quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Tentei fugir da mancha mais escura

Tentei fugir da mancha mais escura

que existe no teu corpo, e desisti.

Era pior que a morte o que antevi:

era a dor de ficar sem sepultura.



Bebi entre os teus flancos a loucura

de não poder viver longe de ti:

és a sombra da casa onde nasci,

és a noite que à noite me procura.



Só por dentro de ti há corredores

e em quartos interiores o cheiro a fruta

que veste de frescura a escuridão…



Só por dentro de ti rebentam flores.

Só por dentro de ti a noite escuta

o que me sai, sem voz, do coração.


David Mourão-Ferreira