sexta-feira, 27 de setembro de 2019

Lições de sociologia política para leigos




Burguês é o detentor dos meios de produção. No popular, é o patrão. Mas não o dono da vendinha ou da loja da esquina não. É principalmente a entidade anônima que comanda as transnacionais. Proletário é aquele que de si só tem sua força de trabalho e por isso é obrigado a vendê-la no mercado. Mas tem também o 'prole-otário'. É o cabra que é proleta também mas se acha burguês e por isso vive defendendo os privilégios da burguesia. Se liga, meu irmão!



Otto Leopoldo Winck

"O fascista fala o tempo todo em corrupção. Fez isso na Itália em 1922, na Alemanha em 1933 e no Brasil em 1964. Ele acusa, insulta, agride como se fosse puro e honesto. Mas o fascista é apenas um criminoso, um sociopata que persegue carreira política. No poder, não hesita em torturar, estuprar, roubar sua carteira, sua liberdade e seus direitos".

Norberto Bobbio


"O discurso do Bolsonaro na ONU é a prova da grave falência educacional e cognitiva de várias instituições brasileiras. Não é possível um ex-oficial intermediário, um ex-parlamentar e presidente ilegítimo ser tão ignaro e ainda ter apoio de setores da magistratura, da diplomacia e de grupos empresariais tão analfabetos e retrógrados. Vergonha internacional. Os finlandeses têm uma palavra especial para esta situação - myötähäpeä, a imensa vergonha sentida por conta da vergonha ainda maior produzida por outra pessoa tola!"

Ricardo Costa de Oliveira

quando é proibido estar descontente



Sou só descontentamento e desassossego, com esta baleia franca agonizante e entalada dentro de mim:


Lélia Almeida.[1]



Si miramos la realidad, las mujeres son más sólidas, más objetivas, más sensatas. Para nosotros, son opacas: las miramos, pero no logramos ir adentro. Estamos tan empapados de una visión masculina que no entendemos. En contrapartida, para las mujeres, nosotros somos transparentes. Lo que me preocupa es que cuando la mujer llega al poder pierde todo aquello. Hay tres sexos: femenino, masculino y el poder. El poder cambia a las personas.

José Saramago.[2]


            Ai! Esta baleia franca agonizando na praia de Itaperubá, em Laguna (SC), agonizando frente à nossa impotência, resistindo e sobrevivendo a um coquetel de medicamentos para a eutanásia. Ai! Esta baleia franca entalada dentro de mim, virada numa metáfora de coisas grandes e sagradas, maravilhosas e que parecem que não tem mais lugar e nem cabida neste mundo. Resta-nos observá-la, mirar-nos, bravamente, na sua capacidade de resistência mesmo sabendo que estamos assistindo a sua morte. Passo horas pensando na baleia, tentando adivinhar-lhe as dores, os movimentos impossíveis, a respiração difícil. A baleia levo-a entalada por aonde vou, nestes dias, presa dentro de mim, e um sentimento aterrador se instala sem remédio.
            Sinto-me como o protagonista do filme do Bela Tarr, As Harmonias de Werckmeiser, quando a vida de uma pequena cidade do interior da Hungria é transformada com a chegada de uma baleia gigante empalhada. E da sua incompreensão, ao ver a baleia, quando se pergunta sobre como Deus pôde conceber uma criatura daquelas e ainda por cima fazê-la viver no mar!
            A baleia é mítica, é sagrada, é um símbolo também, e na sua grandeza é a metáfora que escolho para expressar, neste momento, o meu desassossego e o meu profundo descontentamento. Lembro das muitas vezes ao longo da minha vida que tive de mergulhar muda e só no descontentamento, na paralisia da baleia encalhada, como uma criança que ouve da mãe, engole e choro e não reclama, para aquelas situações quando as nossas sábias e pragmáticas mães sabem como ninguém que não nos resta mais nada além de obedecer e aceitar. E calar. E sempre que não pude expressar o meu descontentamento, a minha discordância, o desassossego comprometeu os meus movimentos mais espontâneos e a minha fala mais verdadeira e por isso a minha alma adoeceu. A minha alma que era um mar, um mar que já não podia conter uma baleia. A baleia que mal respira e que não desiste sob os nossos olhos atônitos.
            Tenho convivido com um profundo sentimento de frustração e de estar vivendo uma oportunidade única que está sendo desperdiçada. A minha geração de mulheres sonhou e lutou por muitas coisas lá na origem dos movimentos de mulheres deste país. Digo nas origens porque me filio a uma linhagem de outras mulheres, anteriores, que pensaram e me ensinaram tudo o que me faz, ainda hoje, me perceber como cidadã, mãe, profissional e mulher no mundo. Ensinaram-me, antes de tudo, que o movimento de mulheres sempre reivindicou a autonomia das mulheres, de forma mais importante ainda do que a igualdade com os homens. Permanece soberana, em algumas de nós, a raiz de toda esta luta que tem sido, historicamente, uma luta por autonomia. E eis que temos, neste momento, a possibilidade de duas candidatas mulheres à Presidência da República. E nunca o debate foi tão vazio, de tão baixo nível e as mulheres nunca ficaram tão caladas. A baleia agoniza, mas resiste, sinto sua respiração, sua alma que não se entrega. Ai baleia calada!
            Quando a então Ministra Dilma Roussef anunciou publicamente que tinha câncer fiquei estarrecida da maneira como os seus colegas de Esplanada e de partido expressaram publicamente o tanto que este fato podia ajudá-la a crescer nas pesquisas como candidata à Presidência da República. Os comentários foram absurdos e não ouvi nenhuma grita de indignação sobre este tratamento dispensado à Ministra, já naquele momento precisávamos ser pragmáticos, outra vez pragmáticos e batendo o martelo, ali já começava a se gestar o que temos como a estratégia urgente de todos estes meses, a pressa desenfreada, o vale tudo porque ela tem de vencer, doa a quem doa, danem-se as baleias, dane-se o meu desassossego. Falava-se da maneira como a doença podia render-lhe uma imagem de lutadora, de sobrevivente e a então Ministra tinha deixado de ser uma mulher e tinha se transformado numa candidata, ia capitalizar com a doença e com outros episódios também. Não vi ninguém questionar estas declarações desastrosas, perversas, mas parece que nada disso é importante e que minhas considerações sabem a um sentimentalismo inoportuno e incorrigível, devo dizer, a esta altura do campeonato.
            Lembro de um livro clássico que muitas mulheres da minha geração leram com atenção, Os seis meses em que fui homem, um texto canônico da Rose Marie Muraro[3] onde ela conta do estresse absoluto vivido quando teve de exercer um cargo de alta responsabilidade, e repetir assim os gestos irrefletidos, como chamo os gestos das mulheres que assumem o poder, porque só conhecemos este jeito de exercer o poder, o jeito masculino de fazê-lo, e ai de nós se não for assim, já que é este jeito que nos mantém ou destitui da coisa toda. A coreografia dos gestos irrefletidos, frutos da consciência embargada, valeu-lhe um câncer de útero. Foi uma das poucas narrativas sinceras que vi sobre o assunto.
            Outro clássico que vale a pena lembrar é O cálice e a espada da americana Riane Eisler[4], onde ela estuda, ao longo da história do mundo, as relações entre os homens e as mulheres. Atenta para o fato de que não haveria nenhuma evidência consistente, depois de tantas tentativas de prová-la, da existência de um matriarcado na história do mundo. Um matriarcado, que em exata oposição ao patriarcado seria uma sociedade onde as mulheres dominariam os homens. Para a autora isso não aconteceu e esclarece que sim, o que criou uma cultura da deusa ao longo da história do mundo e que é a que sobrevive na nossa memória, seriam momentos em que as mulheres, em comunidades matricêntricas, tinham um lugar de destaque e eram valorizadas num patamar de igualdade aos homens que simplesmente exerciam funções diferentes das delas. Aponta Creta como um momento de excelência desta evidência e propõe que estes momentos da história do mundo se constituíram em momentos de grande florescimento cultural, espiritual e de pacificação.
            A teoria de Eisler, que é muito mais inteligente e abrangente do que eu possa contar numa crônica, propõe que para que entendamos as complexas relações de dominação entre os homens e as mulheres, é necessário um olhar diferenciado sobre estas relações através do que ela chama de uma teoria da transformação cultural, a partir de uma perspectiva holística e que reflete sobre os dois modelos básicos de sociedade que subjaz à grande diversidade superficial da cultura humana. Um seria o modelo dominador, popularmente chamado de matriarcado ou patriarcado, onde uma metade da humanidade exerce a supremacia sobre a outra, e o outro modelo chamado de parceria, baseado num princípio de união e onde a diversidade não é equiparada à inferioridade ou à superioridade.
            O trabalho de Eisler que começa com estas considerações, no início dos anos 80, teve desdobramentos importantes e o livro que trata sobre o Poder da parceria[5] fez da autora uma importante ativista pela paz. Ela, recentemente, em entrevista ao GNT, disse que o Brasil, através do Bolsa Família, se constitui num exemplo a ser seguido pelo mundo, como uma prática de economia solidária e de pareceria. Ela, portanto, propõem sim, uma alternativa ao que temos no poder, um poder de parceria, onde o lugar das mulheres seja outro, diferenciado, e que sua maneira de estar no poder seja inovadora, negando, entre outras coisas, uma cultura da hierarquia burra, do mundo da guerra e da violência desmedida.
            A baleia mal respira dentro de mim, sinto-lhe as ganas de mover-se com força e agilidade, dar uma rabanada com a cauda, mover-se, mas suas forças se esvaem. As minhas mais sinceras esperanças vão-se junto com elas.
            A sensação é a de estar vivendo uma oportunidade única e, ao mesmo tempo, a de estar presenciando um irreparável desperdício histórico. O que para mim, na metade da jornada da vida, me abate sobremaneira, sabedora de que não temos muito mais tempo assim para erros incorrigíveis. A oportunidade única deve-se ao fato de que temos, neste momento, duas mulheres candidatas à Presidência da República do País. O desperdício histórico é porque a sociedade brasileira decidiu não pensar sobre este assunto, fazer de conta de que isto não está acontecendo e de onde podemos concluir que se as respostas têm sido imbecis, infantis, senso-comunsíssimas, é porque há uma ausência absoluta das perguntas importantes. E, portanto, a impossibilidade de um debate que não pode ser feito às pressas e nem sob censura.
Fala-se do figurino e do penteado das candidatas, fala-se de sua orientação sexual, falam-se banalidades e superficialidades. A candidata Dilma foi elevada a uma condição de Magna Mater, ao lado do Presidente Lula, que por sua vez, foi elevado a um patamar de líder intergaláctico ou a uma espécie de vice-Deus, coroados agora pelo nascimento de um menino chamado Gabriel, que nasceu abençoado como um anjo, o que nos faz lembrar, uma fábula outra, muito antiga, tão antiga como a existência das baleias, este bicho tão inconveniente a me triturar as vísceras de angústia e agonia.
            A propaganda eleitoral do Partido dos Trabalhadores, ao criar esta tríade de presépio, repetida à farta nos comícios, nos discursos e nos palanques, de diferentes maneiras, nega, na prática, o próprio trabalho da Secretaria Especial de Políticas das Mulheres do governo Lula, que as coloca, às mulheres brasileiras, em seus projetos e programas, como protagonistas autônomas e empoderadas sem fazer este uso reacionário e ideológico da figura da mamãezinha terna, coadjuvante, subserviente e subalterna que tem de cuidar do mundo. E trata, assim, o povo brasileiro como um bando de debilóides. Cala a boca baleia, morre baleia!
            Continuo sem respostas para as minhas perguntas. As mulheres querem o poder? E chegando lá como querem exercê-lo? Da mesma maneira que os homens? Há outro jeito das mulheres estarem no poder? Como é esse jeito? E os homens, como vão lidar com as questões propostas pelas mulheres? E se elas não concordarem? E se elas se rebelarem? E se elas não obedecerem? Qual o significado do desinteresse de um grande número de mulheres para que se lancem como candidatas? E qual o significado do voto feminino para tal ou qual candidato? E da rejeição deste mesmo voto para tal ou qual candidato? Baleia preguiçosa, burra, esqueceu de pensar, vai pagar caro por isso, pela inconsciência, baleia burra, morre baleia burra!
            A poucas semanas da eleição sinto uma imensa frustração, já entrei na pressa da coisa toda, tomara que termine logo, tomara que termine de uma vez. Morre baleia, morre. Vai morrer na praia, seu bicho burro!
            Mais uma vez o debate foi negligenciado. Mais uma vez o debate que envolve os desejos, os direitos e as reivindicações específicas das mulheres foi negligenciado, o mundo avança e a história das mulheres encalha como a baleia franca. Muito provavelmente a candidata Dilma será a próxima presidente do país. Pagaremos um preço alto pelas perguntas que deixamos de fazer, das vezes que deixamos de questionar com senso crítico e autonomia de pensamento, das vezes que deixamos de dizer não, de dizer que assim não nos serve, que não se pode tratar uma mulher de determinadas maneiras, como um ser sem vontade e de todas as vezes que compactuamos mudas com este tratamento e com a conivência e passividade de determinadas condutas, das vezes que nos omitimos, das vezes que calamos frente a impossibilidade de alguns tipos de alianças, das vezes que esquecemos que mais cedo ou mais tarde vamos ter de responder às nossas filhas, às nossas leitoras, às nossas alunas, pelas nossas próprias escolhas.
            A baleia agoniza, mas não morre, a desgraçada!
            Do outro lado do mundo, também numa praia, no final de junho, onze mulheres israelenses levaram mulheres palestinas para passear em Telavive e Jaffa, sem pedir autorização do governo do premiê Benjamin Netanyahu - em desafio à rigorosa lei de entrada em Israel, conforme nos conta Viviane Vaz[6] em matéria publicada no Correio Braziliense. "Nós comemos num restaurante, tomamos banho de mar e nos divertimos na praia". A jornalista Ilana Hammerman conta que os passeios entre palestinas e israelenses têm se repetido cada vez com um número maior de mulheres e se transformado num ato espontâneo de desobediência civil e pacífica já que elas não reconhecem a legitimidade da ocupação, dos muros e dos postos de controle instalados por Israel no território palestino da Cisjordânia.
            A baleia sente um frêmito, um frêmito como um raio, como uma faísca, um esboço de resposta, quem sabe.
            Enquanto as nossas reivindicações não forem claras, enquanto não modularmos o discurso de maneira inteligente e veemente, enquanto não dissermos a nós mesmas e ao mundo qual é a maneira que queremos exercer o poder e se de fato queremos fazê-lo, enquanto não articularmos a conduta, o gesto e a voz, só nos restará o expediente da desobediência, prática feminina tão antiga esta, que nos projeta para a margem do mundo, para fora da institucionalidade, transformadoras e revolucionárias algumas vezes, inoperantes e esquecidas, quase sempre. Que é como voltar sempre ao começo, ao começo do mundo, ao começo dos tempos. A baleia estertora dentro de mim, uma ânsia, sinto cólicas de angústia nestes últimos dias, o peso e a dor enorme de carregar esta baleia moribunda, as minhas esperanças maltratadas, e essa tristeza sem fim, uma oportunidade histórica desperdiçada, quanto retrocesso! Baleia burra. Vai morrer encalhada, vai morrer na praia, baleia burra!

1- Lélia Almeida é escritora. http://mujerdepalabras.blogspot.com/
2- http://www.escribirte.com.ar/destacados/5/saramago/noticias/864/saramago:-me-preocupa-la-mujer-en-el-poder.htm
3- MURARO, Rose Marie. Os seis meses em que fui homem. Rio de Janeiro: Rosa dos Tempos, 1993.
4- EISLER, Riane. O Cálice e a Espada: Nossa História Nosso Futuro. Imago: Rio de Janeiro, 1989.
5- EISLER, Riane. O Poder da parceria. São Paulo: Palas Athena, 2007.
6- http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia182/2010/09/07/mundo,i=211808/GRUPO+DE+MULHERES+EM+ISRAEL+DESAFIA+TABUS+PARA+SE+APROXIMAR+DE+PALESTINAS.shtml
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Los siete mensajeros





Habiendo salido a explorar el reino de mi padre, día a día voy alejándome de la ciudad y las noticias que me llegan son cada vez más raras.

Comencé el viaje cuando tenía poco más de treinta años y han pasado ya más de ocho años, seis meses y quince días de ininterrumpido camino.

Creía, en el momento de partir, que en pocas semanas habría alcanzado los confines del reino; por el contrario, seguí encontrando nuevas gentes y países y en todas partes hombres que hablaban mi mismo idioma y que decían ser mis súbditos. A veces pienso que la brújula de mi geógrafo se ha enloquecido y que, creyendo avanzar siempre hacia el sur, en realidad damos vueltas sobre nuestros propios pasos sin aumentar jamás la distancia que nos separa de la capital; esto podría explicar por qué no estamos ahora junto a la extrema frontera.

Pero más frecuentemente me atormenta la duda de que este confín no existía, que el reino se extienda sin límite alguno y que, por más que yo avance, jamás podré arribar a la frontera. Empecé el viaje cuando tenía más de treinta años, demasiado tarde, quizás. Los amigos, los mismos familiares, se burlaban de mi proyecto, opinando que iba a despilfarrar los mejores años de mi vida. Pocos de mis leales, en realidad, aceptaron partir.

Si bien era algo descuidado -mucho más que ahora- me preocupé de poder comunicarme, durante el viaje, con mis seres queridos; entre los caballeros de la escolta elegí los siete mejores para que me sirvieran de mensajeros. Creí, ignorante de mí, que tener siete mensajeros era una verdadera exageración.

Con el transcurso del tiempo advertí, por el contrario, que eran ridículamente pocos, a pesar de que ninguno de ellos fue asaltado por los bandidos ni malogró su cabalgadura. Los siete me han servido con una tenacidad y una devoción que difícilmente podré recompensar.

Para distinguirlos con facilidad les puse nombres cuyas iniciales eran alfabéticamente progresivas: Alejandro, Benito, Carlos, Daniel, Eduardo, Federico, Gregorio.

Poco acostumbrado a estar lejos de mi casa, envié al primero, Alejandro, al caer la noche del segundo día de viaje, cuando habíamos recorrido ya unas ochenta leguas. A la noche siguiente, para asegurarme la continuidad de las comunicaciones, envié al segundo, después al tercero, después al cuarto, consecutivamente, hasta la octava tarde del viaje en que partió Gregorio. El primero todavía no había regresado.

Llegó la décima noche mientras acampábamos en un valle deshabitado. Supe por Alejandro que su rapidez había sido menor a la prevista; había pensado que, yendo separado y en un corcel inmejorable, podría recorrer en el mismo tiempo el doble de distancia que nosotros, pero no había recorrido el doble, sino sólo una vez y media; en unas jornadas, mientras nosotros avanzábamos cuarenta leguas, él avanzaba sesenta, pero no más.

Lo mismo pasó con los otros. Benito, que partió la tercera noche del viaje, retornó recién a la décima quinta; Carlos, que partió a la cuarta noche, nos alcanzó en la vigésima. Muy pronto comprendí que bastaba multiplicar por cinco los días que llevábamos viajando para saber cuándo volvería el mensajero.

Al alejarnos constantemente de la capital, el itinerario de los mensajeros se hacía cada vez más largo. Después de cincuenta días de camino el intervalo entre un arribo u otro comenzó a espaciarse sensiblemente; mientras antes veía llegar al campamento un mensajero cada cinco días, el intervalo llegó a hacerse de veinticinco días; la voz de mi ciudad, de esa manera, se volvía cada vez más apagada: pasábamos semanas enteras sin tener ninguna noticia.

Una vez que transcurrieron seis meses -ya habíamos atravesado los montes Fasani- el intervalo entre uno y otro arribo de los mensajeros aumentó a cuatro meses. Ahora ellos me traían noticias lejanas; el sobre me llegaba ajado, muchas veces con manchas de humedad, debido a las noches que el portador se había visto obligado a pasar al sereno.

Avanzábamos aún. En vano buscaba persuadirme de que las nubes que se deslizaban rápidamente sobre mí eran iguales a las de mi niñez, que el cielo de la ciudad lejana no era diferente de la cúpula azul que tenía sobre mí, que el aire era el mismo, igual el soplo del viento, idénticas las voces de los pájaros. Las nubes, el cielo, el aire, los vientos, los pájaros se me aparecían en verdad, como cosas nuevas y diversas; y yo me sentía extranjero.

¡Adelante! ¡Adelante! Vagabundos encontrados por la llanura me decían que los confines no estaban lejos. Yo incitaba a mis hombres a no descansar, borraba las palabras descorazonadoras que se formaban sobre sus labios.

Ya habían pasado cuatro años de mi partida. ¡Qué larga fatiga! La capital, mi casa, mi padre, se habían vuelto extrañamente remotos, casi no me parecían reales. Ahora pasaban fácilmente veinte meses entre las sucesivas apariciones de los mensajeros. Me traían curiosas misivas amarillentas por el tiempo y en ella encontraba nombres olvidados, modos de decir insólitos para mí, sentimientos que no lograba comprender. A la mañana siguiente, después de una sola noche de reposo, mientras nosotros nos poníamos en camino, el mensajero partía en dirección opuesta, llevando a la ciudad las cartas que yo había preparado en ese mismo tiempo.

Pero ya han transcurrido ocho años y medio. Esta noche cenaba solo en mi tienda cuando entró Daniel, que aún lograba sonreír, aunque estaba muerto de cansancio. Hace casi siete años que no lo veía. Durante todo este período larguísimo no ha hecho más que correr, atravesando praderas, bosques y desiertos, cambiando quién sabe cuántas veces de cabalgadura, para traerme el paquete de sobres que hasta ahora no he tenido deseos de abrir. Ya se fue a dormir y volverá a partir mañana mismo, al amanecer.

Partirá por última vez. Consultando el calendario calculé que, aunque todo salga bien, yo continuando mi camino como lo he hecho hasta ahora y él el suyo, no podré volver a ver a Daniel hasta dentro de treinta y cuatro años. Entonces tendré setenta y dos.

Pero comienzo a sentirme cansado y es probable que me muera antes. No lo volveré a ver. Dentro de treinta y cuatro años (quizás antes, mucho antes) Daniel descubrirá, inesperadamente, los fuegos de mi campamento y se preguntará por qué nunca antes le resultó el trayecto tan corto.

Como esta noche, el buen mensajero entrará en mi tienda con las cartas amarillas, llenas de absurdas noticias de un tiempo ya sepultado; pero se detendrá en el umbral y me verá inmóvil tendido sobre el camastro, flanqueado por dos soldados con antorchas, muerto.

¡Anda, pues, Daniel, y no me digas que soy cruel! Lleva mi último saludo a la ciudad donde nací. Tú eres la última ligazón con el mundo que en un tiempo fue también mío. Los mensajes recientes me han hecho saber que han cambiado muchas cosas, que mi padre ha muerto, que la corona pasó a mi hermano mayor, que me consideran perdido, que han construido altos palacios de piedra, allá, donde estaban las encinas a cuya sombra solíamos jugar. De cualquier manera, siempre seguirá siendo mi vieja patria. Tú eres la última atadura con ella, Daniel.

El quinto mensajero, Eduardo, que me alcanzará, si dios quiere, dentro de un año y ocho meses, no podrá volver a partir porque no tendrá tiempo de regresar. Después de ti, el silencio, ¡oh, dios mío!, a menos que encuentre los anhelados confines. Pero cuanto más avanzo, más me convenzo de que no existe frontera. No existe, sospecho, frontera alguna, por lo menos en el sentido que habitualmente le damos. No hay muralla de separación, ni ríos divisorios, ni montañas que cierran el paso. Probablemente atravesaré el límite sin ni siquiera advertirlo e, ignorante de mí, continuaré mi camino. Por eso he decidido que cuando Eduardo y los demás mensajeros, después de él, me alcancen nuevamente, en vez de volver a tomar el camino de la capital, se me adelante, para que yo pueda saber con anterioridad lo que me espera.

Desde hace un tiempo una ansiedad inusitada se apodera de mí por las noches y ya no se trata de la añoranza de las alegrías pasadas, como en los primeros tiempos del viaje; más bien es la impaciencia de conocer la tierra ignota a la que me dirijo.

Advierto -y no se lo he confiado hasta ahora a nadie- cómo de día en día, a medida que avanzo hacia la improbable meta, el cielo irradia una luz insólita como jamás había visto, ni siquiera en sueños. Ha quedado definitivamente atrás el último cielo azul.

Las plantas, los montes, los ríos que atravesamos, parecen hechos de una esencia diferente de lo ya conocido y el aire me acerca presagios que no sé transmitir.

Una nueva esperanza me llevará mañana por la mañana aun más adelante, en dirección a aquella montaña inexplorada que ahora ocultan las sombras de la noche. Una vez más levantaré el campamento, y Daniel desaparecerá en el horizonte en dirección opuesta, para llevar a la ciudad remota mi inútil mensaje.

FIN

 Dino Buzzati

22 Sep 2010


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Mujima




En el camino de Akasaka, cerca de Tokio, hay una colina, llamada Kii-No-Kuni-Zaka, o "La Colina de la provincia de Kii". Está bordeada por un antiguo foso, muy profundo, cuyas laderas suben, formando gradas, hasta un espléndido jardín, y por los altos muros de un palacio imperial.
Mucho antes de la era de las linternas y los jinrishkas, aquel lugar quedaba completamente desierto en cuanto caía la noche. Los caminantes rezagados preferían dar un largo rodeo antes de aventurarse a subir solos a la Kii-No-Kuni-Zaka, después de la puesta de sol.

¡Y eso a causa de un Mujima que se paseaba!

El último hombre que vio al Mujima fue un viejo mercader del barrio de Kyôbashi, que murió hace treinta años.

He aquí su aventura, tal como me la contó:

Un día, cuando empezaba ya a oscurecer, se apresuraba a subir la colina de la provincia de Kii, cuando vio una mujer agachada cerca del foso... Estaba sola y lloraba amargamente. El mercader temió que tuviera intención de suicidarse y se detuvo, para prestarle ayuda si era necesario. Vio que la mujercita era graciosa, menuda e iba ricamente vestida; su cabellera estaba peinada como era propio de una joven de buena familia.

-Distinguida señorita -saludó al aproximarse-. No llore así.. Cuénteme sus penas... me sentiré feliz de poder ayudarla.

Hablaba sinceramente, pues era un hombre de corazón.

La joven continuó llorando con la cabeza escondida entre sus amplias mangas.

-¡Honorable señorita! -repitió dulcemente-. Escúcheme, se lo suplico... Éste no es en absoluto un lugar conveniente, de noche, para una persona sola. No llore más y dígame la causa de su pena ¿Puedo ayudarla en algo?

La joven se levantó lentamente... Estaba vuelta de espaldas y tenía el rostro escondido... Gemía y lloraba alternativamente.

El viejo mercader puso una mano sobre su espalda y le dijo por tercera vez:

-Distinguida señorita, escúcheme un momento...

La honorable señorita se volvió bruscamente. Dejó caer la manga y se acarició la cara con la mano... ¡El viejo vio que no tenía ojos, nariz ni boca!...

¡Huyó, gritando de espanto!

Corrió hasta el borde de la colina, oscura y desierta, que se extendía delante de él... Corría sin pararse y sin osar mirar hacia atrás... Por último vio, en lontananza, la luz de una linterna... Era una lucecilla tan pequeña que se hubiera podido confundir con una mosca luminosa. Era la bujía de un mercader ambulante, un vendedor de sopa que había levantado su tenderete al borde del camino. Después de la experiencia que el viejo acababa de sufrir, la más humilde de las compañías le pareció deseable. Se echó a los pies del vendedor de sopa, gimiendo:

-¡Ah!... ¡Ah!... ¡Ah!...

-«Koré»... «Koré»... -replicó el vendedor ambulante bruscamente-. ¿Qué le ocurre? ¿Le ha hecho daño alguien?

-¡No!... Nadie me ha hecho daño... -murmuró el otro-. Pero... ¡Ah!... ¡ah!... ¡ah!...

-¡Por lo menos le han dado un buen susto! -dijo el mercader, demostrando poca simpatía-. ¿Se ha encontrado con algún ladrón?

-¡No!... Pero, cerca del foso... he visto... ¡Oh!, he visto una mujer que... ¡Ah!, jamás podré describir cómo la he visto...

-¿Qué? ¿La ha visto, tal vez, así?... -exclamó el mercader.

Se acarició la cara que, de pronto, se hizo semejante a un huevo.

¡En aquel mismo instante se apagó la luz!

FIN

Lafcadio Hearn

08 Aug 2009



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