quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

LISTA DE PREFERÊNCIAS




Bertolt Brecht
(Trad. Paulo Cesar Souza)

Alegrias, as desmedidas.
Dores, as não curtidas.

Casos, os inconsequentes.
Conselhos, os inexequíveis.

Meninas, as veras.
Mulheres, insinceras.

Orgasmos, os múltiplos.
Ódios, os mútuos.

Domicílios, os passageiros.
Adeuses, os bem ligeiros.

Artes, as não rentáveis.
Professores, os enterráveis.

Prazeres, os transparentes.
Projetos, os contingentes.

Inimigos, os delicados.
Amigos, os estouvados.

Cores, o rubro.
Meses, outubro.

Elementos, os fogos.
Divindades, o logos.

Vidas, as espontâneas.
Mortes, as instantâneas.


eu até casaria com um negro, mas sei que ele sofreria muito. o brasileiro é muito racista.

você não é brasileira?

sou, mas não sou racista. deus me livre. até já namorei um negro. um negro lindo, tipo atleta. eu era louca por ele. era, não. ainda sou.

e não ficou com ele?

não. por causa do filho.

vocês tiveram um filho?

te falei. o filho que eu não teria coragem de ter com ele.

e isso não te faz infeliz?

claro que faz. mas a vida não é feita só de felicidade, concorda? a vida é dura.
Ricardo Aleixo


queria lhe dizer uma coisa, rapaz: não devia falar tanto em racismo. que o racismo é isso, que o racismo fez aquilo.

senhora.

você é tão inteligente e esforçado, que.

senhora, deixe eu lhe dizer uma.

que as pessoas nem reparam muito que você é negro.

senhora, me escute. por favor.

sabe que você fica até bonito quando fala em público?

a senhora já foi à merda?

hã? fale um pouquinho mais alto, filho.

a senhora já foi à américa?

ah! já! quando meu marido era vivo a gente ia lá uma vez por ano. no mínimo.

parece com a senhora.

o que?

isso de ir à merda uma vez por ano. já pensou em morar lá?

ah! você é muito gentil. pensei, sim. um dia, quem sabe, não é? bom, deu minha hora, preciso ir. diga à sua mãe que ela está de parabéns pela educação que deu a você.

digo sim. ela vai ficar feliz de saber que encontrei alguém como a senhora.

eu vou indo, então, querido. até outro dia.

ah! senhora! nunca deixe de ir à merda, ok?

está bem, filho, está bem. adeusinho.

Ricardo Aleixo

À Brasília de Oscar Niemeyer




Eis casas-grandes de engenho,
horizontais, escancaradas,
onde se existe em extensão
e a alma todoaberta se espraia.

Não se sabe é se o arquiteto
as quis símbolos ou ginástica:
símbolos do que chamou Vinicius
"imensos limites da pátria"

ou ginástica, para ensinar
quem for viver naquelas salas
um deixar-se, um deixar viver
de alma arejada, não fanática.

João Cabral de Melo Neto