sábado, 15 de junho de 2013

Pensar talvez não fosse

Pensar talvez não fosse

Pensar talvez não fosse a fórmula, o segredo,
senão dar-se e tomar perdida, ingenuamente,
talvez tenha podido eleger, ou necessariamente,
tinha que pedir sentido a toda coisa.

Talvez não fosse viver este estar silenciosa
e impiedosamente à beira da angústia
e este teimoso sentir por sob a sua música
um silêncio de morte, de abismo em cada coisa.

Talvez devesse quedar-me nos amores quietos
que poderiam encher minha vida com um nome
ao invés de buscar o evadido do amante,
despojado, sem alma, ser puro, esqueleto.

Pensar talvez não fosse a fórmula, o segredo.
senão amar-se e amar, perdida, ingenuamente.

Talvez pudesse subir como uma flor ardente
ou ter um profundo destino de embrionária
ao invés desta terrível lucidez amarela
e deste ser como estátua de olhos vazios.

Talvez tenha podido dobrar este meu destino
em música inefável. Ou necessariamente...


Idea Vilariño [trad. Matheus Pazos]

A alma encantadora das ruas

"A rua nasce, como o homem, do soluço, do espasmo. Há suor humano na argamassa do seu calçamento. Cada casa que se ergue é feita do esforço exaustivo de muitos seres, e haveis de ter visto pedreiros e canteiros, ao erguer as pedras para as frontarias, cantarem, cobertos de suor, uma melopéia tão triste que pelo ar parece um arquejante soluço. A rua sente nos nervos essa miséria da criação, e por isso é a mais igualitária, a mais socialista, a mais niveladora das obras humanas".
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A alma encantadora das ruas, texto encantador de João do Rio, pseudônimo de João Paulo Emílio Cristóvão dos Santos Coelho Barreto, (Rio de Janeiro, 5 de agosto de 1881 — 23 de junho de 1921)1 jornalista, cronista, tradutor e teatrólogo brasileiro.)



Acrobata da Dor



Gargalha, ri, num riso de tormenta,
como um palhaço, que desengonçado,
nervoso, ri, num riso absurdo, inflado
de uma ironia e de uma dor violenta.

Da gargalhada atroz, sanguinolenta,
agita os guizos, e convulsionado
Salta, gavroche, salta clown, varado
pelo estertor dessa agonia lenta...

Pedem-te bis e um bis não se despreza!
Vamos! reteza os músculos, reteza
nessas macabras piruetas d'aço...

E embora caias sobre o chão, fremente,
afogado em teu sangue estuoso e quente,
ri! Coração, tristíssimo palhaço.


- Cruz e Sousa, do livro “Broquéis”, 1893.
Sempre vieni dal mare
e ne hai la voce roca,
sempre hai occhi segreti
d'acqua viva tra i rovi,
e fronte bassa, come
cielo basso di nubi.
Ogni volta rivivi
come una cosa antica
e selvaggia, che il cuore
già sapeva e si serra.

Cesare Pavese