sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

A Faca Não Corta o Fogo


a faca não corta o fogo,

não me corta o sangue escrito,

não corta a água,

e quem não queria uma língua dentro da própria língua?

eu sim queria,

jogando linho com dedos, conjugando

onde os verbos não conjugam,

no mundo há poucos fenómenos do fogo,

água há pouca,

mas a língua, fia-se a gente dela por não ser como se queria,

mais brotada, inerente, incalculável,

e se a mão fia a estriga e a retoma do nada,

e a abre e fecha,

é que sim que eu a amava como bárbara maravilha,

porque no mundo há pouco fogo a cortar




Herberto Helder em A Faca Não Corta o Fogo, súmula & inédita, pp. 66-67, Assírio & Alvim, Lisboa, Setembro de 2008.
Mesmo que não possas fazer a vida como a queres,
isto ao menos tenta
quanto puderes: não a desbarates
nos muitos contatos do mundo,
na agitação e nas conversas.
Não a desbarates arrastandoa,
e mudandoa e expondoa
ao quotidiano absurdo
das relações e das companhias
até se tornar um estranho importuno.


Konstantinos Kavafis

TITOLO A PIACERE 82


La luce oggi sospira
in mezzo a una festa di nuvole decadenti,
mi piace quel suo strusciarsi indefinito
lungo i dorsi del tempo,
come un gatto randagio
vittima dell'ardore di un pasto gelido
Ieri notte ho chiuso gli occhi
con la bocca rigonfia di buio,
cena fredda di un maltrattato passato,
stamani la luce
ha ferito la casbah di specchi retrovisori
mi ha offerto i profumi della terra futura
e ha cucinato il presente,
rendendolo speziato e croccante
da mordere, come musica araba al sole.

__Marco Scarpulla__



Creio que foi o sorriso, 
o sorriso foi quem abriu a porta.
Era um sorriso com muita luz
lá dentro, apetecia
entrar nele, tirar a roupa, ficar
nu dentro daquele sorriso.
Correr, navegar, 
morrer naquele sorriso.

Eugénio de Andrade

No teatro


~Agnya Barto

Quando eu tinha
Oito anos,
Eu fui
Assistir balé.

Eu fui com minha amiga Lyuba
Nós no teatro fotografamos os casacos,
Fotografamos os xales quentes.
No teatro, em nossas mãos,
Deram passes para o vestiário.

Finalmente eu estou no balé!
Eu me esqueci de tudo no mundo.

Mesmo multiplicar três vezes três
Eu agora não conseguiria.
Finalmente estou no teatro,
Como eu esperei por isso.

Eu agora vejo uma fada
De lenço branco e grinalda de flores.
Eu me sento, nem ouso respirar,
Segurando o passe na mão.

De repente a orquestra ribombou as tubas,
Eu e minha amiga Lyuba
Chegamos a nos encolher ligeiramente.
De repente vi que não tinha mais o passe.

A fada girando no cenário
E para o cenário eu nem olhava.
Eu esquadrinhei os joelhos:
Não consigo encontrar o passe.

Talvez ele esteja
Em algum lugar embaixo da cadeira?
Para mim agora
Não há mais balé!

Com toda força as tubas tocam.
Os convidados dançam no baile,
Mas eu e minha amiga Lyuba
Procuramos o passe no chão.

Ele caiu em algum lugar...
Eu me arrasto sob a cadeira ao lado.
Maravilham-se as crianças:
– Quem está rastejando aí embaixo?

Uma borboleta esvoaçou pelo cenário
E eu não vi nada.
Procurava o passe pelo chão
E finalmente o encontrei.

E justo então as luzes se acenderam
E todos saíram da sala.
– Eu gosto muito de balé –
Eu disse para o pessoal.

1938

~em russo~

В театре
~Агния Барто

Когда мне было
Восемь лет,
Я пошла
Смотреть балет.

Мы пошли с подругой Любой.
Мы в театре сняли шубы,
Сняли теплые платки.
Нам в театре, в раздевалке,

Наконец-то я в балете!
Я забыла все на свете.

Даже три помножить на три
Я сейчас бы не смогла.
Наконец-то я в театре,
Как я этого ждала.

Я сейчас увижу фею
В белом шарфе и венке.
Я сижу, дышать не смею,
Номерок держу в руке.

Вдруг оркестр грянул в трубы,
Мы с моей подругой Любой
Даже вздрогнули слегка.
Вдруг вижу — нету номерка.

Фея кружится по сцене —
Я на сцену не гляжу.
Я обшарила колени —
Номерка не нахожу.

Может, он
Под стулом где-то?
Мне теперь
Не до балета!

Все сильней играют трубы,
Пляшут гости на балу,
А мы с моей подругой Любой
Ищем номер на полу.

Укатился он куда-то...
Я в соседний ряд ползу.
Удивляются ребята:
— Кто там ползает внизу?

По сцене бабочка порхала —
Я не видала ничего:
Я номерок внизу искала
И наконец нашла его.

А тут как раз зажегся свет,
И все ушли из зала.
— Мне очень нравится балет,—
Ребятам я сказала.


1938
O teu rosto é tão familiar para mim
Como se você vivesse comigo.
Longe, na rua e em casa
Eu vejo o teu fino perfil.
Os teus passos vêm atrás de mim
Onde quer que eu vá, você está lá,
Não é fácil pra você parar
De andar atrás de mim à noite?
Você não se esgueira ao meu lado
Mal eu espreito pela porta
Meio feita de ar e invisível,
Semelhante às visões do sono?
Eu frequentemente penso, se você não
No meio do cemitério, atrás da eira,
Sentou-se, silenciosa, sobre um túmulo
Envolta em seu lenço de algodão?
Eu fui me aproximando – você se sentou,
Eu cheguei perto – você se afastou,
Desceu em direção ao rio, e começou a cantar...
À tua voz os sinos
Responderam com o toque do carrilhão
E eu chorei, e esperei timidamente
Mas sob o som do carrilhão
Tua doce voz silenciou...
Mais um instante, mas não há resposta
O lenço surge momentaneamente além do rio...
Mas sei amargamente que em algum lugar
Ainda nos veremos novamente.

Aleksandr Blok

~em russo~

Твое лицо мне так знакомо,
Как будто ты жила со мной.
В гостях, на улице и дома
Я вижу тонкий профиль твой.
Твои шаги звенят за мною,
Куда я ни войду, ты там,
Не ты ли легкою стопою
За мною ходишь по ночам?
Не ты ль проскальзываешь мимо,
Едва лишь в двери загляну,
Полувоздушна и незрима,
Подобна виденному сну?
Я часто думаю, не ты ли
Среди погоста, за гумном,
Сидела, молча на могиле
В платочке ситцевом своем?
Я приближался - ты сидела,
Я подошел - ты отошла,
Спустилась к речке и запела...
На голос твой колокола
Откликнулись вечерним звоном...
И плакал я, и робко ждал...
Но за вечерним перезвоном
Твой милый голос затихал...
Еще мгновенье - нет ответа,
Платок мелькает за рекой...
Но знаю горестно, что где-то
Еще увидимся с тобой.


Александр Блок
Somos folhas breves onde dormem
aves de silêncio e solidão.

Somos só folhas ou o seu rumor.
Inseguros, incapazes de ser flor,
até a brisa nos perturba e faz tremer.

Por isso a cada gesto que fazemos
cada ave se transforma noutro ser.


Eugénio de Andrade

SONETO XVIII



Se te comparo a um dia de verão
És por certo mais belo e mais ameno
O vento espalha as folhas pelo chão
E o tempo do verão é bem pequeno.

Ás vezes brilha o Sol em demasia
Outras vezes desmaia com frieza;
O que é belo declina num só dia,
Na terna mutação da natureza.

Mas em ti o verão será eterno,
E a beleza que tens não perderás;
Nem chegarás da morte ao triste inverno:

Nestas linhas com o tempo crescerás.
E enquanto nesta terra houver um ser,
Meus versos vivos te farão viver.


William Shakespeare
"O escritor não precisa de liberdade econômica. Tudo de que precisa é lápis e papel. Eu nunca soube que algo bom em literatura tivesse se originado da aceitação de uma oferta gratuita de dinheiro. O bom escritor nunca pede auxílio a uma instituição cultural. Está ocupado demais escrevendo alguma coisa. Se não é um escritor de primeira classe, ilude-se dizendo que não tem tempo ou liberdade econômica. [...] As pessoas na verdade têm medo de descobrir que podem suportar muita adversidade e pobreza. Têm medo de descobrir que são mais resistentes do que pensam. Nada pode destruir o bom escritor. A única coisa que pode alterar o bom escritor é a morte. Os bons não têm tempo para pensar no sucesso ou em ganhar dinheiro."


----Willian Faulkner

Flores


De um pequeno degrau dourado -, entre os cordões
de seda, os cinzentos véus de gaze, os veludos
verdes e os discos de cristal que enegrecem como
bronze ao sol -,vejo a digital abrir-se sobre um
tapete de filigranas de prata, de olhos e de cabe-
leiras.
Peças de ouro amarelo espalhadas sobre a ágata,
pilastras de um cetim branco e de finas varas de
rubis rodeiam a rosa d'água.
Como um deus de enormes olhos azuis e de formas
de neve, o mar e o céu atraem aos terraços de
mármores a multidão das rosas fortes e jovens.


- Arthur Rimbaud, in: Iluminações [Tradução de Lêdo Ivo].
Multipliquei-me, para me sentir,
Para me sentir, precisei sentir tudo,
Transbordei, não fiz senão extravasar-me,
Despi-me, entreguei-me,
E há em cada canto da minha alma um altar a um deus diferente.

Álvaro de Campos, in "Poemas"

Heterónimo de Fernando Pessoa

NOVA POÉTICA



Vou lançar a teoria do poeta sórdido.
Poeta sórdido:
Aquele em cuja poesia há a marca suja da vida.
Vai um sujeito,
Sai um sujeito de casa com a roupa de brim branco muito bem engomada, e na primeira esquina passa um caminhão, salpica-lhe o paletó ou a calça de uma nódoa de lama:
É a vida.

O poema deve ser como a nódoa no brim:
Fazer o leitor satisfeito de si dar o desespero.

Sei que a poesia é também orvalho.
Mas este fica para as menininhas, as estrelas alfas, as virgens cem por cento e as amadas que envelhecem sem maldade.


[Manuel Bandeira, poema escrito em 1948]

El endecasílabo


Hay quietud en tu alma,
las palabras, piensas,
vienen del silencio
y amaneces siempre hecho poema.
De día es tu secreto,
escribirás de noche:

"morir así, sin haber hecho nada"

Julio Herrera y Reissig.
9 de enero de 1875 en Montevideo. Murió en 1910.
''Nós não podemos apontar a uma única solução definitiva de nenhum dos problemas que nos confrontam - políticos, econômicos, sociais ou morais, isto é, não temos que fazer com a conduta da vida. Nós somos novatos imóveis, e por essa razão podemos melhorar. Derivar a esperança do progresso é a tolice final, a última palavra na pobreza do espírito e mesquinhez da mente. Não há nenhuma necessidade ficar desanimado pelo fato que nós não podemos ainda ter uma solução definitiva de nossos problemas, um descanso - lugar além do que nós não necessitamos tentar ir.''

- Peter Brian Medawar.
'Quando o pecado se atreve a avançar, ele é proibido pela polícia. Quando se esconde, recebe um alvará.''

--Karl Kraus, e seus aforismos.

A lógica da pesquisa científica.

''(...) Acredito que a teoria — pelo menos alguma teoria ou expectativa rudimentar — vem sempre primeiro; que precede sempre a observação: e que o papel fundamental das observações e dos testes experimentais é mostrar que algumas das nossas teorias são falsas e, assim, estimular-nos a produzir outras melhores.
Conseqüentemente, afirmo que não partimos de observações, mas sempre de problemas — de problemas práticos ou de uma teoria que caiu em dificuldades. Uma vez que defrontemos um problema, podemos começar a trabalhar nele. Podemos fazê-lo por meio de tentativas de duas espécies: podemos prosseguir tentando primeiro supor ou conjecturar uma solução para o nosso problema; e podemos depois tentar criticar a nossa suposição, habitualmente fraca. Às vezes, uma suposição ou uma conjectura podem suportar por certo tempo a nossa crítica e os nossos testes experimentais. Mas, via de regra, logo descobrimos que as nossas conjecturas podem ser refutadas ou que não resolvem o nosso problema ou que só o solucionam em parte; e verificamos que mesmo as melhores soluções — aquelas capazes de resistir à crítica mais severa das mentes mais brilhantes e engenhosas — logo dão origem a novas dificuldades, a novos problemas. Assim, podemos dizer que o crescimento do conhecimento avança de velhos problemas para novos problemas, por meio de conjecturas e refutações.''

-- Karl Popper; A lógica da pesquisa científica.
"Quando você perceber que, para produzir, precisa obter a autorização de quem não produz nada; quando comprovar que o dinheiro flui para quem negocia não com bens, mas com favores; quando perceber que muitos ficam ricos pelo suborno e por influência, mais que pelo trabalho, e que as leis não nos protegem deles, mas, pelo contrário, são eles que estão protegidos de você; quando perceber que a corrupção é recompensada, e a honestidade se converte em auto-sacrifício; então poderá afirmar, sem temor de errar, que sua sociedade está condenada".


-----Ayn Rand

Una cena de Nochebuena


Guy de Maupassant

No sé exactamente el año. Llevaba todo un mes cazando por aquellos lugares con un brío impetuoso y una alegría salvaje, con ese ardor que se tiene para las pasiones nuevas. Me hallaba en Normandía, en casa de un pariente soltero, Jules de Banneville; y éramos solamente nosotros dos, una doncella, un doméstico y el guarda del castillo señorial. Este castillo, viejo edificio grisáceo rodeado de pinos, en cuyo interior había unas largas avenidas de castaños azotados por el viento, parecía abandonado desde hacía siglos. Un mobiliario antiguo era lo único que contenían aquellos salones siempre cerrados, donde antaño unos personajes, cuyos retratos se veían colgados en un corredor tan desapacible como las avenidas, recibían ceremoniosamente a los nobles vecinos.

Pero nosotros nos habíamos refugiado en la cocina, único rincón habitable de la mansión, una inmensa cocina, cuyas paredes, perdidas en las tinieblas, se iluminaban cuando se arrojaba un nuevo haz de leña en la amplia chimenea. Todas las noches, después de despabilar una dulce modorra ante el fuego, y una vez que de nuestras botas se había evaporado la humedad, subíamos a nuestra habitación, mientras que los podencos, allí mismo, como sonámbulos, soñando escenas de caza, lanzaban ladridos amortiguados.

La habitación era la única pieza del castillo que se había techado y enyesado completamente, a causa de los ratones. Pero la habían dejado sin muebles, blanqueada de cal, y, en las paredes, solamente colgaban unas escopetas, varios látigos y algunos cuernos de caza. Colocadas en los dos rincones de esta choza siberiana había dos camas, en las cuales nos deslizábamos tiritando.

Frente al castillo, a una legua de distancia, el acantilado caía a pico sobre el mar; y, noche y día, los poderosos vientos del océano arrancaban suspiros de los recios árboles encorvados, gemidos al techo y a las veletas, y hacían rechinar todo el venerable edificio, invadido por el viento que entraba por entre sus tejas sueltas, sus chimeneas grandes como abismos y sus ventanas, que no cerraban ya.

* * *

Aquel día había helado de una manera horrible. Al llegar la noche nos sentamos a la mesa, ante el gran fuego de la alta chimenea, donde asaban un lomo de liebre y dos perdices, que olían muy bien. Mi primo levantó la cabeza, y dijo:

-No hará calor cuando nos acostemos.

Indiferente, repliqué:

-No, pero tendremos patos en los estanques mañana por la mañana.

La sirvienta, que ponía nuestros cubiertos en un extremo de la mesa y los de los domésticos en el otro, preguntó:

-¿Saben los señores que esta noche es Nochebuena?

Seguramente no nos habíamos enterado, pues apenas mirábamos el calendario. Mi compañero contestó:

-Entonces esta noche es la misa del gallo. ¡Y por eso las campanas han estado sonando todo el día!

La sirvienta replicó:

-Sí y no, señor; también han tocado porque ha muerto Fournel padre.

Fournel padre, anciano pastor, era una celebridad del país. Tenía ochenta y seis años de edad, y nunca había estado enfermo hasta el momento en que, un mes antes, había cogido un frío al caerse dentro de una charca en una noche oscura. Al día siguiente se había quedado en cama, y desde entonces estaba agonizando. Mi primo se volvió hacia mí:

-Si quieres -dijo-, iremos dentro de un rato a ver a esas pobres gentes.

Quería hablar de la familia del viejo, de su nieto. que tenía cincuenta y ocho años de edad, y de su nieta política, que era un año más joven. La generación intermedia no existía ya desde hacía mucho tiempo. Vivían en un miserable chamizo, a la entrada de la aldea, a la derecha. Pero no sé por qué esta idea de la Nochebuena, en medio de nuestra soledad, nos dio ganas de charlar. A solas los dos, nos contábamos antiguas historias de Nochebuena, aventuras de esta noche loca, los pasados lances amorosos y los despertares del día siguiente, acompañados de otra persona, con sus sorpresas imprevistas, y el asombro de los descubrimientos.

De esta manera, nuestra cena duró mucho tiempo, fumando numerosas pipas; y embriagados por esas alegrías de los solitarios, alegrías contagiosas que nacen de repente entre dos amigos íntimos, hablamos sin parar, rebuscando en nuestros propios casos para comunicarnos esos recuerdos confidenciales del corazón que se escapan en las horas de efusión.

La doncella, que se había ido un buen rato antes, volvió:

-Voy a la misa, señor.

-¡Ya!

-Son las once y cuarto.

-¿Y si fuésemos también a la iglesia? -me preguntó Jules-; esta misa de Nochebuena es muy curiosa en el campo.

Acepté, y nos fuimos, envueltos en nuestras pieles de caza. Un filo agudo pinchaba el rostro y hacía saltar las lágrimas en los ojos. El aire crudo entraba de golpe en los pulmones y secaba la garganta. El cielo profundo, limpio y duro, estaba tachonado de estrellas, que parecían pálidas por la helada; brillaban no como si fuesen unos astros de fuego, sino de cristal, como unas cristalizaciones brillantes. A lo lejos, sobre la tierra de acero, seca y retumbante, resonaban los chanclos de los campesinos; y por todo el horizonte, las campanitas de los pueblos tañían, lanzaban sus sones penetrantes, como friolentos también, en la vasta noche helada.

En el campo no dormía nada. Los gallos, engañados por esos ruidos, cantaban; y cuando se pasaba por delante de los establos, se sentía rebullir a los animales, turbados por esos rumores de vida. Al aproximarse a la aldea, Jules se acordó de repente de los Fournel.

-¡Aquí está su choza! -dijo-. ¡Entremos!

Aporreó largo tiempo en vano. Entonces una vecina, que salía de casa para ir a la iglesia, al vernos, dijo:

-Están en misa, señores; han ido a rezar por el padre.

-Los veremos al salir -dijo mi primo.

La luna, en su ocaso, perfilaba a ras del horizonte su forma de hoz en medio de una siembra infinita de granos de luz, arrojados a puñados en el espacio. Y por la campiña negra, unas lucecitas temblorosas se encaminaban desde todas las partes hacia el puntiagudo campanario, que repicaba sin descanso. Entre los patios de las granjas, salpicadas de árboles, en medio de las llanuras sombrías, esas lucecitas daban pequeños saltos, a medio metro del suelo. Eran farolillos de cuerno que llevaban los campesinos para alumbrarse en la noche, caminando delante de sus mujeres, tocadas con un gorro blanco y envueltas en largos mantos negros, y seguidas de rapazuelos medio dormidos y cogidos de la mano.

Por la puerta abierta de la iglesia se divisaba el coro iluminado. Una guirnalda de velas de sebo, de las más baratas, daba una vuelta completa alrededor de la nave de la iglesia; y en el suelo, en una capilla, a la izquierda, un gran niño Jesús, sobre paja verdadera, en medio de ramas de abeto, enseñaba su desnudez sonrosada y amanerada.

La misa había comenzado. Los hombres, agachados, y las mujeres, de rodillas, rezaban. Estas gentes sencillas, reanimadas por la noche fría, contemplaban muy conmovidas la imagen torpemente pintada, y juntaban las manos tan cándidamente convencidas como intimidadas por el humilde esplendor de esta representación pueril. El aire helado hacía palpitar las llamas. Jules me dijo:

-¡Salgamos, se está mejor fuera!

Y por el camino abierto, mientras que los toscos campesinos se prosternaban y tiritaban de frío devotamente, nos pusimos a charlar otra vez de nuestros recuerdos, y durante tan largo rato, que había terminado la misa cuando llegábamos a la aldea.

Un hilo de luz se veía bajo la puerta de los Fournel.

-Velan al muerto -dijo mi primo-. Entremos en casa de esta pobre gente, eso les agradará.

Agonizaban unos tizones en la chimenea. La pieza, negra, cubierta de un barniz de suciedad y con sus vigas carcomidas y ennegrecidas por el tiempo, estaba llena de un olor sofocante a morcillas asadas en una parrilla. En el centro de la gran mesa, debajo de la cual el arcón del pan alzaba su tapa abombada como un vientre, una vela, en una palmatoria de hierro retorcido, desenroscaba hasta el techo el humo acre de su pabilo. Y los dos Fournel, el marido y la esposa, cenaban a solas.

Taciturnos, con un aire afligido y sus caras de campesinos embrutecidos, comían gravemente sin decir una palabra. En un solo plato, colocado entre los dos, un gran trozo de morcilla despedía un olor pestilente. De cuando en cuando arrancaban un pedazo con la punta del cuchillo, lo aplastaban en el pan, que comían a bocados y después lo masticaban lentamente.
Cuando el vaso del marido estaba vacío, la mujer, cogiendo la cántara de sidra, se lo llenaba.

Al entrar nosotros, se levantaron, nos hicieron sentar, nos ofrecieron que “hiciésemos como ellos”, y, ante nuestra negativa, siguieron comiendo. Al cabo de unos minutos de silencio, mi primo preguntó:

-Pero, Anthime, ¿el abuelo de ustedes ha muerto?

-Sí, mi buen señor, ha muerto ya.

Tomó el silencio. La mujer, por cortesía, despabiló la vela. Entonces, por decir algo, añadió:

-Era muy viejo ya...

Su nieta política, de cincuenta y siete años, continuó:

-Sí, su tiempo habla terminado; ya nada tenía que hacer aquí.

De repente, me entraron ganas de ver el cadáver de ese centenario, y les rogué que me lo enseñasen. Los dos campesinos, plácidos hasta entonces, se conmovieron bruscamente. Sus ojos inquietos se interrogaron, y no respondieron. Mi primo, viendo su turbación, insistió. Entonces el hombre, con aire desconfiado y cazurro,  preguntó:

-¿Y de qué les servirá eso?

-De nada -dijo Jules-, pero eso se hace siempre. ¿Por qué no quieren enseñarlo?

El campesino se encogió de hombros:

-¡Oh, yo, yo sí quiero! Sólo que a estas horas es penoso.

Mil suposiciones nos pasaban por la mente. Y como los nietos del muerto no se movían, y permanecían frente a frente, con los ojos bajos, con esa cara de palo de las gentes descontentas, que parece decir: “Márchense”, mi primo le habló con autoridad:

-Vamos, Anthime, levántense y condúzcannos a su habitación.

Pero el hombre, que había tomado su resolución, respondió con gesto enfurruñado:

-Ésa es la pena, señor, no ha podido estar allí.

-Pero entonces, ¿dónde está?

La mujer atajó a su marido:

-Se lo voy a decir: lo hemos puesto hasta mañana en el arcón, porque no teníamos ningún sitio.

Y retirando el plato de morcilla, levantó la tapa de su mesa, se inclinó con la vela para iluminar el interior del gran cofre abierto, en cuyo fondo distinguimos una cosa gris, una especie de paquete largo del que salía por una punta una cabeza descarnada, con unos cabellos blancos desgreñados, y por la otra, dos pies desnudos.

Era el viejo, muy enjuto, con los ojos cerrados, enrollado en una manta de pastor, durmiendo allí su último sueño en medio de unos mendrugos de pan casi tan viejos como él. ¡Y habían cenado allí, encima del muerto! Jules, indignado y temblando de cólera, gritó:

-¿Por qué no lo han dejado en su cama? ¡ Palurdos!

Entonces la mujer se puso a lloriquear, y en seguida:

-Se lo voy a decir, mi buen señor; no tenemos más que una cama en la casa. Antes nos acostábamos con él, puesto que sólo éramos tres. Desde que cayó enfermo, nos acostamos en el suelo; y es muy duro, mi buen señor, en este tiempo. Pues bien, cuando murió, en seguida nos hemos dicho: “Puesto que no sufre ya, ¿de qué le sirve dejarlo en la cama? Podemos muy bien ponerle en el arcón hasta mañana”; pues ¡no podíamos dormir con el muerto, mis buenos señores!...

Mi primo, exasperado, salió bruscamente dando un portazo, y yo le seguí riendo nerviosamente entre lágrimas.

FIN


Biblioteca Digital Ciudad Seva

Los tres reyes magos


Rubén Darío

- IV -

-Yo soy Gaspar. Aquí traigo el incienso.
Vengo a decir: La vida es pura y bella.
Existe Dios. El amor es inmenso.
¡Todo lo sé por la divina Estrella!

-Yo soy Melchor. Mi mirra aroma todo.
Existe Dios. Él es la luz del día.
La blanca flor tiene sus pies en lodo.
¡Y en el placer hay la melancolía!

-Soy Baltasar. Traigo el oro. Aseguro
que existe Dios. Él es el grande y fuerte.
Todo lo sé por el lucero puro
que brilla en la diadema de la Muerte.

-Gaspar, Melchor y Baltasar, callaos.
Triunfa el amor y a su fiesta os convida.
¡Cristo resurge, hace la luz del caos
y tiene la corona de la Vida!



Biblioteca Digital Ciudad Seva

Macbeth

“Amanhã, e amanhã, e ainda outro amanhã
Arrastam-se nessa passada trivial do dia para a noite, da noite para o dia,
Até a última sílaba do registro dos tempos.
E todos os nossos ontens não fizeram mais que iluminar para os tolos
o caminho que leva ao pó da morte. Apaga-te, apaga-te, chama breve!
A vida não passa de uma sombra que caminha, um pobre ator
Que se pavoneia e se aflige sobre o palco –
Faz isso por uma hora e, depois, não se escuta mais sua voz.
É uma história contada por um idiota, cheia de som e fúria
E vazia de significado”.


Macbeth, Ato 5, Cena 5

Snow

Snow

All going to the whiteness, earthly,
As an unmoving immense wall,
There pours a snow, becoming denser,
And shields us from daylight at all.

Not giving to its move attention,
How slow is its heavy stream –
It seems, the force of gravitation
Directs it to the earthly realm.

Behind this shroud of the whiteness,
Towns are hidden and green woods,
Behind this whiteness of the silence,
There are the voices, rings and hoots.

Behind this curtain, white and giant,
Lies winter in the sunny lights,
Behind this mental whitened bound
Our universe, eternal, lies.

Then let all be in it in rightness:
Wide rivers’ floods and birds returns,
The cannonades of July’s thunders,
The noisy rain, the noiseless snows.

Konstanin Vanshenkin (1925-2012)