sábado, 30 de dezembro de 2017

O ano de 2017 foi marcado culturalmente e existencialmente pelo “vão malandros”

O ano de 2017 foi marcado culturalmente e existencialmente pelo “vão malandros”. Os mais corruptos instalados no poder roubado e com a contribuição do judiciário, da mídia e da bolsa de valores, a corrupção reabilitada na República do Nepotismo ! A má malandragem, uma consciência ruim e infeliz de viver a vida aplicando golpes e rasteiras nos outros, caracteriza aspectos do comportamento nacional, não os tradicionais malandros e malandras da música, mas a turma da arte de furtar do ganho fácil, público e privado, do governo, do legislativo, do judiciário e de ex-militares no Brasil. Nenhuma sociedade sobrevive sem princípios éticos, sem o domínio da lei para todos e sem a legitimidade proporcionada somente pela hegemonia do voto democrático da maioria. O Brasil se converteu em uma caricata republiqueta golpista dirigida por figuras sombrias e nefastas como Temer, Aécio, Eduardo Cunha, Jucá, Moreira Franco, Rodriguinho Maia, Padilha, Marun e seus quadrilheiros fisiológicos, desnacionalizadores, entreguistas nos envergonhados MDB, PSDB e DEM, votófobos, os que têm medo do voto popular direto. Parte do judiciário golpista autoritário e lavajateiro está completamente podre e somente uma reformulação constituinte poderá regenerá-lo, tamanha a podridão na magistratura golpista, mamando acima dos tetos, advogando para causas plutocráticas e politiqueiras a serviço das oligarquias golpistas. A crise mental é tão grave que um candidato presidencial deficiente, que praticamente foi expulso das Forças Armadas, quer substituir o tradicional Patrono Duque de Caxias por outro patrono, o da masmorra e da tortura contra mulheres presas, deslustrando e emporcalhando completamente a missão dos militares na formação brasileira, outro sintoma da malandragem nepotista institucionalizada por verdadeiros inúteis e que nunca trabalharam, estudaram ou beneficiaram a maioria com suas míseras existências nas mordomias do legislativo. O Brasil termina 2017 com essa sofrida ressaca golpista, aumento do desemprego depois de reforma trabalhista malandra para beneficiar os mais ricos, reformas de Estado para garantirem os privilégios de poucos e a exclusão da maioria na educação e saúde. Aumentos dos preços do gás, combustíveis, energia, passagens, perdas salariais, tudo revela a farsa da malandragem, desde as fracassadas jornadas de junho de 2013 abrindo as portas para o golpismo. A mídia desqualificada é outro paraíso para malandros tipo golpe news, um pego em flagrante de racismo elitizado, como todos seus asseclas serão desmascarados na arte de manipularem e enganarem os Homer Simpsons paneleiros e coxinhas dos estratos médios incultos. 2017 fecha com a realização da meta de malandragem e de falência social dos golpistas cumprida. Não podem enganar todos o tempo todo. 2018 será um ano da verdade para os destinos do Brasil. Somente a democracia, eleições livres e com todos candidatos populares, principalmente Lula, o candidato na frente e crescendo nas pesquisas. Somente o consenso eleitoral do legítimo voto direto presidencial poderá garantir um futuro de estabilidade e progresso para todos. Sem democracia resta o caos.

RCO


Um acordo e seis verdades


Autor: José Luís Fiori
Valor Econômico - 26/05/2010

"A mediação bem sucedida de Lula com o Irã alçaria o Brasil no cenário mundial." O Globo, 16 de maio de 2010, p. 38.

Na terça feira, 18 de maio de 2010, foi assinado o Acordo Nuclear entre o Brasil, a Turquia e o Irã, que dispensa maiores apresentações. E como é sabido, quarenta e oito horas depois da assinatura do Acordo, os Estados Unidos propuseram ao Conselho de Segurança da ONU, uma nova rodada de sanções ao Irã, junto com a Inglaterra, França e Alemanha, e com o apoio discreto da China e da Rússia.

Apesar da rapidez dos acontecimentos, já é possível decantar algumas verdades no meio da confusão: 1) A iniciativa diplomática do Brasil e da Turquia não foi uma "rebelião da periferia", nem foi um desafio aberto ao poder americano. Neste momento, os dois países são membros não permanentes do Conselho de Segurança da ONU, e desde o início contaram com o apoio e o estímulo de todos os cinco membros permanentes. Além disso, as diplomacias brasileira e turca estiveram em contato permanente com os governos desses países durante a negociação. A Turquia pertence à OTAN, e abriga em seu território armas atômicas norte-americanas. E o presidente Lula recebeu carta de estímulo do presidente Barack Obama, duas semanas antes da assinatura da visita de Lula, e a secretária de Estado norte-americana declarou - na véspera do Acordo - que se tratava da "última esperança" de solucionar de forma diplomática a "questão nuclear iraniana".

2) O que provocou surpresa e irritação em alguns setores, portanto, não foram as negociações, nem os termos do acordo final, que já eram conhecidos. Foi o sucesso do presidente brasileiro que todos consideravam impossível ou muito improvável. Sua mediação viabilizou o acordo, e ao mesmo tempo descalçou a proposta de sanções articulada pela secretária de Estado americana depois de sucessivas concessões à Rússia e à China. E, além disso, criou uma nova realidade que já escapou ao controle dos Estados Unidos e seus aliados, e do Brasil e Turquia.

3) A reação americana contra o Acordo foi rápida e ágil, mas o preço que os Estados Unidos pagarão pela sua posição contra esta iniciativa pacifista será muito alto. Perdem autoridade moral dentro das Nações Unidas e perdem credibilidade entre seus aliados do Oriente Médio, com a exceção de Israel, por razões óbvias. E já agora, passe o que passe, o Brasil e a Turquia serão uma referência ética e pacifista, em todos os desdobramentos futuros deste contencioso.

4) Existe consenso que a estrutura de governança mundial estabelecida depois da II Guerra Mundial, e reformulada depois do fim da Guerra Fria, já não corresponde à configuração do poder mundial. Está em curso uma mudança na distribuição dos recursos do poder global, mas não se trata de um processo automático, e dependerá muito da capacidade estratégica e da ousadia dos governos envolvidos nesse processo de transformação. O Oriente Médio faz parte da zona de segurança e interesse imediato da Turquia, mas no caso do Brasil, foi a primeira vez que interveio numa negociação longe de sua zona imediata de interesse regional, envolvendo uma agenda nuclear, e todas as grandes potências do mundo. A mensagem foi clara: o Brasil quer ser uma potência global e usará sua influência para ajudar a moldar o mundo, além de suas fronteiras. E o sucesso do Acordo já consagrou uma nova posição de autonomia do Brasil, com relação aos Estados Unidos, Inglaterra e França e, também, com relação aos países do Bric.

5) O acordo seguirá sendo a melhor chance para prevenir um conflito militar em todo o Oriente Médio. As sanções em discussão são fracas, já foram diluídas, não são totalmente obrigatórias, e não atingirão a capacidade de resistência iraniana. Pelo contrário, se foram aprovadas e aplicadas, liberarão automaticamente o governo do Irã de qualquer controle ou restrição, diminuirão o controle norte-americano e da AIEA, acelerarão o programa nuclear iraniano e aumentarão a probabilidade de um ataque israelense. Porque os Estados Unidos já estão envolvidos em duas guerras, e não é provável que a OTAN assuma diretamente esta nova frente de batalha, a despeito do anti-islamismo militante, dos atuais governos de direita, da Alemanha, França e Itália.

6) Por fim, o jornal "O Globo" foi quem acertou em cheio, ao prever - com perfeita lucidez - na véspera do Acordo, que o sucesso da mediação do presidente Lula com o Irã projetaria o Brasil, definitivamente, no cenário mundial. O que de fato aconteceu, estabelecendo uma descontinuidade definitiva com relação à política externa do governo FHC, que foi, ao mesmo tempo, provinciana e deslumbrada, e submissa aos juízos e decisões estratégicas das grandes potências.




"O correr da vida embrulha tudo. A vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem." (João Guimarães Rosa)

REFLEXÃO SOBRE O OSSO DA MINHA PERNA



A parte mais durável de mim
são os ossos
e a mais dura também

como, por exemplo, este osso
da perna
que apalpo
sob a macia cobertura

ativa
de carne e pele
que o veste e inteiro
me reveste
dos pés à cabeça
esta vestimenta
fugaz e viva

sim, este osso
a mais dura parte de mim
dura mais do que tudo o que ouço
e penso
mais do que tudo o que invento
e minto
este osso
dito perônio

é, sim,
a parte mais mineral
e obscura
de mim
já que à pele
e à carne
irrigam-nas o sonho e a loucura

têm, creio eu,
algo de transparente
e dócil
tendem a solver-se
a esvanecer-se
para deixar no pó da terra

o osso
o fóssil

futura
peça de museu

o osso
este osso
(a parte de mim
mais dura
e a que mais dura)
é a que menos sou eu?


(do livro: "Em alguma parte alguma". autor: Ferreira Gullar. editora: José Olympio.)

LAPA VERMELHA, LAGOA SANTA



os ossos
varridos
pelas águas
da enxurrada

quietos
no amparo da pedra
esperaram
onze mil e quinhentos anos

até saltarem
em cacos
à luz do dia

— e agora, Luzia,
ainda te lembras
da dor?

(do livro: "Em trânsito". autor: Alberto Martins. editora: Cia. das Letras.)


SEGUNDA ELEGIA

 (Fabrício Carpinejar)

Ser inteiro custa caro.
Endividei-me por não me dividir.
Atrás da aparência há uma reserva de indigência,
a volúpia dos restos.

Parto em expedição para provar que já morri.
E escavo boletins, cartas e álbuns
— o retrocesso da minha letra ao garrancho.

O passado tem sentido se permanecer desorganizado.
A verdade ordenada é uma mentira.

O musgo envaidece as relíquias. Os dedos retiram as teias,
assisto à revoada de insetos das ciladas.
Fujo da claridade, refulge a poeira.
O par de joelhos na imobilidade de um rochedo.

Reviso o testamento alisando a textura,
como um gramático da seda.
Desvendo o que presta pelo som do corte.

O que ansiava achar não acho
e esbarro em objetos despossuídos de lógica
que me encontram antes de qualquer pretensão.

O que fiz cabe numa caixa de sapatos.

Colecionava talhos de madeira, bonecos
adornados com a ponta miúda do canivete.
Lá estava um dos sobreviventes, desfocado,
vizinho das medalhas escolares
e dos parafusos condoídos de ferrugem.

Um autorretrato não seria tão fidedigno.
Eu era aquela frincha de chão florido, casca e húmus.

Quantas foram as miudezas que não combinavam
com o conjunto e, na falta de harmonia,
abandonei no depósito da infância?

E se faltou confiança para restaurá-las ao convívio,
faltou coragem para excluí-las em definitivo.

Somos o desperdício do que estocamos.
Não aprendemos a desaprender.
Não doamos nada, nem a palavra passamos adiante.

O porão tem vida própria e respira
o que jogamos fora.
O que refugamos na ceia volta a nos mastigar.

Tudo pode fermentar: o forro, os passos, o odor do braço.
Tudo pode nascer sem o mérito do grito,
no murmúrio ou estalar do abraço.

Tudo pode nascer, ainda que abafado.


Daqui ninguém sai vivo

Rimbaud, em carta a Paul Demeny:

um poeta torna-se um sonhador através de um longo, ilimitado e
sistemático desregramento de todos os sentidos. Todas as formas de
amor, de sofrimento, de loucura; investiga-se a si próprio, consome
dentro de si todos os venenos e preserva as suas quintessências. Um
tormento indescritível, onde irá encontrar a maior fé, uma força sobrehumana,
com que se torna, de entre todos os homens, o grande
inválido, o grande maldito – e o Supremo Cientista! Pois alcança o
desconhecido! E que interessa se for destruído no seu vôo extático por
coisas inauditas e inomináveis...*

* HOPKINS, Jerry. & SUGERMAN, Daniel. Daqui ninguém sai vivo. Lisboa: Assírio & Alvim, 1992, p.

29.

O caráter destrutivo


1931



É possível que alguém, ao fazer um retrospecto de sua vida, verifique que quase todas as ligações mais profundas que ele experimentou, tenham partido de indivíduos sobre cujo "caráter destrutivo" todo o mundo estava de acordo. Esbarraria um dia, talvez casualmente, nesse fato, e quanto mais duro fosse o choque, tanto maiores seriam suas chances de representar o caráter destrutivo.

O caráter destrutivo conhece apenas uma divisa: criar espaço; conhece apenas uma atividade: abrir caminho. Sua necessidade de ar puro e de espaço é mais forte do que qualquer ódio.

O caráter destrutivo é jovem e sereno. Pois destruir rejuvenesce, porque afasta as marcas de nossa própria idade; reanima, pois toda eliminação significa, para o destruidor, uma completa redução, a extração da raiz de sua própria condição. O que leva a esta imagem apolínea do destruidor é, antes de mais nada, o reconhecimento de que o mundo se simplifica terrivelmente quando se testa o quanto ele merece ser destruído. Este é o grande vínculo que envolve, na mesma atmosfera, tudo o que existe. É uma visão que proporciona ao caráter destrutivo um espetáculo da mais profunda harmonia.

O caráter destrutivo está sempre atuando bem disposto. A natureza lhe prescreve o ritmo, pelo menos indiretamente: pois ele deve adiantar-se a ela, do contrário ela própria assumirá a destruição.

O caráter destrutivo não se fixa numa imagem ideal. Tem poucas necessidades, e a menos importante delas seria: saber o que ocupará o lugar da coisa destruída. Primeiramente, pelo menos por um instante, o espaço vazio, o lugar onde se encontrava a coisa, onde vivia a vítima. Certamente vai aparecer alguém que precise dele, sem ocupá-lo.

O caráter destrutivo executa seu trabalho, evitando apenas trabalhos criativos. Assim como o criador busca a solidão, assim também o destruidor precisa cercar-se continuamente de pessoas, de testemunhas de sua eficácia.

O caráter destrutivo é um sinal. Assim como um sinal trigonométrico está exposto ao vento, de todos os lados, assim também ele está exposto, por todos os lados, aos boatos. Não tem sentido protegê-lo contra isso.

O caráter destrutivo não tem o mínimo interesse em ser compreendido. Considera superficiais quaisquer esforços nesse sentido. O fato de ser mal entendido não o afeta. Ao contrário, ele provoca mal entendidos, assim como o faziam os oráculos - essas instituições políticas destrutivas. O fenômeno mais pequeno-burguês, o falatório, só acontece porque as pessoas não querem ser mal entendidas. O caráter destrutivo não se importa de ser mal entendido; ele não fomenta o falatório.

O caráter destrutivo é o inimigo do homem-estojo. O homem-estojo busca sua comodidade, e a caixa é sua essência. O interior da caixa é a marca, forrada de veludo, que ele imprimiu no mundo. O caráter destrutivo elimina até mesmo os vestígios da destruição.

O caráter destrutivo se alinha na frente de combate dos tradicionalistas. Uns transmitem as coisas na medida em que as tomam intocáveis e as conservam; outros transmitem as situações na medida em que as tornam palpáveis e as liquidam. Estes são chamados destrutivos.

O caráter destrutivo tem a consciência do indivíduo histórico cuja principal paixão é uma irresistível desconfiança do andamento das coisas, e a disposição com a qual ele, a qualquer momento, toma conhecimento de que tudo pode sair errado. Por isso, o caráter destrutivo é a confiabilidade em pessoa.

O caráter destrutivo não vê nada de duradouro. Mas, por isso mesmo, vê caminhos por toda a parte. Mesmo onde os demais esbarram em muros ou montanhas, ele vê um caminho. Mas porque vê caminhos por toda a parte, também tem que abrir caminhos por toda a parte. Nem sempre com força brutal, às vezes, com força refinada. Como vê caminhos por toda a parte, ele próprio se encontra sempre numa encruzilhada. Nenhum momento pode saber o que trará o próximo. Transforma o existente em ruínas, não pelas ruínas em si, mas pelo caminho que passa através delas.

O caráter destrutivo não vive do sentimento de que a vida vale a pena ser vivida, e sim de que o suicídio não compensa.


Walter Benjamin

quinta-feira, 28 de dezembro de 2017


Vomitado

Vomitado de um profundo coma, um homem acorda. Anos se passaram, constata. E ao olhar o falso calendário, a medida em que o sentimento de desorientação pesava com maior intensidade, ele resolveu abandonar sua gaiola sofregamente. Aprontou a máscara e a fantasia, para poder se proteger do frio dolorosamente real que rondava lá fora. Um coração apressado regia seus passos intermitentes, ecoando na imensidão daquele cômodo. Porque escapar já não era mais uma indagação, e sim um imperativo. Feito isto, ele rodou a chave e abriu a pesada porta enferrujada.
            A neblina cerrava o horizonte, dissuadindo a todos para que permanecessem em suas tocas. Fora assim por muito tempo. Não se recordava ao certo quando essa imposição começara; ela transcendia sua vida. Visualizando em cacos o que deveria ser um lago congelado, ele não hesitou em abandonar o asfalto e pisar na terra, abaixo do gelo. Onde estão as estrelas. Logo lá. Os homens daqui já não as enxergam, e aqueles que dispõem do tesouro de observá-las já não dão a mínima. Os olhos não vêem, e o coração não sente. Vagando por um tempo indeterminado, os pés conspiravam em doer. Há quanto tempo não andava no mundo real? Andara antes. Não, retire isso. Você não andava – se deixava levar. Um galho na relva prenunciava o bosque à frente, convidativo, porém inexplorado.
            Escondido nos grotões da mata interior, ele compreendeu que toda sua vida tinha sido um erro. Desprovida de qualquer um propósito. Não havia fé, nem amor capazes de salvá-la. O mundo muito menos. Uma quietude extrema o apossou, como se todos seus átomos clamassem por aquela constatação. E de maneira inusitada, o reconhecimento de não se ter um propósito virou um propósito. Uma lúcida filosofia, dessas que se agarram a uma vida como um filho à mãe, recompensando serenidade.
            Depois de demasiado sofrimento, ele enfim se tornara homem. Um homem banal, aquele ao qual ele tanto relutara ser? E a paz ele alcançara, algo inexistente até então. Mas quem sabe sofrer fosse a fatalidade do pensar? Quem sabe viver como animal é a maior dádiva de Deus. Somente a Ele cabe a permanência, ao homem resta apenas conformar. Dar forma ao presente, como homem e apenas homem. Cabia a ele escolher entre o sofrimento da não-verdade ou a resignação da verdade. Eis a questão. E sim, era essa consciência que caracterizava o homem.
            Viver é experimentar o que não se gosta, satisfazer com o insensato. É dirigir sem pensar. Movimento, velocidade constante, incessante. Chama que se apaga. Efeméride efêmera. Angústia sem fim, ingratidão para quem vive.
            E-X-P-L-O-D-I-R - ele tinha convicção de que despedaçaria em incontáveis recortes do cotidiano, fadados à repetição aleatória.
            Desculpem, mas a verdade foi feita para ser dita. E a verdade os salvará.

Gustavo Delaqua


O velho homem e o jovem cão



O cão puxa para a frente e o homem para trás
É uma luta tenaz
O cão re-intenta
O homem agüenta
O cão repuxa
O homem quer matar o cão
Mas não pode
Há sempre uma testemunha de cão na proximidade
O cão ladra uma ordem
O homem não ouve
O cão re-ladra
O homem pragueja por entre os bigodes cozidos
O cão enrabicha os pés do ancião
E com ar de quem não quer a coisa
Olhando para um lado que não é lado algum
Mija-lhe nos sapatos abertos e sem meia
O homem re-pragueja e o cão re-ladra
O homem quer re-matar o cão
Mas há sempre uma testemunha de cão que espreita
O homem continua com o cão na ponta da corda
Sem ter tempo de tirar uma fumaça dum três-vintes moderno
O cão puxa pelo homem e o homem puxa pelo cão
Entre os dois só uma distância, uma corda que era pequena quando saíram de casa
Uma corda que se esticou, esticou; e tanto esticou e re-esticou
Que o homem não viu mais cão no fim da corda
O cão tinha virado á esquerda e o homem à direita
Um carro tinha cortado a agulha magnética
Ouvia-se ao longe um cão chorar com saudades do dono
Via-se de perto o velhote finalmente tirar uma fumaceira do cigarro diário; e rir-se dos estragos do seu estranho cão
Entretanto uma moto com alguém em cima matou o cão
Os bombeiros levaram o ex-cão para o cemitério dos cães.
Alguém seguiu a corda que estava no pescoço do cão; e encontraram o velho que se extasiava com a mínima nuvem de nicotina
Um policia levou o ancião para o asilo dos velhotes
Ele seguiu a autoridade mas pediu que deixa-se levar a corda na mão
O policia perguntou o porquê!
O velho retorquiu um, porque não!
Mesmo assim foi para o asilo-prisão
No dia seguinte foi encontrado pendurado na corda
E na ponta estava o cão silenciosamente olhando para o dono
Era um jovem cão que amou um velho dono
Que partiu para a eternidade com ele
Como se fosse um porta-chaves.

Antanho Esteve Calado


CARTA DE UM FETO DROGADO


ABORTA-ME
JA IMPLORA O FETO
QUE FUMA,
QUE JA BEBE,
QUE JA E DROGADO!

DA MÃE?
NÃO OUVI SUA VOZ
APENAS DELIRIOS
APENAS,
LOUCAS SENSAÇÕES

JA SABE OQUE É SOLIDÃO
JA LUTA,
CONTRA UMA CRONICA DEPRESSÃO
TENTA O SUIÇIDIO
JA QUE O ABORTO
NÃO LHE FOI ATENDIDO
TENTA SE AFOGAR NA BOLSA, É NADA!
TENTA ENTÃO,
SE INFORCAR,
NO PROPRIO CORDÃO UMBILICAL, SEM SUCESSO.

AGONIZANTE NOVE MESES!

E NASCE A CRIANÇA
QUE A MÃE NÃO CONHECE
JA SEM ESPERANÇA
TENTA ENTÃO! SOBREVIVER...

E JA CRESCE
JA NÃO QUER FUMAR
JA NÃO QUER BEBER
MUITO MENOS SE DROGAR
QUER APENAS VIVER
SEM A SOLIDÃO, DOS NOVE MESES.
SEM A DEPRESSÃO, QUE O ATORMENTAVA.
AGORA ELE QUER PAZ!

NO BERÇO,
ERGUE OS BRAÇINHOS PRA DEUS
E FAZ SUA PRIMEIRA ORAÇÃO

PAI,
OLHAI-ME

MANDAI TEUS QUERUBINS, SERAFINS
ANJOS E ARCANJOS
E QUE ELES POSSAM,
CUIDAR DE MIM.
OBRIGADO PAI, AMÉM. AH!

A NOSSA SENHORA

MÃE DAS MÃES
PROTEGEI-A,
ESSA QUE E MINHA MÃE
E QUE ELA TAMBÉM POSSA VE-LA.
NA LUZ,
QUE EU ENCONTREI, AMÉM.


Carlos  Alberto  da Silva

através da vidraça



chove... a vida
embaça a
vidraça: nem mesmo a
sensação de que
tudo passa
calha... ai, agora
é uma lágrima!

Adriano Nunes

Desalento



Caminha pela rua,
Calçada, de pedras frias
Como frios
São os seus sentimentos.
Vai em busca do impossível,
Encontra o vazio da esperança.
Nada!
Desalento
Numa vida triste
Sem sentido.
Até o sol
Lhe nega o brilho
Da sua luz,
Neste dia pálido,
Mas continua,
Inexorável.
É envolvido por flores
Da alegria.
Sorri,
Sorriso tímido,
Descrente.
As folhas das árvores
Roçam-lhe o rosto,
Querendo estimulá-lo
Para a vida
Caminha...
Cansado, pára
Pensa,
Reflecte
E volta a ter fé
Para continuar a lutar,
Pela felicidade.


José Carlos Moutinho In “Cais da Alma”

Se os Tubarões Fossem Homens




Bertold Brecht

Se os tubarões fossem homens, eles seriam mais gentis com os peixes pequenos. Se os tubarões fossem homens, eles fariam construir resistentes caixas do mar, para os peixes pequenos com todos os tipos de alimentos dentro, tanto vegetais, quanto animais. Eles cuidariam para que as caixas tivessem água sempre renovada e adotariam todas as providências sanitárias cabíveis se por exemplo um peixinho ferisse a barbatana, imediatamente ele faria uma atadura a fim de que não morressem antes do tempo. Para que os peixinhos não ficassem tristonhos, eles dariam cá e lá uma festa aquática, pois os peixes alegres tem gosto melhor que os tristonhos.

Naturalmente também haveria escolas nas grandes caixas, nessas aulas os peixinhos aprenderiam como nadar para a guelra dos tubarões. Eles aprenderiam, por exemplo a usar a geografia, a fim de encontrar os grandes tubarões, deitados preguiçosamente por aí. Aula principal seria naturalmente a formação moral dos peixinhos. Eles seriam ensinados de que o ato mais grandioso e mais belo é o sacrifício alegre de um peixinho, e que todos eles deveriam acreditar nos tubarões, sobretudo quando esses dizem que velam pelo belo futuro dos peixinhos. Se encucaria nos peixinhos que esse futuro só estaria garantido se aprendessem a obediência. Antes de tudo os peixinhos deveriam guardar-se antes de qualquer inclinação baixa, materialista, egoísta e marxista. E denunciaria imediatamente os tubarões se qualquer deles manifestasse essas inclinações.

Se os tubarões fossem homens, eles naturalmente fariam guerra entre si a fim de conquistar caixas de peixes e peixinhos .As guerras seriam conduzidas pelos seus próprios peixinhos. Eles ensinariam os peixinhos que, entre os peixinhos e outros tubarões existem gigantescas diferenças. Eles anunciariam que os peixinhos são reconhecidamente mudos e calam nas mais diferentes línguas, sendo assim impossível que entendam um ao outro. Cada peixinho que na guerra matasse alguns peixinhos inimigos da outra língua silenciosos, seria condecorado com uma pequena ordem das algas e receberia o título de herói.

Se os tubarões fossem homens, haveria entre eles naturalmente também uma arte, haveria belos quadros, nos quais os dentes dos tubarões seriam pintados em vistosas cores e suas guelras seriam representadas como inocentes parques de recreio, nas quais se poderia brincar magnificamente. Os teatros do fundo do mar mostrariam como os valorosos peixinhos nadam entusiasmados para as guelras dos tubarões. A música seria tão bela, tão bela, que os peixinhos sob seus acordes e a orquestra na frente, entrariam em massa para as guelras dos tubarões sonhadores e possuídos pelos mais agradáveis pensamentos. Também haveria uma religião ali.

Se os tubarões fossem homens, eles ensinariam essa religião. E só na barriga dos tubarões é que começaria verdadeiramente a vida. Ademais, se os tubarões fossem homens, também acabaria a igualdade que hoje existe entre os peixinhos, alguns deles obteriam cargos e seriam postos acima dos outros. Os que fossem um pouquinho maiores poderiam inclusive comer os menores, isso só seria agradável aos tubarões, pois eles mesmos obteriam assim mais constantemente maiores bocados para devorar. E os peixinhos maiores que deteriam os cargos valeriam pela ordem entre os peixinhos para que estes chegassem a ser, professores, oficiais, engenheiros da construção de caixas e assim por diante. Curto e grosso, só então haveria civilização no mar, se os tubarões fossem homens.


Na superfície dialética

Na superfície dialética
inacabadas somem na noite
ou pela porta
cada palavra com sintomas metafóricas
uma metralhadora
surge
abro o coração alvo
e pronto sou o alvo.

Na superfície sou uma arvore de idéias
levanto as mãos e digo tudo bem
sou eu melhor amigo
porém louco
todos em mim concordam
e dizem amém
ou assim seja,
pois que seja,
queres a sombra assim mesmo?

Na superfície ás vezes fico cego
e minha alma nada no rio que
a chuva por si fez ,
guerra em mim
na trégua sou meu melhor amigo
na guerra me desconheço
sou um animal no zoológico.

Na profundeza o leilão
é de um só lance,
segue no mergulho?
Ou
desculpas convincentes
encaixam melhor,
decisões sem fé
é estar sozinho.
Massa vigia a massa
até o pão estiver pronto para o forno.

Para que formulas novas
na dialética vence
a superfície intelectual.
Amoras roxas viram brancas
se cego for o sabor será
semelhante silvestre.

Entro no mar e vou para as profundezas
experimentar fatias de mentiras e verdades
até enjoar e descobrir que não sou eu
a realidade
leis do tempo e de fragrância
um incenso
abraçando
o contrario desperto
imerso.

Momento de dizer adeus ao pensamento
na profundeza sem esforço
abandono
num segundo
as horas
sem destino
distintas emoções
avesso dos excessos.
Volto à superfície sem fôlego.
E dizer o que?
ninguém foi comigo
não tenho provas
mas provei
por isso o sorriso.


Nelson Aharon

Coronelagem


aqui na zona leste
coronelado ficou velho
e nem por isso ficou ultrapassado
escreveu não leu, pau comeu por aqui é praticado
e como tudo que passa...volta maquiado

a rua esta cheia de bandidos
é véspera de eleição
ameaça vislumbrante
vote em mim , que eu vou ser bom

bom para quem?
Bom para poucos
só quem faz parte deste clã
engorda os bolsos

os coronel se uniu com a bandidagem
por aqui só tem coronelagem

Elcyr Carreira da Costa  

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Soneto

De Eugénio de Castro


Tua frieza aumenta o meu desejo:
Fecho os meus olhos para te esquecer,
Mas quanto mais procuro não te ver,
Quanto mais fecho os olhos mais te vejo.

Humildemente, atrás de ti rastejo,
Humildemente , sem twe convencer,
Enquanto sinto para mim crescer
Dos teus desdéns o frígido cortejo.

Sei que jamais hei de possuir-te, sei
Que outro, ditoso como um rei,
Enlaçará teu corpo em flor.

Meu coração no entanto não de cansa:
Amam metade os que amamcom esp´rança,
Amar sem esp´rança é o verdadeiro amor.


                

síndrome de Ford


Tentei aprender tudo que me ensinaram
mas do pouco que foi dito
foi difícil demais de engolir

quero ir bem além dos horizontes fechados
das mentiras e propagandas enlatadas
dos modismos massificados

fast food, Ford e Hollywood
não tem nada a ver
seus brinquedos não me iludem
sua venda não me cega não!!!

Nenhum punhado de moedas
irá comprar minha mente
nem as promessas vazias
dos santos fabricados
conseguirão comprar minha alma
ninguém me envenena não!!!

corromperam o i ching
do preto e do branco
formaram matizes de um mundo
mudo e acinzentado
mas eu sei bem de que lado estou

vivo em um mundo paranóico
cercado de exércitos, bombas e fome
misérias, fortunas e favelas

lado a lado a razão e a loucura
como o óleo e a água
agitadas na mesma garrafa

paredes invisíveis separam as massas
em tribos e castas, cores e raças
dentro deste mundo cheio de mundos

eu sou o neurótico, passional e inconstante
Lunático, utópico , insano e sonhador

pode ser que eu seja
mas minha alma não esta a venda
enxergo através da venda
e da cortina de fumaça
das linhas de produção de mentalidade.

Elcyr Carreira da Costa  

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contos, crônicas, poesias e artes plásticas
prestigie essa literatura, leia um artista que
faz arte por amor a arte e ao poder da arte

beijo do vagabundo


BELLA CONTRARIADA



Noche de dolor
Noches de lágrimas
Amarguras templadas
Falsas sonrisas tendidas
Llantos llenando cantaros
Requiebres desdibujando
Rostros desencajados
La bella anegada en lo insólito
Calles distracciones fingidas
Oscuridad trágame ¡ya ya ya!
Zapatos por la borda huyéndose
Un cuerpo y las sabanas húmedas
¡No de amor sólo de llantos!
Inverosímil tan joven y guapa
Graciosa pero huérfana de amor
Solitaria en el concierto de tangos
Yendo su cuerpo por el boulevard
Su mente en el espacio nebuloso
Dejando ir su figura al vaivén de la noche
Frunciendo su piel en su cara opacada
Ni en la tristeza ella pierde el brillo
Ese el de su rostro que sobrevive
Pero la duda carcome su firmeza
¡No encuentra explicación a la desdicha!
Yo desde este sitio le persigo asombrado
¿Por qué un ser tan bello solitario?
¡No atisbo más sólo absorto quedo!
Y ella transitoria - me digo sigue-
¡Quizás no por mucho tiempo!
Es un sueño tan sólo un sueño
Ella virara hacia su horizonte
¡Un chispazo de pronto y ahí el amor!
Le atrapara sin el menor chance…

Guevarachamorrojoseabraham@


A MOÇA DO CEMITÉRIO



Em Porto Alegre, num ponto de taxi que fica na rua Otto Niemayer, esquina Cavalhada, às vezes aparece uma moça loira, lindíssima, usando sempre um vestido vermelho, muito bonito e chamativo. E sempre à noite. Ela toma um taxi e manda tocar para um lugar qualquer que passe pelo cemitério da Vila Nova mas, ao passar por este, ela simplesmente desaparece! Vários motoristas porto-alegrenses, muitos dos quais vivos até hoje, transportaram a moça-fantasma e repetem a mesma história.



Jones De Oliveira Borges            Fonte: Lendas gaúchas

O Lago Morto


Emily Brontë
(Tradução de Lúcio Cardoso)

O lago morto, o céu cinzento ao luar;
Pálida, lutando, coberta pelas nuvens,
A lua;
O murmúrio obstinado que cochicha e passa
(Dir-se-ia que tem medo de falar em alta voz).

Tão tristes agora,
Recaem sobre meu coração,
Onde a alegria morre como um rio deserto.

Minhas pobres alegrias...
Não as toqueis,
Floridas e sorridentes.


Lentamente, a raiz acaba de morrer.

Pastoral



Quando, por demasia,
a saudade de Jonathan me perturba
eu vou pra roça.
Nas ruas de café,
entre canas de milho e folhas de bugre lustrosas,
sua presença anímica me acalma.
O cheiro dele é resinas, sua doçura,
escondida em cupins, cascas de pau,
mel que nunca provei.
Meu coração implora à ordem amorosa do mundo:
vem, Jonathan. E aparece um besouro
com o mesmo jeito dele caminhar.
Descubro que passarinhos
só fazem o que lhes dá gosto
e me incitam do bambual:
Você também, pequena mulher,
deve cumprir seu destino.
Há um sacramento chamado
da Presença Santíssima, um coração
dizendo o mesmo que o meu:
vem, vem, vem.
Conheci a cólera de Deus,
agora, seu vigilante ciúme.
Até a raiz das touceiras,
até onde vejo e não vejo,
rastro imperceptível de formigas,
Ele, Jonathan, e eu,
faca, doçura e gozo,
dor que não deserta de mim.




 Adélia Prado 

quarta-feira, 27 de dezembro de 2017

1945: Fundação do FMI e do Banco Mundial


Em 27 de dezembro de 1945, foi assinada em Bretton Woods a ata de criação do Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacional, instituições com papéis e perfis de financiamento distintos.

  
As tropas aliadas mal haviam desembarcado na Normandia quando, a 30 de junho de 1944, dois trens especiais dirigiram-se para Bretton Woods, no estado norte-americano de New Hampshire. Vindos, um de Washington, outro de Atlantic City, eles traziam a bordo 730 renomados politólogos, economistas, líderes políticos e altos funcionários governamentais de 45 países. Entre eles, também o famoso economista britânico John Maynard Keynes.

O presidente norte-americano Franklin Roosevelt reservou o grande Mount Washington Hotel e entregou aos participantes do encontro a tarefa de elaborar uma nova ordem econômica mundial para o período do pós-guerra.

Keynes não conseguiu impor sua proposta de que se criasse uma união monetária dos países industrializados da época. Em vez disso, o resultado foi a fundação do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial, como sugerido pelo subsecretário de Finanças dos Estados Unidos, Harry Dexter White.

Em 27 de dezembro de 1945, foram assinadas as atas de criação dos dois organismos. Juntamente com suas instituições afiliadas, o Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento (Bird), pertencente ao Banco Mundial, tornou-se o principal órgão de financiamento dos chamados países em desenvolvimento.

Já o FMI ficou responsável pela estabilidade do câmbio e manutenção dos acordos monetários. Mais tarde viria a receber também a incumbência de combater a pobreza no Terceiro Mundo, o que marcaria uma mudança em sua política e também na relação entre ele e o Banco Mundial.

Ajuda desenvolvimentista é tarefa central

Na verdade, o combate à pobreza no Terceiro Mundo, ou seja, a ajuda ao desenvolvimento, é a tarefa central do Banco Mundial, através da Associação Internacional de Desenvolvimento (AID). Os países mais pobres recebem dela até empréstimos de longo prazo sem juros. Nesses casos, o Banco Mundial não só financia como também avalia a orientação desenvolvimentista das medidas planejadas.

Com seu fundo fiduciário, o Bird também é a instituição-chave, em se tratando do perdão das dívidas para os países mais pobres. Enquanto o Banco Mundial capta a maior parte de seus recursos no mercado financeiro internacional, o FMI se mantém com as contribuições de seus países-membros, calculadas com base nos respectivos poder econômico e intensidade de relações de comércio exterior.

A cooperação no âmbito do FMI objetiva criar condições para um crescimento equilibrado do comércio e da economia mundiais. Focaliza especialmente a superação e, se necessário, financiamento de déficits na balança comercial, a garantia de relações cambiais ordenadas e a harmonização da política econômica entre os países-membros.

Em situações de crise, o FMI tem a função de um corpo de bombeiros. Foi esse o caso na crise da dívida externa da América Latina, no início da década de 1980, na crise asiática do final dos anos 1990, ou em resposta à crise econômica global em 2008.

Autoria Karl Zawadzky (gh)


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quarta-feira, 20 de dezembro de 2017

Há umas duas semanas envolvi-me em uma pequena polêmica com um fervoroso católico.



Ele dizia que a inquisição ocorreu SEM o conhecimento do Vaticano - ou, pelo menos, sem a aquiescência papal. Desafiou-me a mostrar minhas fontes e ainda perguntou a qual inquisição eu referia-me, à católica ou à protestante.

Foi um desafio interessante. Eu não conhecia a expressão "inquisição protestante", de modo que foi um verdadeiro aprendizado. Da mesma forma, fui atrás de fontes sobre a inquisição católica - outro verdadeiro aprendizado.

Após estudar esses temas, fiquei chocado: é espantoso, é escandaloso que alguém possa dizer, com seriedade, que o Vaticano não conhecia e/ou não autorizava o funcionamento da Inquisição, fosse em sua versão original, do século XII, fosse em sua versão absolutamente fanática, do século XV.

Desde o início o papado apoiou e incentivou a inquisição. É claro que diferentes papas conferiram diferentes ênfases ao tribunal, em alguns casos restringindo sua ação - mas em outros casos estimulando-a.

O sinal mais simples de que o papado apoiava a inquisição é o fato de que o mais ativo iniciador do tribunal criou uma ordem religiosa e depois foi santificado: Domingos de Gusmão, depois São Domingos, fundador dos frades pregadores, ou dominicanos. Aliás, os mais furiosos e fanáticos diretores da inquisição espanhola eram dominicanos (como Torquemada e seu sucessor).

Dito isso, não sei o que precisamente há por trás da afirmação inicial de que o papado não apoiava a inquisição. Seria um desejo de "inocentar" a igreja católica? De diminuir suas responsabilidades? De transferir a atenção de seus crimes e seus fanatismos, do catolicismo para os protestantes (que, de fato, não ficaram atrás dos católicos, embora sejam bem menos conhecidos)?

Em todo caso, não me parece haver aí desconhecimento ou ignorância; o que parece haver é desinformação, isto é, o desejo consciente de propagar informações erradas. Isso é muito sério e preocupante.

(Uma estratégia semelhante pode ser vista da parte justamente de um dos mais ativos denunciadores atuais da desinformação esquerdista - Olavo de Carvalho. Aliás, desinformação com prepotência.)

Gustavo Biscaia de Lacerda



Quando os cientistas políticos dizem que criamos no Brasil uma plutocracia política nas últimas décadas

Quando os cientistas políticos dizem que criamos no Brasil uma plutocracia política nas últimas décadas, isso fica mais claro nos gráficos ao lado. Trata-se da média e do intervalo de 95% de IC (o que exclui os outliers que distorcem a média) do patrimônio declarado por todos os candidatos que disputaram as últimas três eleições nacionais (2006, 2010 e 2014). As médias estão separadas entre candidatos derrotados e eleitos.
Perceba que em 2006 o patrimônio médio dos derrotados fica abaixo de R$ 1 milhão e dos eleitos acima de R$ 1,5 milhão. O intervalo entre os dois grupos se cruza, ou seja, os derrotados mais ricos tinham o mesmo patrimônio que os eleitos mais pobres.
Isso deixa de acontecer em 2010, quando o patrimônio médio dos derrotados mantém-se abaixo de R$ 1 milhão. Mas a média dos eleitos se aproxima de R$ 2 milhões e os intervalos já não mais se tocam. E em 2014 há o grande salto. Os derrotados continuam abaixo de R$ 1 milhão de média de patrimônio e os eleitos quase chegam a R$ 3 milhões, com uma variação maior. Apesar disso, os intervalos se distanciam ainda mais.
Se considerarmos a inflação do período (os valores são os declarados em cada ano eleitoral), é provável que o valor médio do patrimônio dos derrotados tenha caído.
Também é preciso considerar que a melhor qualidade nos controles da justiça eleitoral possa ter "estimulado" os candidatos a fazerem declarações de bens mais "precisas". No entanto, isso parece não valer para os derrotados.
É minha gente, criamos uma geração de políticos ricos com mais mandatos. E Políticos com mandato cada vez mais ricos.
Isso explica muita coisa, viu.


Emerson Urizzi Cervi

segunda-feira, 18 de dezembro de 2017

Al nacimiento de Cristo


Repastaban sus ganados
a las espaldas de un monte
de la torre de Belén
los soñolientos pastores,

alrededor de los troncos
de unos encendidos robles,
que, restallando a los aires,
daban claridad al bosque.

En los nudosos rediles
las ovejuelas se encojen,
la escarcha en la hierba helada
beben pensando que comen.

No lejos los lobos fieros,
con los aullidos feroces,
desafían los mastines,
que adonde suenan, responden.

Cuando las escuras nubes,
de sol coronado, rompe
un Capitán celestial
de sus ejércitos nobles,

atónitos se derriban
de sí mismos los pastores,
y por la lumbre las manos
sobre los ojos se ponen.

Los perros alzan las frentes,
y las ovejuelas corren
unas por otras turbadas
con balidos desconformes.

Cuando el nuncio soberano
las plumas de oro descoje,
y enamorando los aires,
les dice tales razones:

«Gloria a Dios en las alturas,
paz en la tierra a los hombres,
Dios ha nacido en Belén
en esta dichosa noche.

»Nació de una pura Virgen;
buscalde, pues sabéis donde,
que en sus brazos le hallaréis
envuelto en mantillas pobres».

Dijo, y las celestes aves
en un aplauso conformes
acompañando su vuelo
dieron al aire colores.

Los pastores, convocando
con dulces y alegres voces
toda la sierra, derriban
palmas y laureles nobles.

Ramos en las manos llevan,
y coronados de flores,
por la nieve forman sendas
cantando alegres canciones.

Llegan al portal dichoso
y aunque juntos le coronen
racimos de serafines,
quieren que laurel le adorne.

La pura y hermosa Virgen
hallan diciéndole amores
al niño recién nacido,
que Hombre y Dios tiene por nombre.

El santo viejo los lleva
adonde los pies le adoren,
que por las cortas mantillas
los mostraba el Niño entonces.

Todos lloran de placer,
pero ¿qué mucho que lloren
lágrimas de gloria y pena,
si llora el Sol por dos soles?

El santo Niño los mira,
y para que se enamoren,
se ríe en medio del llanto,
y ellos le ofrecen sus dones.

Alma, ofrecelde los vuestros,
y porque el Niño los tome,
sabed que se envuelve bien
en telas de corazones.

 LOPE DE VEGA


Biblioteca Digital Ciudad Seva

Liberdade


(Tradução de Carlos Drumonnd de Andrade e Manuel Bandeira)
Nos meus cadernos de escola
Nesta carteira nas árvores
Nas areias e na neve
Escrevo teu nome
Em toda página lida
Em toda página branca
Pedra sangue papel cinza
Escrevo teu nome
Nas imagens redouradas
Na armadura dos guerreiros
E na coroa dos reis
Escrevo teu nome
Nas jungles e no deserto
Nos ninhos e nas giestas
No céu da minha infância
Escrevo teu nome
Nas maravilhas das noites
No pão branco da alvorada
Nas estações enlaçadas
Escrevo teu nome
Nos meus farrapos de azul
No tanque sol que mofou
No lago lua vivendo
Escrevo teu nome
Nas campinas do horizonte
Nas asas dos passarinhos
E no moinho das sombras
Escrevo teu nome
Em cada sopro de aurora
Na água do mar nos navios
Na serrania demente
Escrevo teu nome
Até na espuma das nuvens
No suor das tempestades
Na chuva insípida e espessa
Escrevo teu nome
Nas formas resplandecentes
Nos sinos das sete cores
E na física verdade
Escrevo teu nome
Nas veredas acordadas
E nos caminhos abertos
Nas praças que regurgitam
Escrevo teu nome
Na lâmpada que se acende
Na lâmpada que se apaga
Em minhas casas reunidas
Escrevo teu nome
No fruto partido em dois
de meu espelho e meu quarto
Na cama concha vazia
Escrevo teu nome
Em meu cão guloso e meigo
Em suas orelhas fitas
Em sua pata canhestra
Escrevo teu nome
No trampolim desta porta
Nos objetos familiares
Na língua do fogo puro
Escrevo teu nome
Em toda carne possuída
Na fronte de meus amigos
Em cada mão que se estende
Escrevo teu nome
Na vidraça das surpresas
Nos lábios que estão atentos
Bem acima do silêncio
Escrevo teu nome
Em meus refúgios destruídos
Em meus faróis desabados
Nas paredes do meu tédio
Escrevo teu nome
Na ausência sem mais desejos
Na solidão despojada
E nas escadas da morte
Escrevo teu nome
Na saúde recobrada
No perigo dissipado
Na esperança sem memórias
Escrevo teu nome
E ao poder de uma palavra
Recomeço minha vida
Nasci pra te conhecer
E te chamar
Liberdade

Paul Eluard 

segunda-feira, 11 de dezembro de 2017

Instituições não contam. (WGS).Percebe-se claramente dando uma zapeada pelo Facebook como o Brasil é um país com pouca tradição na defesa dos direitos fundamentais dos cidadãos, especialmente suas classes médias supostamente civilizadas. Uma evidência disso: quando os direitos fundamentais de seu adversário político são violados (seja Temer, Lula, Cabral, Aécio etc.) você apóia; quando ocorre o contrário, há a denúncia do arbítrio. Esta a meu ver é uma das principais causas de termos chegado ao Estado em que chegamos, como diria o Barão de Itararé

. O pessoal fica perdendo tempo medindo distância de capital, contando MP, lendo Regimento Interno, comentando pesquisa, contando deputado reaça, etc., quando só há uma descoberta realmente importante na ciência política moderna: os países e regiões mais democráticos, mais tolerantes, com maior IDH, qualidade de vida, mais estáveis, melhor desempenho educacional, menor índice de corrupção etc. etc., são aqueles que apresentam grandes bancadas de partidos de centro-esquerda em vários níveis de representação parlamentar (especialmente partidos social-democratas, trabalhistas e socialistas). Deve haver alguma razão para isso né, gênti, já que correlação não é causalidade...

Sérgio Braga