domingo, 12 de dezembro de 2010

- Bons dias, avô. Não está ninguém em casa?


- Eh! - e o velho fez um gesto negativo com a cabeça. Nem Zakar nem Máximo cá estão. Motria também partiu para a floresta, em busca da vaca. A vaca, provavelmente, extraviou-se. Talvez tenha sido devorada pelos ursos...Não, não está cá ninguém.

-Não faz mal, esperarei; e, enquanto espero, faço-lhe companhia.

-Como queiras.

Enquanto prendo o cavalo a uma azinheira, o velho olha-me com os seus olhos débeis e apagados. É muito, muito velho. Não vê quase nada, e as suas mãos são trémulas.

-Quem és tu, meu rapaz? -pergunta-me ele, depois de eu me ter sentado ao seu lado.

De cada vez que apareço faz idêntica pergunta.

-Ah! Agora caio em mim. É verdade, já me recordo, diz ele, contente, enquanto vai consertando uma velha bota rota - A minha velha cabeça já não conserva memória de nada. É como um crivo: dos que morreram há muito, recordo-me bem, mesmo muito bem; mas da gente nova esqueço-me sempre. Já se vê, como vivo neste mundo há tanto tempo...

-Vive nele assim há tanto tempo?

-Vamos, vamos, que há bastante. Já cá andava quando os franceses aqui vieram para batalhar com o nosso imperador.

-Então já tem visto muito, e já pode contar muita coisa.

O velho olha para mim com estranheza.

-Eu? Que tenho eu visto? Apenas a floresta, sempre rumorosa, seja de noite ou de dia, seja de inverno ou de verão. Tenho passado aqui toda a minha vida com estas árvores, e não tenho dado conta disso. Estou quase à hora da morte; mas às vezes, quando começo a pensar, pergunto a mim mesmo se vivi verdadeiramente ou não. Talvez nunca tenha vivido...





Korolenko in Os murmúrios da floresta. Contos.Trad. Fernando Lopes Graça. Edições «Sírius», 1941, pp.96/97

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