domingo, 3 de fevereiro de 2019

Em busca da Política


 Zigmunth Bauman

"Quando o estado reconhece a prioridade e superioridade das leis do mercado sobre as leis da pólis, o cidadão transforma-se em consumidor demanda mais e mais proteção, enquanto aceita cada vez menos a necessidade de participar no governo do Estado. O resultado global são as atuais condições fluidas de anomia generalizada e rejeição das normas em todas as suas versões. Aumenta, em vez de diminuir, a distância entre o ideal de democracia liberal e sua versão real, de fato existente. Temos um longo caminho a percorrer antes de sequer pensarmos em alcançar uma sociedade na qual os indivíduos reconheçam sua autonomia junto com os laços de solidariedade." (pág.159)

O QUE OS MORTOS SENTIRAM?




Por Mário Lima Jr.

Quase cem corpos encontrados, mais de duzentas pessoas desaparecidas. Moradias destruídas, árvores derrubadas e plantações devastadas. Por causa da poluição do rio Paraopeba, sua principal fonte de sustento, a sobrevivência da tribo Pataxó Hã-hã-hãe está ameaçada. Os culpados, liderados pela Vale, foram apontados ao longo da semana e devem ser punidos de uma vez por todas. Para impedirmos que crimes como o de Mariana e Brumadinho se repitam, também é fundamental compartilharmos o sofrimento daqueles que se foram.

Jonatas Lima Nascimento tinha 36 anos e está entre os assassinados pela negligência da Vale. Era operador de equipamentos de instalação e passou o primeiro turno de trabalho, do dia 25 de janeiro, pensando na esposa e nos filhos, de 11 e 5 anos de idade. Sabemos disso porque Jonatas ligou duas vezes para conversar com a esposa naquela manhã.

Cansado, talvez depois de abastecer vagões com minérios que seriam transportados de trem, uma das tarefas que desempenhava, Jonatas estava no centro de carregamento – uma área baixa – na hora do rompimento da barragem da Mina do Córrego do Feijão, segundo informações extraoficiais.

A audição deve ter sido o primeiro sentido despertado, pelo barulho da onda gigantesca de rejeitos rompendo a barragem e esmagando o maquinário e tudo o que tinha pela frente. Se havia treinamento frequente para situações de emergência, em milésimos de segundo o cérebro trouxe à memória o procedimento a ser seguido. Mas o mar de lama veio rápido demais para uma reação maior. Muitos não tiveram tempo de correr, como os trabalhadores dentro do refeitório, completamente soterrado. No máximo, trocaram olhares com o colega de trabalho mais próximo, que também morreria em instantes.

Gritos foram abafados de imediato. A força da avalanche, que deslocou construções por centenas de metros, esmagou as vítimas contra paredes e objetos que arrastava, bem maiores do que o corpo humano. Antes da escuridão completa, quem sabe Jonatas sentiu o impacto nas costas e na cabeça, e o corpo imobilizado por um peso tremendo sobre ele.

Os Bombeiros encontraram membros arrancados. Esperamos uma morte instantânea, sem dor, mas aqueles que passaram pela experiência não podem revelar se sentiram o corpo cortado, perfurado, o gosto de terra na boca e o toque da lama entre os dedos. Dois segundos no trajeto do rompimento da barragem significaram um sofrimento insuportável. A podridão entrou pelo nariz, pela boca, e em pouco tempo se tornou impossível respirar.

Com calma e benevolência na voz, Fabio Schvartsman, presidente da Vale, alegou que a empresa aplicou um “esforço imenso” para evitar outra tragédia após Mariana. No entanto, os mortos, bem como o sofrimento dos parentes, são um fato indiscutível que provam o contrário. As sirenes que deveriam ter alertado a população sequer funcionaram. Foram instaladas para cumprir a legislação e nem ao menos testadas. É o relato do seu Manuel, que morava perto da barragem e de uma das sirenes. Ele perdeu a casa e só não perdeu a vida porque a esposa o salvou.




Muito mais dos mesmos. A votação ampliada de Rodrigo Maia, o "Botafogo", na presidência da Câmara, revela a forte continuidade de mando tradicional e fisiológico no poder legislativo. Uma das mais importantes famílias políticas no Rio de Janeiro, na Paraíba e no Rio Grande do Norte, pesquisada pelo nosso colega Marciano Monteiro. Pela mulher de Maia, enteada de Moreira Franco, o "Angorá", ele é quase o genro do genro do genro até Getúlio Vargas ! Na Assembleia Legislativa do Paraná foi reconduzido Ademar Traiano, conhecido por relações de nepotismo na instituição e como vice o deputado Plauto Miró Guimarães, de mais uma família da classe dominante tradicional, de modo que continuamos no poder de famílias originárias do Período Colonial. Isso porque o eleitor pensa que votou, nas eleições de 2018, em nomes "de fora e contra o sistema" na sua ignorância ! Vamos ver como se resolve o conflito no Senado.
RCO