sábado, 25 de maio de 2019

FÁBRICA DO POEMA



Waly Salomão

sonho o poema de arquitetura ideal
cuja própria nata de cimento encaixa palavra por
palavra,
tornei-me perito em extrair faíscas das britas
e leite das pedras.
acordo.
e o poema todo se esfarrapa, fiapo por fiapo.
acordo.
o prédio, pedra e cal, esvoaça
como um leve papel solto à mercê do vento
e evola-se, cinza de um corpo esvaído
de qualquer sentido.
acordo,
e o poema-miragem se desfaz
desconstruído como se nunca houvera sido.
acordo!
os olhos chumbados
pelo mingau das almas e os ouvidos moucos,
assim é que saio dos sucessivos sonos:
vão-se os anéis de fumo de ópio
e ficam-se os dedos estarrecidos.

sinédoques, catacreses,
metonímias, aliterações, metáforas, oxímoros
sumidos no sorvedouro.
não deve adiantar grande coisa
permanecer à espreita no topo fantasma
da torre de vigia.
nem a simulação de se afundar no sono.
nem dormir deveras.
pois a questão-chave é:
sob que máscara retornará o recalcado?

(mas eu figuro meu vulto
caminhando até a escrivaninha
e abrindo o caderno de rascunho
onde já se encontra escrito
que a palavra “recalcado” é uma expressão
por demais definida, de sintomatologia cerrada:
assim numa operação de supressão mágica
vou rasurá-la daqui do poema.)

pois a questão-chave é:
sob que máscara retornará?


«Há momentos em que por meio de uma única palavra, uma
única rima, o escritor de um poema encontra uma forma de
chegar onde ninguém nunca esteve antes, ou ainda, onde
nem ele esperava chegar um dia. Aquele que escreve um
poema o faz, acima de tudo, porque escrever versos é um
extraordinário acelerador da consciência, do pensamento, da
compreensão do universo. Aquele que experimenta essa
aceleração uma vez não consegue mais abandonar a chance
de repetir essa experiência, caindo na dependência do
processo, como outros o fazem com drogas e álcool. Aquele
que se encontra nesse tipo de dependência da linguagem é,
acredito eu, o que chamamos de poeta.»

 Joseph Brodsky, poeta russo, ganhador do Nobel em 1987..

(Fonte : microjornal de poesia Fluxos)

esbulho das aposentadorias


O assalto e roubo da previdência não é só o maior projeto do atual (des)governo, é o único projeto nacional, um projeto desestruturante, a extorsão de recursos públicos e poupanças dos trabalhadores, diretamente em favor dos capitais financeiros e fundos de capitalização privados, muitos no exterior e em paraísos fiscais. Só aumentará o desemprego e a crise econômica, ao diminuírem a massa salarial e adiarem as novas contratações. Keynes ao contrário, o Estado desinveste, retira a demanda, extrai mais-valia absoluta dos trabalhadores, ao aumentarem o tempo de trabalho em muitos anos e sem compensação, só com perdas, ao adiarem as aposentadorias dos atuais trabalhadores e impedirem o ingresso de jovens, de novos trabalhadores no mercado de trabalho formal. E o Guedes fala do plano de se mandar do país, com ou sem o esbulho das aposentadorias.
RCO

As mais antigas famílias de Curitiba e região


1 – Descendentes dos principais fundadores, conquistadores e povoadores das vilas de Paranaguá, São Francisco do Sul, Curitiba, Guaratuba e Morretes. Linhas genealógicas principais do Capitão-Mor e Povoador de Curitiba, Mateus Martins Leme.
2 – Sobrenome presente na região desde a virada dos séculos XVII-XVIII e com sesmarias pioneiras na família, em varonia e com o mesmo sobrenome. Tradição latifundiária e escravocrata. Famílias com muitos escravizados e sempre combatendo os ameríndios locais. Escravistas até 1888. Sobrenome frequente de origem portuguesa e utilizado por diferentes camadas étnicas e sociais.
3 – Homens da família com estatuto de “homens bons”, ocupantes dos cargos nas câmaras das vilas, juízes, vereadores e com patentes de oficiais, nas ordenanças locais ao longo de todo século XVIII e na Guarda Nacional no XIX.
4 – Com a Independência, o Império e a República também passam a ocupar cargos nos legislativos provinciais, estaduais, nacionais, deputados, senadores, nos poderes executivos, no sistema judicial, nas forças armadas, muitos com presença e serviço na Capital Nacional, antes no Rio de Janeiro e depois em Brasília.
5 – Há muitas gerações no 1% mais rico, ou próximo. Profissionais liberais (advogados, médicos, engenheiros), políticos, oficiais superiores e generais, empresários, altos funcionários, cartorários, mídia, proprietários há várias gerações.
6 – Nomes de dezenas de logradouros, ruas, avenidas, praças, escolas, hospitais, equipamentos coletivos, prédios públicos em diversos municípios.
7 – Foram casados com mulheres de famílias igualmente antigas, descendentes do senhoriato do período colonial, ou no século XX casam com mulheres de famílias de imigrantes europeus recentes e em ascensão, sempre na Santa Madre A Igreja Católica, a Igreja dos antepassados, a única que transmite a condição de “nobreza da terra” para as novas gerações e seus herdeiros “legítimos”. Parentes de padres do passado.
8 – Apoiaram todos os golpes, movimentos e governos conservadores ou reacionários nos últimos séculos.
9 – Poucos intelectuais, escritores e doutores em ciência, tecnologia e inovação.
10 - Poucas famílias com varonias e sobrenomes originários da virada dos séculos XVII-XVIII. O complexo Gomes de Oliveira, Oliveira Cercal, Oliveira Borges do qual eu pertenço. Miranda Coutinho, Rocha Loures, Guimarães, Ribas, Amaral, Siqueira Cortes, Munhoz outras do final do século XVIII: Marques dos Santos, Macedo, Santos Pacheco Lima, Oliveira Franco, Rebello, Sotto Maior, início do XIX: Camargo, Braga. Se alguém tiver mais nomes e com história familiar antiga anterior ao século XIX poderá completar.
RCO


desastre bolsonaresco.


Um governo de figuras caricatas, culturalmente, humanisticamente e educacionalmente limitadas e menores, como o de Bolsonaro, já deu errado desde antes de começar, o tempo só aumenta o tamanho do equívoco e o custo do prejuízo para a imensa maioria. Como o bolsonarismo foi ideologicamente produzido pela direita composta por militares, juízes, pastores evangélicos, policiais, jornalistas, empresários, basta analisar o ministério e o parlamento, a sua queda estará associada à profunda e merecida desmoralização de todas estas categorias a curto e médio prazos. O pós-bolsonaro, entendido também como o fora do vice-subalterno Mourão, deve ser um momento de pós-direita no Brasil e uma oportunidade histórica para a modernização institucional e reorganização de todas as instituições militares, de segurança, o sistema judicial, a grande mídia, o empresariado parasitário e todos responsáveis pela produção ideológica do desastre bolsonaresco.
RCO

Una noche




Constantino Cavafis

El cuarto era pobre y vulgar,
oculto en los altos de una taberna equívoca.
Desde la ventana se veía la calleja,
sucia y estrecha. Desde abajo
llegaban las voces de algunos obreros
que jugaban a las cartas y se divertían.

Y allí en la cama humilde, ordinaria,
poseí el cuerpo del amor, poseí los labios
voluptuosos y rojos de la embriaguez;
rojos de tal embriaguez, que también ahora
cuando escribo, ¡después de tantos años!,
en mi casa solitaria, me embriago nuevamente.