sábado, 18 de junho de 2011

Figadal

Agora sim estou preparado pra não gostar do que quer que seja em você.Tenho tanta certeza da droga que você vai me oferecer , que nem ficarei louco. Ficarei é calmo, entre morto de ódio e de tédio, se você quer saber .Aliás, se você quer mesmo saber, compre os seus próprios livros (na hipótese de que ensinem alguma coisa depois de escritos): leia os clássificados de aluguel. Encontrei esse lugar bem quentinho pro meu deserto , onde a desolação fermenta esterelidade. Diga ao povo que fico é aqui. Nem vou me coçar. Claro que você não perderá uma chance de me encher o saco. É o pouco do muito que eu sei. Vamos...pode mandar. Mostre-me o que você quiser. Nem ligo. Tenho um fígado inteiro pra nos servir em prato frio.

Fernando Bonassi. "Da Rua "
http://lovetheuglytoo.tumblr.com/

A relatividade da idade de ouro segundo Allen

Até quem não gosta de Woody Allen tem gostado deste Woody Allen. Por que, teria ele errado a mão em Meia Noite em Paris? Nada disso. É o mesmo Woody de sempre, inventivo, engraçado, profundo. Quer dizer, um artista em sua maturidade, que não se cansa de escavar em seu inesgotável imaginário na busca de novas histórias para retrabalhar velhos temas. Quem é muito ligado em novidades não nota isso. Novidades passam como o vento, e em geral é tudo bobagem. Nada fica. O velho e bom Allen permanece. Acontece que esse filme tem tanta leveza que mesmo gente ranzinza ou ávida pela última “grande obra” lançada pela indústria do entretenimento parece capaz de desfrutá-lo. O que é ótimo. Faltam humor e inteligência ao mundo.

E é com inteligência e humor que Allen trabalha em Meia Noite em Paris um conceito em aparência complexo: existe uma idade de ouro da humanidade ou ela é só construção mental de quem vive insatisfeito em seu próprio tempo?

Essa questão, na verdade fascinante, ganha corpo na figura do escritor Gil (Owen Wilson), que se encontra em Paris com a noiva chatinha e os futuros sogros, riquíssimos. Gil é uma alma que poderíamos chamar de romântica. Ou de civilizada, dependendo do ponto de vista. O contraponto aqui é entre a Europa, refinada, suposta amante das artes, e os Estados Unidos, brutalizados pelo dinheiro. Civilização x barbárie. Uma dicotomia meio tosca (como quase todas), muitas vezes utilizada pelos europeus em causa própria, mas raramente por um norte-americano, como Allen. Também é verdade que Woody Allen hoje consegue filmar na Europa e não em seu país. Fatos são fatos.

De qualquer forma, a mística europeia – a de Paris, em particular – historicamente provocou um êxodo da intelligentsia norte-americana para lá nos anos 1930 e 30. Zelda e Scott Fitzgerald, Hemingway e Gertrude Stein frequentavam-se e a outros europeus na diáspora, como os espanhóis Picasso, Salvador Dalí e Luis Buñuel. Todos em Paris, centro do mundo, de outro mundo que não o nosso. Estaria lá e naquele tempo a tal idade de ouro? Pode ser, pode não ser.

Allen usa um expediente de ficção científica, a viagem no tempo, para debater a questão. Mistura figuras reais a personagens imaginárias, como o próprio Gil e também as dulcíssimas Adriana (Marion Cotillard) e Gabrielle (Léa Seydoux). Ambas francesas e incumbidas de “mostrar” a Gil as ambivalências da idealização, por um lado. E também certa sabedoria da vida, simples como gota d”água, aquela que consiste em aproveitar o melhor possível o tempo que nos é dado, já que é tudo o que temos. Talvez haja algum didatismo na maneira como esse teorema se demonstra em Meia Noite em Paris. Como se Woody Allen tivesse medo de que o público não o seguisse de todo.

Ninguém pode culpá-lo por esse receio, e só podemos agradecê-lo e curtir mais este filme solar, daqueles raros a nos dar alguma esperança que não pareça fraudulenta ou ingênua.

Luiz Zanin Oricchio – O Estado de S.Paulo

Por que nome chamaremos



Por que nome chamaremos

quando nos sentirmos pálidos

sobre os abismos supremos?

De que rosto, olhar, instante,

veremos brilhar as âncoras

para as mãos agonizantes?

Que salvação vai ser essa,

com tão fortes asas súbitas,

na definitiva pressa?

Ó grande urgência do aflito!

Ecos de misericórdia

procuram lágrima e grito,

– andam nas ruas do mundo,

pondo sedas de silêncio

em lábios de moribundo.

Cecília Meireles


Melhores Poemas, Global Editora, 1984 – S.Paulo, Brasil

Reflexão

Há certas almas

como as borboletas,

cuja fragilidade de asas

não resiste ao mais leve contato,

que deixam ficar pedaços

pelos dedos que as tocam.





Em seu vôo de ideal,

deslumbram olhos,

atraem as vistas:

perseguem-nas,

alcançam-nas,

detem-nas,

mas, quase sempre,

por saciedade

ou piedade,

libertam-nas outra vez.





Ela, porém, não voam como dantes,

ficam vazias de si mesmas,

cheias de desalento...





Almas e borboletas,

não fosse a tentação das cousas rasas;

- o amor de néctar,

- o néctar do amor,

e pairaríamos nos cimos

seduzindo do alto,

admirando de longe!...









Gilka Machado

(in Sublimação, 1928)

Para os que virão

Como sei pouco, e sou pouco,

faço o pouco que me cabe

me dando inteiro.

Sabendo que não vou ver

o homem que quero ser.



Já sofri o suficiente

para não enganar a ninguém:

principalmente aos que sofrem

na própria vida, a garra

da opressão, e nem sabem.



Não tenho o sol escondido

no meu bolso de palavras.

Sou simplesmente um homem

para quem já a primeira

e desolada pessoa

do singular - foi deixando,

devagar, sofridamente

de ser, para transformar-se

- muito mais sofridamente -

na primeira e profunda pessoa

do plural.



Não importa que doa: é tempo

de avançar de mão dada

com quem vai no mesmo rumo,

mesmo que longe ainda esteja

de aprender a conjugar

o verbo amar.



É tempo sobretudo

de deixar de ser apenas

a solitária vanguarda

de nós mesmos.

Se trata de ir ao encontro.

(Dura no peito, arde a límpida

verdade dos nossos erros.)

Se trata de abrir o rumo.



Os que virão, serão povo,

e saber serão, lutando.

Thiago de Mello





Faltam-te pés para viajar?


Viaja dentro de ti mesmo,

e reflete, como a mina de rubis,

os raios de sol para fora de ti.

A viagem conduzirá a teu ser,

transmutará teu pó em ouro puro.





RUMI

SILENCE

I could spend my life hearing your silence

cause it springs like the voice of the rose,

it sings like the rhythm of the ocean,

when there is no sound between the waves.

I stop everything that I've been doing with my soul,

with my wings, and I use them to listen and keep.



You are not like everybody else.



You are like an one that came from the galaxies,

with veils of light or tissue, white or blue, or something

and everything that we want is to be pleasant,

cause we are burning of tenderness.

But there is a fear which stabs the stomach,

a fear of doing the wrong thing, being untimely,

being too much Latin-American and brute.

So when a smile becomes true, it's the eden,

the contact with the higher, the beautiful, the pure.



I could spend my life listening to your silence.

Cause it is religion. And I never found that kind of peace before.





Igor Buy