"É sempre difícil estabelecer estes limites entre
ficção e realidade ao escrever um romance. O historiador tem um código mais
rigoroso, uma relação mais respeitosa com a realidade histórica, enquanto o
romance é o reino da liberdade. Não obstante, sou muito cuidadoso com os fatos
históricos reais, não gosto de alterá-los, embora, em certas ocasiões, o
desenvolvimento dramático peça aos gritos alguma violação dos acontecimentos,
pois a realidade, como sabemos, é dramática à sua maneira, mas não à maneira do
romance. O que costumo fazer é empreender a investigação mais aprofundada
possível; procuro conhecer os personagens e seus contextos com muitos detalhes,
e enxergá-los por dentro, não para analisá-los, mas para dar-lhes vida. Às
vezes, um simples detalhe – o amor pelos cães, por exemplo – é mais revelador a
respeito de um personagem do que toda a sua atuação histórica, e é aí que o
romancista deve fazer suas escolhas, e pôr em linguagem estética, em função
dramática, fatos que ocorreram na realidade, que ele pensa que devem ter
ocorrido de determinada maneira a partir deste conhecimento adquirido."
Leonardo Padura discute "O homem que amava os
cachorros" em entrevista publicada no Estadão.