O casamento é também um ardil que a civilização arranjou
para manter presos à união conjugal o marido e a mulher.
Pelo casamento, como por um milagre jurídico e existencial,
os casais se mantêm juntos mesmo após ter cessado o amor e se extinguido o
desejo.
Foi uma forma que a sociedade moderna encontrou para que
marido e mulher não se separassem, embora não tenham sobrevivido, durante a
constância conjugal, os mesmos valores que existiam quando das núpcias.
Por isso é que se arrastam os casamentos em cima das ruínas
do amor e do desejo, alicerçados muitas vezes pela amizade, outras vezes pelos
filhos, que acabam sendo fortes motivos para que os casais não se separem.
O amor e o desejo são por demais fugazes para que possam ser
administrados pela perenidade do casamento.
É quase fatal a fadiga dos metais entre os casais, que se
veem assim assaltados pelo fastio e pelo tédio conjugal como uma pressão
demolidora. Mas, de outra parte, trombam esses casais com a indissolubilidade
do vínculo conjugal, que só pode ser desfeito pelo divórcio perante a lei
humana e que é inquebrantável e eterno mediante a lei religiosa.
O casamento é, pois, uma coisa muito séria. Daí que
multidões de jovens hoje o evitam, munidos da sabedoria de que cedo cessarão o
amor e o desejo e, sem ligação pelo casamento, eles podem partir para outras
uniões sem os embaraços de serem considerados amarrados ao matrimônio original.
Por isso é que muitos casais enfrentam o desgaste direto do
casamento driblando-o com técnicas diversionistas. Dormindo em camas separadas,
em quartos separados ou até em casas separadas, atenuando, assim, o absurdo
dessa condenação de solidão a dois.
Há até alguns casais que se permitem, ao marido e à mulher,
aventuras extraconjugais que os libertam do vínculo matrimonial, distraindo-se
assim em incursões libidinosas fora do eixo do casamento em si, o que os faz
suportar com estoicismo promíscuo as amarras do compromisso central.
Esses são os que mantêm o casamento com uma dança farsesca e
perigosa, que cedo ou tarde poderá acarretar danos morais e materiais
consideráveis.
Ao contrário dos outros, mais sinceros, que resolvem encarar
de frente a fatalidade da separação.
Eu já escrevi certa vez que, pior que o casamento, só a
separação. Há muitas separações bem-sucedidas, mas a maioria delas guarda
marcas doloridas, cicatrizes que acabam por atingir não raramente os filhos da
união conjugal fracassada.
Muitos casamentos iniciam-se sob o ritmo da amizade, da
compreensão, da cordialidade apaixonada e terminam nas Varas de Família em
discussões tão violentas e agressivas, que acirram ainda mais o ódio
superveniente nas relações.
Restam, no entanto, alguns raros mas expressivos exemplos de
casais que se separam e continuam amigos, até visitando-se, como fosse normal o
que lhes aconteceu. São sábios dignos de admiração. Afinal, chegaram à
conclusão de que tudo na vida tem um fim e não seria o casamento que iria se
constituir em exceção.
Da minha parte, fico extasiado quando assisto, num
restaurante ou num bar, a um ex-marido e uma ex-mulher em conversa amigável e
civilizada.
São uns heróis.
PAULO SANT’ANA - 23 Aug 2011
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