Como não amar o passado? – me pergunta uma leitora a
propósito de uma de minhas crônicas. Por uma coincidência, estive esvaziando
gavetas e encontrei o instantâneo em que outra amiga e eu passeamos de mãos
dadas pela Praça da Matriz.
Ana Laura tinha cabelos loiros e traços perfeitos. Ana Laura
e eu passeávamos de mãos dadas pela Praça da Matriz de sua cidade. Corriam
então os Anos Dourados, o dia era de verão e glorioso.
Não sei do que foi feito de Ana Laura, se casou, se ainda
mora em sua cidade, se tem filhos, se é odontóloga, advogada, médica ou
simplesmente do lar. Mas recordo como se fosse hoje nós dois tão jovens
passeando de mãos dadas num começo de namoro.
Não sei o que foi feito de Ana Laura, mas guardo a memória
precisa de seu vestido leve, de seus tornozelos finos, de seu sorriso perfeito.
Lembro que falávamos de um baile que ia haver aquela noite, de um cachorrinho
que tinha desaparecido, do Brasil, que era então um país inaugural.
Um sorridente mineiro semeava estradas, hidrelétricas,
desbravava fronteiras e instalava fábricas de automóveis onde então eles eram
importados. Fuscas, Dauphines, DKWs, Aero-Willys, Simca-Chambords enchiam ruas
e avenidas, uma rodovia rasgava a selva, Brasília erguia-se do nada em pleno
Sertão.
Vivíamos então um tempo mágico, pois os ventos da esperança
sopravam por aqui. Ana Laura era parte daquele cenário, em que soavam os
acordes da bossa nova, nascia o cinema novo, o Brasil era campeão mundial de
futebol na Suécia, Maria Esther Bueno vencia em Wimbledon, Éder Jofre arrasava
nos ringues, ganhávamos ainda certames de basquete a pesca submarina.
Onde andará Ana Laura? Será diplomata, psicanalista,
pianista? Não sei. São tudo coisas de problemática resposta. Só sei que os
tempos são outros, bem diversos daqueles em que a adolescência era azul e o
país uma festa móvel.
E o que foi feito de mim? Hoje sou todo um senhor que não
caminha pela Praça da Matriz com uma garota loira. Não há mais Anos Dourados,
somos um mar de corrupção.
Me resta a imagem da garota de 15 anos – os mesmos 15 anos
que eu tinha – e que de repente e sem aviso, no passeio pela Praça da Matriz de
sua cidade me disse aquelas palavras que jamais esquecerei.
LIBERATO VIEIRA DA CUNHA -23 Aug 2011
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