«PLATERO E EU», poema/prosa de Juan Ramón Jiménez
[COMO «O PRINCIPEZINHO» e «O VELHO E O MAR», ESTE LIVRO
TAMBÉM É PARA MIM, UMA PEQUENA JÓIA DA LITERATURA]
EXCERTO
Platero é pequeno, peludo, suave; tão macio, que dir-se-ia
todo de algodão, que não tem ossos. Só os espelhos de azeviche dos seus olhos
são duros como dois escaravelhos de cristal negro. Deixo-o solto, e vai para o
prado, e acaricia levemente com o focinho, mal as roçando, as florinhas róseas,
azuis-celestes e amarelas... Chamo-o docemente: «Platero», e ele vem até mim
com um trote curto e alegre que parece rir em não sei que guizalhar
ideal...Come o que lhe dou. Gosta das tangerinas, das uvas moscatéis, todas de
âmbar, dos figos roxos, com sua cristalina gotita de mel...E terno e mimoso como
um menino, como uma menina...; mas forte e seco como de pedra. Quando nele
passo, aos domingos, pelas últimas ruelas da aldeia, os camponeses, vestidos de
lavado e vagarosos, param a olhá-lo:— Tem aço...Tem aço. Aço e prata de luar,
ao mesmo tempo."
“A lua vem connosco, redonda, enorme, pura. Nos prados
sonolentos vêem-se, vagamente, não sei que cabras negras, entre os silvados…
Alguém se esconde, discreto, ao passarmos… Sobre o vale, uma imensa amendoeira,
nívea de flor e de luar, confundida a copa com uma nuvem branca, cobiça o
caminho asseteado de estrelas de Março… Um odor penetrante de laranjas…
Humidade e silêncio… A azinhaga das Bruxas…
- Platero, que… frio!
Platero, não sei se com o seu medo ou com o meu, trota,
entra no regato, pisa a lua e fá-la em pedaços. É como se um enxame de rosas de
cristal enlaçasse, querendo retê-lo, o seu trote…E Platero trota, encosta a
cima, a garupa encolhida como se alguém o perseguisse, sentindo já a tepidez
suave da aldeia que se avizinha…”
Juan Ramón Jiménez Mantecón (Moguer, 23 de Dezembro de 1881
— San Juan, 29 de Maio de 1958) poeta. Recebeu o Nobel de Literatura em 1956.
"Para mim, o importante na poesia é a qualidade da
eternidade que um poema poderá deixar em quem o lê sem a ideia de tempo".
Marisa Soveral
Marisa Soveral