quarta-feira, 16 de setembro de 2009

(…) Estás a ver, Alióchetchka – riu-se nervosamente Grúchenka -, gabei-me perante o Rakitka de ter oferecido uma cebola, mas a ti não me gabo, conto-te a coisa com outro propósito. É apenas uma fábula, mas é uma boa fábula, ouvi-a ainda em criança da boca da minha Matriona, que agora me serve de cozinheira.É assim: «Era uma vez uma campónia, muito má, muito mazinha, que finalmente morreu. E não deixou, depois de morta, qualquer virtude. Pegaram nela os diabos e atiraram-na para o lago de fogo. Vai daí, põe-se o anjo da guarda dela a pensar: de que virtude dela me posso lembrar para a dizer a Deus? Então lembrou-se e disse a Deus: esta mulher, na horta arrancou uma cebola da terra e deu-a a uma pedinte. Responde-lhe Deus então: pega nesta cebola e estende-lha, que se agarre a ela, e tu puxa-a, e se conseguires puxá-la para fora do lago, então que vá para o paraíso; mas se a cebola se espedaçar que a mulher fique onde está. O anjo correu, estendeu-lhe a cebola: toma, agarra-te a ela, diz-lhe, vou puxar-te. E começou a puxá-la com cuidado e já quase a tirara toda para fora quando os outros pecadores do lago, ao verem-na ser puxada, começaram todos a agarrar-se a ela para que fossem também puxados para fora. E como a campónia era mazinha, começou aos coices aos outros: É a mim que estão a puxar, a cebola é minha, não é vossa. Mal o disse, a cebola espedaçou-se. A campónia caiu no lago e ainda hoje lá está a arder. O anjo deitou a chorar e foi-se embora.» (…)

Fiódor Dostoiévski in Os Irmãos Karamázov.

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