O problema do manipulado é que ele não sabe que é
manipulado. Até fica bravo quando o chamam de manipulado. Sim, ele concorda que
a mídia manipula e distorce informações. Só que pensa que ele, que se alimenta
dela e de seus ecos nas redes sociais, é imune a essas manipulações. Vamos ver
um exemplo. Ele está meio confuso agora, porque sempre lhe falaram que o Putin
era do mal e o Exército Islâmico também. Então como entender que o mal ataque o
mal? Ele só não sabe que o Exército Islâmico -- aquele que decapita e crucifica
pessoas -- foi criado e sustentado pelo Ocidente para derrubar Bassad Al-Assad,
sempre chamado com gosto de ditador sanguinário (como se Obama não fosse usar
de força máxima se aparecesse nos EUA uma grupo terrorista que quisesse
defenestrá-lo). Ele não sabe também que a Síria de Assad era o país árabe mais
laico e moderno do Oriente Médio: lá conviviam numa boa xiitas, sunitas,
alauítas, cristãos e laicos. Em Damasco, se você quisesse, podia tomar de boa
uma cerveja num pub e dançar música eletrônica num clube. Pois bem: queriam
derrubar esse regime para pôr o que no lugar? Os fanáticos do Exército
Islâmico. Então o manipulado, que se sente bem informado e enche a boca pra
falar mal dos bolivarianos, está meio sem entender nada agora. Acontece que a
manipulação da mídia é tão descarada que ela pinta de mocinho de vilão e de
vilão o mocinho. E o manipulado, coitado, não sabe que nesta história -- e em
muitas outras -- o vilão é na verdade o mocinho.
sábado, 3 de outubro de 2015
Desgasta-me perceber que numa época em que dizer que a
crítica literária não existe é algo como afirmar que todos os políticos são
desonestos – uma sentença definitiva e abrangente –, uma resenha dupla de
Amador Ribeiro Neto sobre os semifinalistas do Prêmio Oceanos acabe gerando
tanta repercussão. Duas coisas me incomodam sobremaneira. 1) uma certa
estratégia contemporânea: para ser ouvido atualmente é preciso andar mais na
direção da agressão do que da compreensão, mais beligerância do que
entendimento. 2) num território reconhecido de ausência de políticas
educacionais – os dados estão aí, mostrando como o brasileiro sequer lê, na
média, dois livros por ano –, penso que um crítico literário poderia cumprir um
papel fundamental nesse cenário de excessos e desventuras: auxiliar leitores a
procurar (ou não) certos autores, certos livros.
A crítica destrutiva por ela mesma pouco me interessa.
Infelizmente gera audiência e desconfio que impele outros entusiastas a
praticar o mesmo caminho retórico.
Daniel Zanella
Mídia - Propaganda Política e Manipulação
"CONSIDERANDO O PAPEL QUE A MÍDIA ocupa na política contemporânea,
somos obrigados a perguntar: em que tipo de mundo e de sociedade queremos viver
e, sobretudo, em que espécie de democracia estamos pensando quando desejamos
que essa sociedade seja democrática? Permitam que eu comece contrapondo duas
concepções diferentes de democracia. Uma delas considera que uma sociedade
democrática é aquela em que o povo dispõe de condições de participar de maneira
significativa na condução de seus assuntos pessoais e na qual os canais de
informação são acessíveis e livres. Se você consultar no dicionário o verbete
"democracia" encontrará uma definição parecida com essa.
Outra concepção de democracia é aquela que considera que o
povo deve ser impedido de conduzir seus assuntos pessoais e os canais de
informação devem ser estreita e rigidamente controlados. Esta pode parecer uma
concepção estranha de democracia, mas é improtante entender que ela é a
concepção predominante."
Noam Chomsky
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