Havia um homem que
corria pelo orvalho dentro.
O orvalho da muita
manhã.
Corria de noite, como
no meio da alegria,
Pelo orvalho parado da
noite.
Luzia no orvalho.
Levava uma flecha
pelo orvalho dentro,
como se estivesse a ser caçado
loucamente
por um caçador de que
nada se sabia.
E era pelo orvalho
dentro.
Brilhava.
Não havia animal que
no seu pelo brilhasse
assim na morte,
batendo nas ervas
extasiadas por uma morte
tão bela.
Porque as ervas têm
pálpebras abertas
sobre estas imagens
tremendamente puras.
Pelo orvalho dentro.
De dia. De noite.
A sua cara batia nas
candeias.
Batia nas coisas
gerais da manhã.
Havia um homem que ia
admiravelmente perseguido.
Tomava alegria no
pensamento.
do orvalho. Corria.
Ouvi dizer que os
mortos respiram com luzes transformadas.
Que têm os olhos cegos
como sangue.
Este corria,
assombrado.
Os mortos devem ser
puros.
Ouvi dizer que
respiram.
Correm pelo orvalho
dentro, e depois
estendem-se. Ajudam os
vivos.
São doces
equivalências, luzes, ideias puras.
Vejo que a morte é
como romper uma palavra e passar
— a morte é passar,
como rompendo uma palavra,
através da porta,
para uma nova palavra.
E vejo
o mesmo ritmo geral.
Como morte e ressurreição
através das portas de
outros corpos.
Como uma qualidade
ardente de uma coisa para
outra coisa, como os
dedos passam fogo
à criação inteira, e o
pensamento
para e escurece
— como no meio do
orvalho o amor é total.
Havia um homem que
ficou deitado
com uma flecha na
fantasia.
A sua água era antiga.
Estava
tão morto que vivia
unicamente.
Dentro dele batiam as
portas, e ele corria
pelas portas dentro,
de dia, de noite.
Passava para todos os
corpos.
Como em alegria, batia
nos olhos das ervas
que fixam estas coisas
puras.
Renascia.
Herberto Helder
Nenhum comentário:
Postar um comentário