segunda-feira, 20 de agosto de 2012

In memoriam Paul Éluard

Paul Celan

Depõe no túmulo do morto as palavras
que ele pronunciou para viver.
Deita-lhe a cabeça entre elas,
fá-lo sentir
as falas da nostalgia,
as facas.

Depõe sobre as pálpebras do morto a palavra
que ele recusa àquele
que o tratava por tu,
a palavra
que viu passar por ela o sangue do seu coração,
quando uma mão, despida como a sua,
atou aquele que o tratava por tu
às árvores do futuro.

Depõe-lhe esta palavra sobre as pálpebras:
talvez
surja nos seus olhos, ainda azuis,
um outro, mais estranho, tom de azul,
e aquele que o tratava por tu
sonhe com ele: Nós.


Paul Celan. Sete Rosas Mais Tarde. Edição Bilingue. Antologia Poética, 3ª edição. Selecção, tradução e introdução de João Barrento e Y. K. Centeno. Edições Cotovia, 1996., p. 63

The Drinker


Cantos de Safo para Átis

Cantos de Safo para Átis

Natália Correia

Mon Athis n’est pas revenue sur ses pas!…
Safo

I

Espero-a num silêncio de margem
enfeitiçada do rio e da viagem.
E na noite mais densa e mais acesa
onde aranhas de luz tecem um corpo
para a sua alma de princesa.

II

Desfez-se a brisa em meu cabelo agreste
Átis de corpo vegetal
perfumado e silvestre.
Lírio florido na mão que te procura
com delírios nos olhos
mordidos na cintura.

III

Como pombas
seus seios vêm pousar nas minhas mãos.
Estremecem e partem.
Como pombas minhas mãos os perseguem.

IV

Virginal
abandonou-se no meu colo
claro e penetrante como o olhar de Apolo.
Partiu
purificada na alegria
dum corpo que lhe dei.
Fiquei
na estrela que o brilho me copia.
Acesa mas tão fria.

V

Lentos meus gestos desenham o seu rosto
rasgando a escuridão da sua ausência.
E o meu canto enleia-se no gosto
de a cantar em distância e em transparência.

Natália Correia. Poesia Completa. Publicações Dom Quixote, 1ª edição, Lisboa, 1999, p. 87/8


La Damnation de Faust (Brussels – may 2002)

Antonio Pappano is conducting – Susan Graham

– D’amour l’ardente flamme

D’amour l’ardente flamme,
Consume mes beaux jours.
Ah! la paix de mon âme
A donc fui pour toujours!
Son départ, son absence
Sont pour moi le cercueil,
Et loin de sa présence,
Tout me paraît en deuil.
Alors ma pauvre tête
Se dérange bientôt,
Mon faible cœur s’arrête,
Puis se glace aussitôt.
Sa marche que j’admire,
Son port si gracieux,
Sa bouche au doux sourire,
Le charme de ses yeux,
Sa voix enchanteresse,
Dont il sait m’embraser,
De sa main, la caresse,
Hélas! et son baiser,
D’une amoureuse flamme,
Consument mes beaux jours!
Ah! le paix de mon âme
A donc fui pour toujours!
Je suis à ma fenêtre,
Ou dehors, tout le jour -
C’est pour le voir paraître,
Ou hâter son retour.
Mon cœur bat et se presse
Dès qu’il le sent venir,
Au gr? de ma tendresse,
Puis-je le retenir!
O caresses de flamme!
Que je voudrais un jour
Voir s’exhaler mon âme
Dans ses baisers d’amour

Loves burning flame
Consumes my life.
Ah, my souls peace
Has fled for ever.
His departure, his absence
Are death to me,
And far from his presence
All seems to me in mourning.
Now my poor head
Is soon in turmoil,
My feeble heart stops,
Then at once freezes over.
His gait that I admire,
His carriage so graceful,
His mouth sweetly smiling,
The charm of his eyes,
His enchanting voice
With which he knows how to set me afire,
The caress of his hand,
Alas! and his kiss,
The flame of love
Consume my life.
Ah, my souls peace
Has fled for ever.
I am at my window
Or outside all day -
To see him appear,
Or hasten his return.
My heart beats and throbs faster
When it senses his coming,
O that through my tenderness
I might bring him back!
O burning caresses!
How I should wish one day
To see my soul sigh
In his loving kisses!