domingo, 12 de maio de 2013

BALADA DA MASTURBADORA SOLITÁRIA


by Anne Sexton

O final de um caso é sempre a morte.
Ela é a minha oficina. Olho escorregadio,
fora da tribo de mim mesma o meu fôlego
encontra-te ausente. Escandalizo
os que estão presentes. Estou saciada.
De noite, só, caso-me com a cama.


Dedo a dedo, agora é minha.
Ela não está demasiado longe. Ela é o meu encontro.
Toco-a como um sino. Reclino-me
no caramanchão onde costumavas montá-la.
Possuíste-me na colcha florida.
À noite, só, caso-me com a cama.


Toma por exemplo esta noite, meu amor,
em que cada casal mistura
com uma reviravolta conjunta, para baixo, para cima,
o dois abundante sobre esponja e pena,
ajoelhando-se e empurrando, cabeça contra cabeça.
De noite, só, caso-me com a cama.


Desta forma escapo do meu corpo,
um milagre irritante. Podia eu
colocar o mercado dos sonhos em exibição?
Espalho-me. Crucifico.
Minha pequena ameixa, dizias tu.
Á noite, só, caso-me com a cama.


Então chegou a minha rival de olhos escuros.
A dama de água, erguendo-se na praia,
um piano nas pontas dos dedos, vergonha
nos seus lábios e uma voz de flauta.
Entretanto, passei a ser a vassoura usada.
Á noite, só, caso-me com a cama.


Ela agarrou-te como uma mulher agarra
um vestido de saldo de uma estante
e eu parti da mesma forma que uma pedra parte.
Devolvo-te os teus livros e a tua cana de pesca.
No jornal de hoje dizem que és casado.
Á noite, só, caso-me com a cama.


Rapazes e raparigas são um esta noite.
Desabotoam blusas. Abrem fechos.
Descalçam sapatos. Apagam a luz.
As criaturas bruxuleantes estão cheias de mentiras.
Comem-se uns aos outros. Estão repletos.
Á noite, só, caso-me com a cama.



DOIS AMORES




Há amor parecido com a fumaça;
Se você chegar perto dele, ele se desfaz,
Dê-lhe liberdade, e ele não permanece...
É como a fumaça, mas eternamente jovem.

Há amor parecido com a sombra:
O dia inteiro fica aos teus pés, te escutando
De noite, silenciosamente, te abraça...
É como a sombra, está junto noite e dia...

~Innokenti Annenski

*original*

ДВЕ ЛЮБВИ

Есть любовь, похожая на дым:
Если тесно ей — она дурманит,
Дай ей волю — и её не станет…
Быть как дым — но вечно молодым.

Есть любовь, похожая на тень:
Днём у ног лежит — тебе внимает,
Ночью так неслышно обнимает…
Быть как тень, но вместе ночь и день…

~Иннокентий Анненский

FOUCAULT E A COMISSAO DA VERDADE



(Radio Metrópole 9.5.2013)

Affonso Romano de Sant Anna

Michel Foucault esteve no Rio em 1973, no mês de maio, fazendo palestras a convite do Departamento de Letras e Artes, que eu dirigia, Passaram-se 40 anos. É possível que muitos dos que me ouvem não tenham quarenta anos. Para mim e outros, 1973 foi ontem. A idade intemporaliza as coisas.
O fato e que Foucault veio falar sobre algo perigoso: " verdade. Como falar da “ verdade” no regime ditatorial em que vivíamos? Vou lembrar aos mais jovens: o general Médice governou entre 1969 e 1974. Foi o periodo mais duro da repressão, quando ocorreram sequestros de embaixadores e focos de guerrilha urbana e rural. Era um período em que os cidadãos desapareciam estranhamente. Na Argentina desapareceram 30 mil pessoas. E em 1973, ano em que Foucault aqui esteve, Allende foi derrubado no Chile.
Claro que tinha gente que gostava do que ocorria. Muitos ostentavam nos seus carros e janelas a frase: “Brasil ame-o ou deixe-o”. No Palácio do Planalto o general recebia os cantores de “Brasil eu te amo”. O Brasil era tricampeão mundial, e segundo os teóricos da esquerda, isto distraía o povo da revolução. O fato é que a escola de samba Beija Flor fez um enredo para agradar ao Médice, abordando o Funrural.
E aqui chega Foucault, que havia publicado um livro revolucionário sobre a história da loucura. Propunha também uma revisão, uma arqueologia do saber ocidental. E havia participado dos movimentos de maio 68 na França.
O auditório da PUC não era suficiente para tantos interessados em ver o filósofo. Muita gente fico do lado de fora, não pode entrar. Hoje quando a mesma universidade celebra a vinda de Foucault, vários telões foram colados além do auditório. Foi ali que, 40 anos depois rememorei alguns dos fatos da época ao abrir a sessão de debates, para a qual vieram alguns pensadores franceses convidados pelo Departamento de Direito e Letras.
O Brasil não é o mesmo daquele época. Paradoxalmente estão no poder os que antes eram guerrilheiros e exilados. Hoje existe a Comissão da Verdade apurando o que aconteceu naquela época. Foucault tinha um passado comunista. O muro de Berlim caiu, o comunismo acabou, a China de hoje é um paradoxo assombroso. Foucault chegou a apoiar o iatolá Komeini quando este votou ao Irã.
O que é verdade, o que é mentira?
O que diria Foucault se ressucitasse e viesse hoje aqui hoje?
A mais sensata maneira de homenagear Foucault e a “verdade”é produzir produzir um discurso “pós-foucaltiano”,além da suposta mentira e da suposta verdade. Foi o que tentei fazer.