- LUIZ FERNANDO VERISSIMO
Desconfio que ainda nos lembraremos destes anos como a época
em que vivemos com o acompanhamento dos alarmes de carro. Os alarmes de carro
são a trilha sonora do nosso tempo: o som da
paranoia justificada.
O alarme é o grito da nossa propriedade de que alguém está
querendo tirá-la de nós. É o som mais desesperado que um ser humano pode
produzir – a palavra “Socorro!” –, mecanizado, padronizado e a todo volume. É
“Socorro!” acrescentado ao vocabulário das coisas, como a buzina, a campainha,
a música de elevador, o “ping” que avisa que o assado está pronto e todos os
“pings” do computador. Também é um som típico porque tenta compensar a carência
mais típica da época, a de segurança. Os carros pedem socorro porque a sua
defesa natural – polícia por perto, boas fechaduras ou respeito de todo o mundo
pelo que é dos outros – não funciona mais. Só lhes resta gritar.
Também é o som da época porque é o som da intimidação. Sua
função principal é espantar e substituir todas as outras formas de dissuasão
pelo simples terror do barulho. O som da época em que os decibéis substituíram
a razão. Como os ouvidos são, de todos os canais dos sentidos, os mais difíceis
de proteger, foram os escolhidos pela insensibilidade moderna para atacar nosso
cérebro e apressar nossa imbecilização. Pois são tempos
literalmente do barulho.
O alarme contra roubo de carro também é próprio da época
porque frequentemente não funciona. Ou funciona quando não deve.
Ouvem-se tantos alarmes a qualquer hora do dia ou da noite
porque, talvez influenciados pela paranoia generalizada, eles disparam
sozinhos. Basta alguém se aproximar do carro com uma cara suspeita e eles
começam a berrar.
Decididamente, o som do nosso tempo.
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