quinta-feira, 2 de novembro de 2017

Eu achava que a política era a segunda profissão mais antiga. Hoje vejo que ela se parece muito com a primeira.


Ronald Reagan
Afirma-se que o pós-modernismo tem nos Shopping Centers as suas catedrais; suas igrejas são as Bolsas de Valores; os Bancos, suas capelas. Seus rituais são os grandes , multitudinários e milhardários concertos de rock. Seu latim é o inglês. Seus celebrantes são os cantores-instrumentistas, ajudados pelos coroinhas-engenheiros de som e luz. Seus mecenas são as grandes empresas multinacionais. Seus santos são Madonna e São Michael Jackson e Santa Lady Gaga. Esperam-se milagres para santificar a padroeira dos drogados, Santa Amy do Vinho Sagrado.


Raul Machado   

CRAVEIRA



Não deixa amor que o meçam, antes mede,
Incorrupto juiz que tudo afere
Na craveira da sua desmedida.
Chamados todos somos: só elege
Quantos de nós soubermos converter
Em chama vertical a hora consumida,
Em mãos de dar os dedos de reter.

José Saramago

fragmento 166

166. (Bernardo Soares, heterônimo de Fernando Pessoa)

"Se considero com atenção a vida que os homens vivem, nada encontro nela que a diference da vida que vivem os animais. Uns e outros são lançados inconscientemente através das coisas e do mundo; uns e outros se entretêm com intervalos; uns e outros percorrem diariamente o mesmo percurso orgânico; uns e outros não pensam para além do que pensam, nem vivem para além do que vivem. O gato espoja-se ao sol e dorme ali. O homem espoja-se à vida, com todas as suas complexidades, e dorme ali. Nem um nem outro se liberta da lei fatal de ser como é. [...]

"Serei sempre, em verso ou prosa, empregado de carteira. Serei sempre no místico ou no não-místico, local e submisso, servo das minhas sensações e da hora em que as ter. Serei sempre, sob o grande pálio azul do céu mudo, pajem num rito incompreendido, vestido de vida para cumpri-lo, e executando, sem saber porquê, gestos e passos, posições e maneiras, até que a festa acabe, ou o meu papel nela, e eu possa ir comer coisas de gala nas grandes barracas que estão, dizem, lá em baixo ao fundo do jardim."


trecho do fragmento 166, do seu "Livro do desassossego", sob a alcunha de Bernardo Soares, ajudante de guarda-livros na cidade de Lisboa:
"Não acredito em literatura latino-americana, acho este termo muito colonialista. Mas cada país do continente tem sua literatura, muito boa, por sinal."


Obs.: Quando de sua participação no júri do prêmio União Latina, em 1991. [ Jorge Amado ]

Eu, petista? Deus me livre!



O Temer baixou uma portaria que facilita o trabalho escravo, mas se você reclamar é petista. O Dória quer dar ração para crianças em creches e escolas, mas se questionar é petista. O Aécio disse que ia matar e foi salvo, mas é claro, se achar ruim é petista. As terras da Amazônia sendo entregues para os gringos e se for contra? Petista! Greve de professores? Greve dos correios? Dos bancários? Defesa da reforma agrária? Direitos das mulheres? Defesa da aposentadoria, então? Tudo petista.

Primeiro criaram o ódio ao PT, depois associaram o exercício da cidadania, o direito de questionar, de protestar e reclamar a "coisa de petista". Agora, fazem o que querem, roubam e compram deputados com bilhões e bilhões de reais do povo tranquilamente, legalizam a escravidão, perdoam dívidas de bancos e fazendeiros, entregam o petróleo, ferram com os trabalhadores sem nenhum pudor, pois no final das contas, ninguém quer ser "petista".

Diney Lenon


Acordo Sykes-Picot na origem do caos no Oriente Médio


Divisão entre franceses e britânicos de territórios do antigo Império Otomano firmada há cem anos, durante a Primeira Guerra Mundial, gerou tensões e conflitos que só se agravaram com a passagem das décadas.

Os cem anos do acordo Sykes-Picot

Há exatos cem anos, em 16 de maio de 1916, em plena Primeira Guerra Mundial, a França e o Reino Unido partilharam entre si vastas áreas do Império Otomano, já antecipando a própria vitória e sem qualquer consulta aos habitantes da região. O tratado secreto dessa partilha ficou conhecido como Sykes-Picot, em alusão aos diplomatas que o negociaram, o inglês Mark Sykes e o francês François Georges-Picot.

Aos franceses caberia um território do sudeste da atual Turquia até o Líbano, passando pelo norte do Iraque e pela Síria. Os britânicos regeriam o sul e o centro do Iraque. As terras contidas entre esses dois territórios – englobando a atual Síria, a Jordânia, o Iraque ocidental e o nordeste da Península Árabe – seriam um reino árabe sob mandato anglo-francês.

Também a Alemanha desempenhou um papel pouco louvável nessa negociata. Aliada do Império Otomano, ela queria enfraquecer por meios militares os seus inimigos na Primeira Guerra. Juntamente com o califa de Istambul, autoridade religiosa suprema dos sunitas, os alemães conclamaram os árabes à jihad, a "guerra santa" contra os britânicos.

Estes, em contrapartida, selaram uma aliança com o xarife Hussein bin Ali, segunda maior autoridade religiosa depois do califa, na qualidade de guardião das cidades sagradas de Meca e Medina, na atual Arábia Saudita.

Domínio anglo-francês sob fachada árabe

Em outubro de 1915, Henry McMahon, alto comissário da Grã-Bretanha no Egito, fez uma oferta sedutora ao xarife Hussein: se os árabes apoiassem seu país, este os ajudaria a fundar seu próprio reino. "A Grã-Bretanha está pronta a reconhecer e apoiar a independência dos árabes dentro dos territórios nos limites e fronteiras propostos pelo xarife de Meca", declarava McMahon numa carta.

A aliança foi firmada. O líder dos árabes era o filho do xarife, Faiçal bin Hussein. Apoiado pelo agente britânico Thomas Edward Lawrence – conhecido como "Lawrence da Arábia" – ele conseguiu forçar a retirada dos otomanos.

Após o fim da Primeira Guerra, a nova ordem geopolítica no Oriente Médio foi negociada na Conferência de Paz de Paris, em 1919. Engajado pela causa árabe, Faiçal comentaria: "Estou confiante de que as grandes potências colocarão o bem-estar do povo árabe acima de seus próprios interesses materiais."
No entanto, ele se enganava. A França e a Grã-Bretanha se aferraram à divisão territorial já acordada: deveria haver Estados árabes, sim, mas sob influência anglo-francesa.

Como comentou o então ministro do Exterior britânico, George Curzon, a questão era ocultar os interesses econômicos de seu país atrás de uma "fachada árabe", "governada e administrada sob direção britânica, controlada por um maometano nato e, se possível, por uma equipe árabe".


 Mapa original do acordo secreto Sykes-Picot


Novos Estados, futuros conflitos

A importância dos pactos firmados durante a Conferência de Paris foi abrangente e de longo alcance. Além de resultar na fundação da Síria e do Iraque, um mandato da Liga das Nações ratificado em 1923 confirmava a criação de um novo Estado, o Líbano.
Outro mandato previa "o estabelecimento de um Lar Nacional para o povo judaico na Palestina", base para o futuro Estado de Israel. Em Paris, Faiçal declarara: "Eu asseguro que nós, árabes, não guardamos qualquer ressentimento étnico ou religioso contra os judeus, como o que infelizmente predomina em outras partes do mundo." Contudo, essa boa vontade logo fracassaria diante de uma realidade cruel.

Também em 1923, a Grã-Bretanha separou a Transjordânia da Palestina, criando as bases para a atual Jordânia. Já em 1899 os ingleses haviam transformado o Kuwait em seu protetorado. Após o fim da Primeira Guerra, o declararam "emirado independente sob proteção britânica".

Reflexos atuais

O resultado final de tais reviravoltas geopolíticas na região foi a série de guerras e conflitos que perdura até hoje: a crescente tensão entre israelenses e palestinos, ocasionalmente explodindo em guerras; a guerra civil libanesa de 1975 a 1990; a Guerra do Golfo; os choques, igualmente com características bélicas, nos territórios curdos da Turquia e do Iraque, mais tarde também na Síria.

Tudo isso culminou na fatal invasão do Iraque pelos Estados Unidos, em 2003. A má gestão que se seguiu endureceu os fronts de caráter religioso, redundando no nascimento da organização terrorista "Estado Islâmico" (EI). Além de ocupar territórios iraquianos, o EI se alastrou para a Síria, dilacerada pela guerra civil.

A rigor, nem todos esses desdobramentos remontam exclusivamente à divisão do Oriente Médio no início da década de 1920. No entanto, nessa época foi lançado o fundamento de uma nova ordem regional que se mostrou solo fértil para tensões geopolíticas, revoltas e guerras.



1917: Apoio britânico ao movimento sionista


Na chamada Declaração de Balfour, de 2 de novembro de 1917, o governo britânico dá aos representantes do judaísmo sionista apoio para a constituição de uma "pátria nacional" judaica na Palestina.


 Frankreich Geschichte Weltkrieg Friedensvertrag von Versailles (ullstein bild - histopics)

"Caro Lorde Rothschild, alegro-me em poder comunicar-lhe, em nome do governo de Sua Majestade, a seguinte declaração de simpatia pelo movimento judaico-sionista, apresentada e aprovada pelo gabinete oficial: A construção de uma pátria para os judeus na Palestina é vista pelo governo de Sua Majestade com bons olhos.

Sua Majestade fará tudo o que for de seu alcance para facilitar os caminhos rumo a esse objetivo. Deve-se ressaltar, no entanto, que nada deve ser feito no sentido de prejudicar os direitos civis e religiosos dos povos não judeus que vivem na Palestina, ou de prejudicar os direitos e a situação política de judeus em algum outro país."

Esta carta, datada de 2 de novembro de 1917 e assinada pelo então ministro britânico do Exterior, Arthur James Balfour, prevê uma série de consequências para o Oriente Médio. Mas Lorde Rothschild e outros dirigentes da comunidade judaica, entre eles principalmente os sionistas no Reino Unido, esperavam ainda mais.

Há, no mínimo, 19 anos – desde o Congresso dos Sionistas em Basileia, em 1898 – eles ansiavam por uma promessa que assegurasse aos judeus o direito a seu próprio Estado, como havia planejado Theodor Herzl no seu livro O Estado Judeu.

Povo, não apenas comunidade religiosa

O sionismo político idealizado por Herzl partia do princípio de que os judeus são um povo e não apenas uma comunidade religiosa e de que as repetidas perseguições, pressões e desvantagens sofridas por esse povo poderiam ser evitadas com a fundação de um Estado judeu.

A localização desse Estado era ainda considerada de segunda ordem: cogitava-se a hipótese de enviar os judeus à Argentina, ou o chamado Projeto Uganda, que previa a fundação de um Estado judeu no território da Uganda, então administrado pelo Reino Unido.

Entretanto, a Palestina sempre voltava ao centro da discussão: a terra originária dos judeus, onde os representantes da comunidade judaica começaram a comprar terras e a estabelecer-se, a partir do fim do século 19. Em 1914, no início da Primeira Guerra Mundial, os judeus formavam apenas 15% da população da Palestina, na época de 690 mil habitantes. Destes, 535 mil eram muçulmanos, 70 mil cristãos e 85 mil de origem judaica.

A carta do chanceler Balfour refletia, porém, muito mais os interesses geopolíticos de Londres na região do que um apoio sem reservas do Reino Unido ao movimento sionista. A Primeira Guerra Mundial tinha eclodido, e a Inglaterra contava com o apoio dos judeus – tanto dos que viviam na Palestina, quanto dos que estavam espalhados por outros países do mundo – na luta contra o Império Otomano.

Por isso, Londres prometeu algo que não estava em condições de realizar: uma pátria para os judeus numa região que ainda não estava sob o seu controle.
Resistência palestina

A responsabilidade sobre o território palestino foi transferida para o Reino Unido somente no dia 24 de julho de 1922, sob a forma de um mandato da Liga das Nações. Parte da Declaração de Balfour pertencia ao preâmbulo do contrato que regia o mandato, o que se transformou logo num grande empecilho para a administração da região. A resistência dos palestinos árabes à imigração de judeus já tinha começado há algum tempo, crescia paulatinamente e levava, entre outros, a campanhas antijudaicas.

O Reino Unido, situado entre as duas frentes, tentava evitar a violência dos dois lados e limitar cada vez mais a imigração judaica para a região. Em 1939, ficou estabelecido que somente mais 75 mil judeus poderiam instalar-se na Palestina. Na época do Holocausto nazista, tratava-se de uma decisão completamente fora da realidade. A partir de 1944, o estabelecimento de judeus na Palestina foi oficialmente vetado, a fim de assegurar aos Aliados o apoio dos palestinos árabes na guerra.

Antes da transferência do mandato da Liga das Nações, em junho de 1922, o Reino Unido deixara claro que a Declaração de Balfour nunca fora uma resposta positiva à criação de um Estado judeu. O então ministro das Colônias, Winston Churchill, observou que a declaração não se referia a toda a região histórica chamada Palestina, mas apenas à margem ocidental do Rio Jordão (a Cisjordânia).

Churchill acentuou ainda que os ingleses nunca tinham pensado em conceder aos judeus o poder sobre os outros habitantes da região. A comunidade judaica que ali vivia deveria apenas poder desenvolver-se livremente.

Tais posições não puderam ser sustentadas por Londres durante muito mais tempo, uma vez que os conflitos entre árabes e judeus tornavam-se cada mais frequentes. Em 1947, a ONU deliberou a divisão da Palestina em dois Estados: um para os judeus e outro para os árabes. O Reino Unido abdicou do seu mandato em maio de 1948, quando foi proclamado o Estado de Israel.

Autoria Peter Philipp (sv)


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1938: Pânico após transmissão de "Guerra dos mundos"

No dia 30 de outubro de 1938, um programa de rádio simulando uma invasão extraterrestre desencadeou pânico na costa leste dos Estados Unidos.



Orson Welles ao microfone

Parecia uma noite normal naquele 30 de outubro de 1938, até que a rede de rádio CBS (Columbia Broadcasting System) interrompeu sua programação musical para noticiar uma suposta invasão de marcianos. A "notícia em edição extraordinária", na verdade, era o começo de uma peça de radioteatro, que não só ajudou a CBS a bater a emissora concorrente (NBC), como também desencadeou pânico em várias cidades norte-americanas. "A invasão dos marcianos" durou apenas uma hora, mas marcou definitivamente a história do rádio.

Dramatizando o livro de ficção científica A Guerra dos Mundos, do escritor inglês Herbert George Wells, o programa relatou a chegada de centenas de marcianos a bordo de naves extraterrestres à cidade de Grover's Mill, no estado de Nova Jersey. Os méritos da genial adaptação, produção e direção da peça eram do então jovem e quase desconhecido ator e diretor de cinema norte-americano Orson Welles. O jornal Daily News resumiu na manchete do dia seguinte a reação ao programa: "Guerra falsa no rádio espalha terror pelos Estados Unidos".

Pânico coletivo

A dramatização, transmitida às vésperas do Halloween (dia das bruxas) em forma de programa jornalístico, tinha todas as características do radiojornalismo da época, às quais os ouvintes estavam acostumados. Reportagens externas, entrevistas com testemunhas que estariam vivenciando o acontecimento, opiniões de peritos e autoridades, efeitos sonoros, sons ambientes, gritos, a emoção dos supostos repórteres e comentaristas. Tudo dava impressão de o fato estar sendo transmitido ao vivo. Era o 17º programa da série semanal de adaptações radiofônicas realizadas no Radioteatro Mercury por Orson Welles.

A CBS calculou, na época, que o programa foi ouvido por cerca de seis milhões de pessoas, das quais metade o sintonizou quando já havia começado, perdendo a introdução que informava tratar-se do radioteatro semanal. Pelo menos 1,2 milhão de pessoas acreditou ser um fato real. Dessas, meio milhão teve certeza de que o perigo era iminente, entrando em pânico, sobrecarregando linhas telefônicas, com aglomerações nas ruas e congestionamentos causados por ouvintes apavorados tentando fugir do perigo.

O medo paralisou três cidades e houve pânico principalmente em localidades próximas a Nova Jersey, de onde a CBS emitia e onde Welles ambientou sua história. Houve fuga em massa e reações desesperadas de moradores também em Newark e Nova York. A peça radiofônica, de autoria de Howard Koch, com a colaboração de Paul Stewart e baseada na obra de Wells (1866-1946), ficou conhecida também como "rádio do pânico".

Precursor da ficção científica moderna

O roteiro fora reescrito pelo próprio Welles (1915-1985). Na peça, ele fazia o papel de professor da Universidade de Princeton, que liderava a resistência à invasão marciana. Orson Welles combinou elementos específicos do radioteatro com os dos noticiários da época (a realidade convertida em relato).

Herbert George Wells, por sua vez, foi um dos precursores da literatura de ficção científica. O livro A Guerra dos Mundos, publicado em 1898, era uma de suas obras mais conhecidas, tendo Londres como cenário. Ele escreveu num estilo bastante jornalístico e tecnologicamente atualizado para sua época. A transmissão de A Guerra dos Mundos foi também um alerta para o próprio meio de comunicação "rádio".
Ficou evidente que sua influência era tão forte a ponto de poder causar reações imprevisíveis nos ouvintes. A invasão dos marcianos não só tornou Orson Welles mundialmente famoso como é, segundo cientistas de comunicação, "o programa que mais marcou a história da mídia no século 20".

Autoria Jens Teschke (gh)



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