Affonso Romano de Sant’Anna
A Mona Lisa virou assunto de novo. Até na novela “Avenida
Brasil”tinha personagem com esse nome. E a imprensa divulgou ,há dias, que
descobriram outra Mona Lisa, dessa vez mais jovem, feita pelo próprio Da Vinci.
E nessa trilha de novidades sobre o antigo quadro, revelou-se que botaram um
especialista no Louvre só para velar por ela. Entrevistaram o tal rapaz que é o
curador da (velha) Mona Lisa no Louvre, o qual revelou estar apaixonado pela
mítica pintura de Leonardo. Não só apaixonado, está traumatizado: acaba de
descobrir que aquele quadro com a sua deusa, vai morrer um dia, pois a figura
apresenta uma fenda na testa, fenda que tentam tapar com material extraído de
peixe.
Aproveito essa onda de Mona Lisa para uma revelacão. Certa
vez no Museu do Prado ( ou Louvre?) descobri uma Mona Lisa na qual ninguém
prestava atenção. Estava numa sala secundária, não tinha admiradores, ninguém
para vê-la, só eu. Fiquei impressionado. Quase escrevi um tormentoso ensaio ou
crônica sobre essa solidão. E me perguntava: e se um dia se descobrissem que
aquela pobre criatura era do Leonardo?
De outra feita, por causa daquela cena que se repete sempre
no Louvre escrevi uma crônica intitulada “De que ri a Mona Lisa?”. Ironizava
aquela multidão que ficava ali fotografando o quadro sem se dar conta que do
lado esquerdo da Gioconda, havia dezesseis quadros de renascentistas de
primeiro time. Do lado direito, dez quadros de Rafael, Andrea del Sarto e
outros. E na frente, mais dez Ticianos, além de Veronses,Tintoretos e vários
quadros do proprio Da Vinci. Para mim a jovem de Leonardo estava rindo do
público, da carneirada de turistas ali pastando sua imagem.
Deu-se, então, que por causa de estudos que eu estava
fazendo sobre o pândego Marcel Duchamp, que andou pintando e bordando com aquele
icone, até usando palavrões para detratá-la, descobri um livro dedicado só à
estrela do Louvre: “Mona Lisa- a história da pintura mais famosa do mundo”de
Donaldo Sasson. Você sabia que em1887 já brincavam com aquele quadro,? Que um
tal de Sapeck, foi o primeiro a botar rolos de fumaça saindo de um cachinbo na
boca na moça? Você sabia que praticamente todos os pintores retomaram a figura
da jovem? Malevich, Leger, Magrite,Dali, Dubuffet, o colombiano Fernando
Botero, o japones Yasumasa Morimura fizeram quadros a partir daquela imagem, e
que um publicitário, em 1915, usou a figura da Mona Lisa como rótulo de
laxante?
A moça invadiu todos os gêneros. Romances, poemas e filmes.
Quem nunca ouviu Nat King Gole cantar Mona Lisa? E foi até sequestrada. Sim, por
um decorador italiano chamado Vincenso Peruggia (que havia trabalhado no
Louvre) e que na manhã de 21 de agosto de 1911 retirou o quadro da moldura
doada pela condessa Bear, botou a obra debaixo de um casaco e se mandou.
Houve quase um luto nacional quando os parisienses
descobriram a lacuna. O quadro ficou na clandestinidade até 1913 quando Perugia
tentou vendê-lo/devolvê-lo, alegando que havia feito aquele gesto por razõe
patrióticas, pois Leonardo era italiano. Dizem que Gabriele Danunzio, sempre exibido,
morreu de inveja da ideia e do feito desse Perugia. Dizem, no entanto, que este
tinha pensado em roubar “Marte e Venus”de Mantegna, porque a elogiavam muito
esse quadro, mas quando soube que Mona Lisa valia mais, trocou de ideia.
Mas o mais notável depois da fama provisória de Peruggia e
sua prisão, foi o retorno do quadro à França. Em todas as estações onde o trem
que vinha da Italia com o quadro tinha que parar, armava-se uma grande
procissão para ver a Gioconda como se ela fosse uma santa milagrosa. E Vincenzo
Peruggia teve uma pena de três anos que foi diminuida para doze meses. E ficou
célebre. Em 1947, ao morrer, afinal, ele tinha em sua biografia esse feito
incrível-“o homem que roubou a Mona Lisa”.
(Estado de Minas, 21.10.2012)