domingo, 12 de dezembro de 2010

Pavese

Terra vermelha, terra negra

tu vens do mar,

do verde requeimado

onde há palavras

antigas e fadiga sanguínea

e gerânios entre as pedras -

não sabes o que em ti

trazes de mar palavras e fadiga,

tu rica como uma lembrança,

como o campo despido,

tu áspera e dulcíssima

palavra, antiga como o sangue

recolhido nos olhos;

jovem, como um fruto

que é lembrança e estação -

a respiração repousa

sob o céu de agosto,

as azeitonas do teu

olhar suavizam

o mar e tu vives revives

sem surpresa, certa

como a terra, escura

como a terra, moinho

de estações e de sonhos

que ao luar se revela

antiquíssimo, como

as mãos de tua mãe,

a concha da braseira.

Tu és terra e a morte.

A tua estação é a sombra

e o silêncio. Nada

vive mais distante

da aurora que tu.

Quando pareces despertar

és dor apenas,

tem-la nos olhos e no sangue

mas tu não sentes. Vives

como vive uma pedra,

como a terra dura.

Vestem-te sonhos

movimentos soluços

que tu ignoras. Como a água

de um lago a dor

tremula e envolve-te.

Há círculos sobre a água.

Tu deixa-los desvanecer.

Tu és a terra e a morte.

Virá a morte e terá os teus olhos

- esta morte que nos acompanha

de manhã à noite, insone,

surda, como um velho remorso

ou um vício absurdo. Os teus olhos

serão uma palavra vã,

um grito mudo, um silêncio.

Assim os vês todas as manhãs

quando sobre ti mesma no espelho

te inclinas. Ó minha cara esperança,

nesse dia saberemos nós também

que tu és vida e és o nada.

Para todos a morte tem um olhar.

Virá a morte e terá os teus olhos.

Será como abandonar um vício,

como ver surgir no espelho

em rosto morto, como

escutar uns lábios fechados.

Mudos, desceremos no abismo.

Cesare Pavese


Cesare Pavese in Dez Poetas Italianos Contemporâneos em selecção, tradução e notas de Albano Martins

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