domingo, 12 de dezembro de 2010

Tormento

Morro diante o Sol e

diante o vento e diante as crianças que disputam o cão, morro

numa manhã que não pode vir a ser nenhum poema; só triste e verde e



interminável

é essa manhã...O meu pai e a minha mãe estão na ponte e julgam

que eu venho da cidade e não me trazem senão

as suas primaveras destroçadas em grandes cestos e vêem-me -

e não me vêem, porque

eu morro diante do Sol.



Um dia não verei mais os bosques, e a erva

há-de colher a tristeza da minha irmã. O arco da porta

ficará negro e o céu já não será

inatingível

para os meus desesperos...Num dia hei-de

ver tudo e a muitos enxugar os olhos

de manhã cedo...



Estou então de novo debaixo dos jasmins e

vejo como o jardineiro dispõe os mortos nos alegretes...

Morro diante do Sol.

Estou triste, porque há sempre dias que não voltam mais...A parte



nenhuma.







Thomas Bernhard. Na Terra e no Inferno. Trad. e introdução José A. Palma Caetano. Assírio & Alvim, 2000, p. 123

Nenhum comentário: