sábado, 1 de janeiro de 2011

Soneto XV

Quando penso que tudo o quanto cresce

Só prende a perfeição por um momento,

Que neste palco é sombra o que aparece

Velado pelo olhar do firmamento;



Que os homens, como as plantas que germinam,

Do céu têm o que os freie e o que os ajude;

Crescem pujantes e, depois, declinam,

Lembrando apenas sua plenitude.



Então a idéia dessa instável sina

Mais rica ainda te faz ao meu olhar;

Vendo o tempo, em debate com a ruína,



Teu jovem dia em noite transmutar.

Por teu amor com o tempo, então, guerreio,

E o que ele toma, a ti eu presenteio

William Shakespeare

Soneto XVII

Se te comparo a um dia de verão

És por certo mais belo e mais ameno

O vento espalha as folhas pelo chão

E o tempo do verão é bem pequeno.



Às vezes brilha o Sol em demasia

Outras vezes desmaia com frieza;

O que é belo declina num só dia,

Na terna mutação da natureza.



Mas em ti o verão será eterno,

E a beleza que tens não perderás;

Nem chegarás da morte ao triste inverno:



Nestas linhas com o tempo crescerás.

E enquanto nesta terra houver um ser,

Meus versos vivos te farão viver

William Shakespeare

Notre Dame 1920

poemas de Hans Borli

A força das palavras



HANS BØRLI – Poesia & Ltda.

AS PALAVRAS



Temor das palavras –

eis algo que aprendi.

Versos que escrevi

versos que queimei.



Da dúvida no meu coração

sussurros crueis começam:

“Fraco, escreves

com uma arte emprestada.



A folha é adorável

quando é branca.

Poupa o espaço para a palavra

que não podes escrever”.



(1949)



NÓS TEMOS AS FLORESTAS



Nunca fui dono de uma árvore.

Nenhum dos meus

alguma vez teve uma árvore –

embora o percurso da minha familia sopre

desde há séculos sob o cume

da floresta.



Floresta na tempestade,

floresta na acalmia –

floresta, floresta, floresta,

através dos anos.



Os meus

foram sempre uma gente pobre.

Sempre.

Filhos de vidas

e noites duras e geladas.



Os estranhos possuem as árvores,

e a terra,

a terra de pedras amontoadas

que meus pais removeram

à luz do luar.



Estranhos

com faces lisas

e mãos bonitas

e carro sempre aguardando

ao portão.



Nenhum dos meus

alguma vez teve uma árvore.

E ainda assim possuímos as florestas

pelo direito hereditário do nosso sangue.



Homem rico,

com teu carro e livro de cheques

e acções na companhia de madeiras de Borregaard:

podes comprar mil acres de floresta,

e mil acres mais,

mas não podes comprar o pôr-do-sol

ou o sussurro do vento

ou a alegria de regressar a casa

quando a urze floresce ao longo do caminho –



Não, nós temos as florestas,

do modo que uma criança tem sua mãe.



(1952)



DISTÂNCIA



Levanto-me e olho o céu

numa tarde de primavera sob o vôo das galinholas.

Estranho! A estrela maior

é uma coisa minúscula, pequenina

que a folha do vidoeiro pode cobrir.

– – –

Distância, é a distância

que torna o que é eterno suportável

Ainda bem que lança tão grande sombra,

a pequena coisa que está próxima…



(1958)



DEPOIS DE AUSCHWITZ



É difícil

olhar os próprios olhos

depois do que aconteceu

em Auschwitz.

Em Hiroshima.

Em Song My –



MAS NÃO VOLTES O ESPELHO.



Não penses

que aquele inferno teria sido possível

sem tu e eu.



(1972)



UMA COISA É NECESSÁRIA



Uma coisa é necessária – aqui

neste nosso mundo díficil

de sem-abrigos e desterrados:



Fixares residência em ti.



Entra pela escuridão

e limpa a fuligem da lâmpada.



Para que as pessoas na estrada

possam entrever uma luz

em teus olhos habitados.



(1974)



ENVELHECER



Envelhecer é um comércio triste,

incurável e solitário

como a alopécia.

E o pior é que

nunca consegues dividir

o cordão umbilical esticado

que te liga à juventude.



De repente podes dar contigo

saltando descalço na relva

e pulando em saltos loucos

sobre as alegres nascentes da juventude,

embora realmente estejas sentado numa pedra

apoiando o queixo numa bengala curva

sentindo a osteoartrite rasgar a

marcha dos pés, velhos e pesados.



(1991, publicação póstuma)



HANS BØRLI(1918-1989) nasceu em Eidskog, próximo da cidade de Kongsvinger, no condado de Hedmark, sudeste da Noruega.