terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Agnus Sei



(Aldir Blanc / João Bosco)
 
Faces sob o sol, os olhos na cruz
Os heróis do bem prosseguem na brisa da manhã
Vão levar ao reino dos minaretes
A paz na ponta dos arietes
A conversão para os infiéis
Para trás ficou a marca da cruz
Na fumaça negra vinda na brisa da manhã
Ah, como é difícil tornar-se herói
Só quem tentou sabe como dói
Vencer satã só com orações
Ei andá pa catarandá que deus tudo vê
Ei andá pa catarandá que deus tudo vê
Ei anda, ê hora, ê manda, ê mata
Responderei não
Dominus dominium juros além
Todos esses anos agnus sei que sou também
Mas ovelha negra me desgarrei
O meu pastor não sabe que eu sei
Da arma oculta na sua mão
Meu profano amor eu prefiro assim
A nudez sem véus diante da santa-inquisição
Ah, o tribunal não recordará
Dos fugitivos de shangri-lá
O tempo vence toda a ilusão
 
 

Che abbiamo vissuto,
che abbiamo toccato le strade coi piedi,
che andavamo allegri,
non lo saprà nessuno.
Che abbiamo guardato il mare
dai finestrini dei treni,
che abbiamo respirato
l’aria che si posa
sulle sedie dei bar,
non lo saprà nessuno.
Siamo stati
sulla terrazza della vita
fintanto che sono arrivati gli altri*
 
[Nino Pedretti]

All the birds that followed my palm
To the door of the distant airport
All the wheatfields
All the prisons
All the white tombstones
All the barbed Boundaries
All the waving handkerchiefs
All the eyes
were with me,
But they dropped them from my passport
_________________
by Mahmoud Darwish

Com licença poética




Quando nasci um anjo esbelto,
desses que tocam trombeta, anunciou:
vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado pra mulher,
esta espécie ainda envergonhada.
Aceito os subterfúgios que me cabem,
sem precisar mentir.
Não sou tão feia que não possa casar,
acho o Rio de Janeiro uma beleza e
ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
Mas o que sinto escrevo. Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
-- dor não é amargura.
Minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável. Eu sou.

Adélia Prado

Pesadelo Refrigerado


"SEMPRE TIVEMOS DUAS BANDEIRAS AMERICANAS: A DOS RICOS E A DOS POBRES --Quando os ricos a hasteiam, isso quer dizer que tudo vai indo muito bem, de acordo com os seus interesses; quando os pobres a hasteiam, é sinal de perigo, de revolução, de anarquia. Em menos de 200 anos, na terra da liberdade, no lar dos homens livres, no refúgio dos oprimidos, alteraram de tal forma o significado da bandeira nacional que, hoje em dia, quando um homem ou uma mulher consegue fugir das tragédias da Europa, alcançar a terra da promissão e, finalmente, ver-se diante de um tribunal sob nosso glorioso emblema, a primeira pergunta que lhe fazem é: QUANTO DINHEIRO O SENHOR TEM? Se, por acaso, o desgraçado não tiver dinheiro, mas apenas amor pela liberdade, apenas uma prece suplicando piedade, é expulso do tribunal, devolvido ao matadouro e considerado como um leproso."

 (trecho de Pesadelo Refrigerado, Henry Miller, publicado em 1945, nos EUA.)

PALAVRAS DE HENRY MILLER:

“...Como os poetas se assemelham a esquadrinhadores do céu! Não parecem estar, como eles, em comunicação com outros mundos? Não nos falam de coisas do porvir e de coisas já muito passadas, sepultas na memória racial do homem? Que melhor significado lhes podemos dar para a sua fugidia passagem pela Terra que o de emissários de outro mundo? Vivemos no meio de fatos mortos, enquanto eles vivem por signos e símbolos.”...

[do livro "A hora dos assassinos (Um estudo sobre Rimbaud), L&PM Editores, 2010, tradução de Milton Persson]