quarta-feira, 16 de setembro de 2009

POESIA

Epopeia de Guilgamesh (c. século XXV a.C.) – Suméria

Quando os deuses criaram Guilgamesh
Shamash o Sol no zénite dotou-o de beleza incomparável
Adad, a tempestade, deu-lhe força invencível.
O toque do seu corpo não tem igual
A sua altura chega a onze côvados
O largo do seu peito são nove palmos
O longo do seu membro é três vezes mais nobre.
Nos terraços de Uruk, a das altas muralhas, o seu passo é soberbo
O embate das suas armas não encontra inimigo
Mas, ao som do seu tambor, fechados em suas casas, os homens não comparecem
Este Guilgamesh não deixa nenhum filho ao seu pai
Não respeita nenhuma donzela, seja filha de herói ou noiva prometida
Diante destas queixas intermináveis
Os deuses, os grandes deuses do céu
Falaram contra o senhor Guilgamesh
Criámos em Guilgamesh um touro desenfreado
O embate das suas armas não tem inimigo
Ao som do seu tambor, fechados em suas casas, os homens não comparecem
Guilgamesh não deixa nenhum filho ao seu pai
Ele, o pastor do seu povo, está a massacrá-lo
O Rei não respeita nenhuma donzela
Seja filha de herói ou noiva prometida.
Agora o grande Anu chama Aruru,
Senhora da Fertilidade:
Tu, Aruru, deixaste gerar Guilgamesh
Cria agora um que lhe seja igual no combate
Que lutem um com o outro e deixem Uruk em paz

Ouvindo isto Aruru invocou um soldado de Anu
Mergulhou as mãos na terra, colheu argila, escarrou nela e lançou aos desertos.

Assim nasceu Enki-Du, criatura do silêncio, parcela do Deus Ninurta,
O corpo rugoso o cabelo comprido luxurioso como o da mulher.
Um abundante velo espesso como o trigo
Era o seu pêlo, como o do Deus Samukan
E não conhecia cidades nem homens, nem terra cultivada
Com o onagro comia a erva da estepe
Com a gazela bebia a àgua da mina
Com a horda habitava o deserto
Esta era a sua única alegria.

(trad. Mário Cesariny).
in "ROSA DO MUNDO 2001 POEMAS PARA O FUTURO", Lisboa, Assírio & Alvim, 2001.

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