livro, A política do precariado: do populismo à hegemonia lulista. É também um dos autores dos livros de intervenção Cidades rebeldes: Passe Livre e as manifestações que tomaram as ruas do Brasil (Boitempo, Carta Maior, 2013) e Por que gritamos golpe? Para entender o impeachment e a crise política no Brasil (Boitempo, 2016). A Boitempo prepara para 2017 o lançamento de mais novo livro A rebeldia do precariado. Colabora para o Blog da Boitempo mensalmente, às segundas.
Fonte : blog da boitempo


Complexo de vira-lata. O incrível nas eleições britânicas, além dos poucos partidos, do voto facultativo e da ausência de urnas eletrônicas, é que os candidatos ouvem a aclamação dos resultados uns ao lado dos outros e os perdedores congratulam os vencedores da apuração nos distritos. Um dia eles chegarão ao nível do Brasil, com urnas eletrônicas, voto obrigatório e um "presidencialismo de coalizão" onde o sentido de lealdade à Nação e o respeito mútuo entre os concorrente predominam...

Sérgio Braga

Ainda bem que são contra as oligarquias familiares !

Vocês sabiam que o Ministro do STJ, atual destaque como relator da ação contra a chapa Dilma-Temer no TSE, Antonio Herman de Vasconcellos e Benjamin é primo do Senador José Agripinio Maia (DEM), de Lavoisier Maia e do atual Presidente da Câmara dos Deputados Rodrigo Maia ? São parentes pela poderosa oligarquia familiar Maia, da Paraíba e Rio Grande do Norte ! Consultem a tese e o livro do Marciano Monteiro_A Política como Negócio de Família. Antonio Herman é filho do médico Antonio Benjamin Filho e Iracema Fernandes Maia, neto materno de João Sérgio Maia (1907 - 1984), desembargador do Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba, presidente do Tribunal Regional Eleitoral. Antonio Herman se formou em direito pela UFRJ e foi do MP do Estado de São Paulo. Ainda bem que são contra as oligarquias familiares !

RCO
Não quero ser estraga-festa de ninguém mas, se a experiência do governo Dilma serve para alguma coisa, ela nos ensina que o impedimento é um processo incremental cheio de idas e vindas, e que são necessários pelos menos os seguintes elementos para um impeachment ser bem-sucedido: (i) crise ou desaceleração econômica; (ii) oposição da grande mídia; (iii) grandes manifestações populares nos centros urbanos; (iv) manifestações contrárias do grosso do empresariado; (v) fuga em massa dos partidos da base governista, especialmente do centro fisiológico (PMDB, PSD, PP etc.); (vi) o cometimento de uma besteira monumental na articulação política do governo, ou a impossibilidade de entabular negociações críveis com o político mediano no sentido amplo do termo. Até agora, só observei duas dessas condições. Portanto, a expectativa é de prolongada agonia pela frente. A ver...

Sérgio Braga
Diz a lenda que Karol Woltijla foi escolhido papa por ser o único cardeal a realmente acreditar em Deus. Por aqui, estamos todos em busca de um político honesto e que não tenha recebido doação eleitoral via Caixa 2 para suceder Temer, numa eventual eleição indireta. Quem sabe o Tiririca. Pelo menos é garantia de que a coisa não pode piorar ainda mais.

Sérgio Braga

Lembrai-vos da República de Weimar

Sérgio Braga___________De te Fabula narratur. Lembrai-vos da República de Weimar: todos achavam que Hitler não chegaria ao poder porque seus argumentos eram muito primários e ele não passava de um austríaco provinciano e de poucas luzes, incompatível com a democracia de um país culto e de tradições cívicas e intelectuais como a Alemanha.... isto posto, considero que argumentos excessivamente intelectualizados e citações eruditas para mostrar que um procurador da República não sabe exatamente do que está falando quando cita Maquiavel, podem ter um efeito exatamente inverso ao pretendido, no atual contexto brasileiro. Chucro ou não, provinciano ou não, o fato é que o procurador tocou num problema que cala fundo na imensa maioria da opinião pública brasileira: a corrupção. Se o sistema político e os partidos de esquerda não derem respostam imediatas e contundentes a este problema, a crise persistirá. Sugiro que sigam o exemplo do Magnífico Reitor da UFPR: perante acusações de corrupção, conduções coercitivas e todo o circo armado pela autoridades investigativas, imediatamente convocou uma entrevista coletiva e mandou investigar e punir os responsáveis, além de anunciar uma série de medidas moralizantes para a instituição. Mutatis mutandis, penso que mais do que discutir Maquiavel e efetuar exibições desnecessárias de erudição, nossos políticos deveriam anunciar um pacote de medidas moralizantes para melhorar a qualidade da democracia brasileira e garantir eleições gerais limpas o mais breve possível... Certamente não faltarão cientistas políticos eruditos e honestos para colaborar com as autoridades competentes neste quesito específico.

Dennison de Oliveira_______________Lembrai-vos da República de Weimar: todos achavam que Hitler não chegaria ao poder mas no parlamentarismo imperial deles Hindenburg  topou convidar um cara que tinha menos de um terço dos votos na ultima eleição e muito menos votos que teve na eleição anterior para formar um desgoverno de colisão desde que o sujeito de bigodinho ridículo topasse mandar os deputados dele obstruir a CPI do crédito agrícola onde o próprio presidente-imperator e seus amiguinhos latifundiários do agronegócio prussiano estavam envolvidos com desvio de verbas públicas e, neste caso, vale a pena notar o caráter criminal da crise (de Weimar e nossa)


Só há um inconveniente em ser jovem: é que muitas coisas que eram óbvias para as gerações antigas, passam a ser grandes novidades para os que chegam. Pelo menos a idade nos faz poupar tempo e evitar alguns falsos problemas...

Sérgio Braga

O julgamento da chapa presidencial de 2014 no TSE

O julgamento da chapa presidencial de 2014 no TSE somente agora, motivado pelo mesmo Aécio da mala de dinheiro para encher o saco de todos nós, é um julgamento extemporâneo e só pode ser mais uma peça do teatro do absurdo. Ainda bem que a nossa cultura elaborou léxicos adequados para entendermos os atores e o espírito da coisa, como retórica barroca, práxis de rábulas e esforço de meirinhos politiqueiros. Não se deve resolver a crise por lá mesmo porque teriam que aplicar a mesma régua a todas as candidaturas do sistema de financiamento partidário anteriormente existentes. A novidade é que o baixo clero do PSDB quer mesmo rifar Temer porque ainda precisarão de votos e capitais eleitorais, necessariamente se distanciando do desastre do desgoverno golpista, o que aprofunda a crise político-moral no bloco no poder. Se Janot tiver a mínima capacidade de escolher qualquer uma das inúmeras ilegalidades de Temer e a PGR finalmente enviar para a Câmara votar, a casa do golpista Temer finalmente desabará em mais uma ação do poder legislativo do que nesse poder judiciário sócio e protagonista do teatro do absurdo dos golpistas.

RCO
Para entendermos o que está acontecendo, é preciso trazer ao pé da letra a ideia de Walter Benjamin, segundo o qual o capitalismo é, realmente, uma religião, e a mais feroz, implacável e irracional religião que jamais existiu, porque não conhece nem redenção nem trégua. Ela celebra um culto ininterrupto cuja liturgia é o trabalho e cujo objeto é o dinheiro. Deus não morreu, ele se tornou Dinheiro. O Banco - com os seus cinzentos funcionários e especialistas - assumiu o lugar da igreja e dos seus padres e, governando o crédito (até mesmo o dos Estados, que docilmente abdicaram de sua soberania), manipula e gere a fé - a escassa, incerta confiança - que o nosso tempo ainda traz consigo

GIORGIO AGAMBEN
Antigamente quando o sujeito vinha com um discurso muito agressivo e radical em resposta a algum evento desagradável ou argumentação se dizia que o sujeito "acusou o golpe". O que significava que a agressividade era muitas vezes sinal de fraqueza ou ausência de argumentos substantivos para defender um ponto de vista. Hoje em dia, a agressividade anda tão difundida que já não se sabe mais o que ela revela ou deixa de revelar.

Sérgio Braga