No dia 23 de janeiro de 1918, Lênin publicou um decreto que
encerrava todas as ligações entre a Igreja Ortodoxa e o Estado. Os bens da
Igreja foram desapropriados, o ensino de religião foi proibido.
Em 23 de janeiro de 1918, menos de três meses depois da
Revolução de Outubro, Lênin publicou o decreto intitulado "Sobre a
separação entre a Igreja e o Estado e entre a Escola e a Igreja".
Ele foi divulgado exatamente quando se realizava o concílio
nacional da Igreja Ortodoxa, com o qual ela pretendia libertar-se da tutela
estatal da época czarista, restabelecendo o Patriarcado. O concílio não
desejava, naturalmente, uma libertação leiga, que alijasse a Igreja da sociedade,
transformando-a em instituição privada. Por isso, protestou contra o decreto de
Lênin, mas sem qualquer resultado.
Assim, a Igreja Ortodoxa teve de resignar-se dali em diante
com o fato de que só possuía liberdade de culto, enquanto não perturbasse a
ordem pública e enquanto os fiéis não deixassem de cumprir seus deveres
cívicos. O ensino de religião foi abolido nas escolas públicas; os bolcheviques
queriam erigir um sistema estatal ateísta, de acordo com o materialismo
dialético. Mas, sobretudo, foram desapropriados os imóveis e terrenos da
Igreja, seus templos e prédios – tudo foi incluído no rol do patrimônio
popular. Desta maneira, foi retirada da Igreja a base material da sua
existência.
Segundo o decreto de Lênin, todas as comunidades religiosas
perderam os direitos de pessoa jurídica, não podendo ter propriedades, nem
receber qualquer tipo de ajuda estatal. Embora as demais Igrejas também fossem
atingidas pelo decreto, elas consideraram justo o corte de privilégios dos
ortodoxos que antes constituíam praticamente uma Igreja estatal. Mas, no fundo,
todos os direitos da Igreja foram abolidos.
Consequências da privatização da Igreja
O arcebispo Longin, representante permanente do patriarca de
Moscou na Alemanha, descreveu da seguinte maneira as consequências dessa
privatização da Igreja: "Durante o domínio comunista, as pessoas não
podiam demonstrar abertamente que eram integrantes da Igreja. Elas só podiam
exercer a sua religiosidade em casa e iam às igrejas apenas em casos muito
especiais. Quando ocupavam algum tipo de cargo público, como professor ou em
outra função importante na sociedade, não podiam deixar transparecer a sua
fé."
Inicialmente, a Igreja pagou também um elevado tributo de
sangue: durante a guerra civil, antes que os bolcheviques pudessem constituir a
União Soviética em dezembro de 1922, foram assassinados 25 bispos, quase 3 mil
sacerdotes, cerca de 2 mil monges e freiras, assim como 15 mil fiéis,
aproximadamente. A fim de evitar tal martírio, o Patriarcado de Moscou
declarou-se, muitas vezes, leal ao Estado soviético e conclamou os fiéis a
assumirem a mesma posição.
Isso provocou divisões, algumas igrejas ortodoxas russas no
exterior distanciaram-se criticamente do Patriarcado de Moscou. Mas, mesmo
atitudes de bajulação não livraram a Igreja de uma dura perseguição. Ela só
pôde sobreviver graças à fidelidade das camadas mais simples da população
russa.
Como explica o patriarca Alexis 2º de Moscou: "A
lealdade à fé ortodoxa é um dos traços mais importantes do caráter nacional do
povo russo. Mas a Igreja Ortodoxa jamais teve um caráter nacionalista. A Igreja
só pôde respirar aliviada depois que ruiu a hegemonia soviética; desde então,
desenvolve-se também um princípio de relação cooperativa entre a Igreja e o
Estado na Rússia."
Autoria Hajo Goertz (am)
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