Dentro da lógica do nosso sistema econômico, cada indivíduo
representa uma determinada "força de trabalho". Essa força de
trabalho deve atender às necessidades do mercado. Como esse mercado é
heterogêneo, necessita de diferentes tipos de forças de trabalho.
Essa pluralidade, no fim, acaba desaguando em uma
singularidade: a troca de qualquer força de trabalho por dinheiro. Dessa forma,
toda e qualquer força de trabalho, dentro desse sistema econômico é, a rigor,
uma mercadoria.
Assim, a princípio, esse sistema não vê qualquer diferença
sobre quem são os indivíduos concretos (reais) que detém as diversas forças de
trabalho. Se essa força de trabalho é de uma mulher, de um homem, de uma
criança, de um holandês, de um cristãos, de um islâmico, de um cidadão, de um
imigrante... nada disso importa...
O que importa para o sistema produtor de mercadorias é que
esse indivíduo seja capaz de entregar essa determinada força de trabalho para
os produtores de mercadorias.
Mas... Como acabou de ser colocado, apenas "a
princípio" esse sistema não vê qualquer diferença. A realidade é que esse
sistema não é cego e possui total interesse em desvalorizar a força de trabalho
em geral.
Como a força de trabalho se comporta de forma análoga a uma
mercadoria, a ideia é sempre tê-la em abundância, de modo que o seu preço caia
pela clássica "lei da oferta e procura". Assim, enquanto esse sistema
econômico existir, é importante que haja força de trabalho ociosa, o que
chamamos comumente de desemprego.
Além disso, o sistema está atento às chamadas
"depreciações históricas" da força de trabalho. Uma mulher pode
produzir tanto quanto um homem, mas ainda assim sua força de trabalho é, em
geral, mais barata devido aos preconceitos historicamente determinados.
O mesmo ocorre com os negros, os imigrantes, as minorias,
etc. Assim, a esse sistema econômico, a continuidade do machismo e dos
preconceitos em geral (antigos e novos) são de seu absoluto interesse, pois
atendem ao processo geral de depreciação do valor da força de trabalho.
Chegamos aqui a dois fenômenos que sempre existirão enquanto
existir esse sistema econômico produtor de mercadorias: desemprego e
preconceito.
Parte dos indivíduos acreditam que ambos os fenômenos são
"naturais" e "insuperáveis". São os indivíduos
"sistematizados". Entretanto, há indivíduos que discordam e lutam
para que esses dois fenômenos sejam superados em nossa sociedade. Essas lutas
são "autorizadas" pelo sistema, desde que se travem dentro da lógica
do próprio sistema. Vejamos.
Se em um determinado país os salários dos homens são
superiores ao das mulheres (por um mesmo trabalho) é absolutamente interessante
ao sistema uma luta pela igualdade salarial, desde que essa luta resulte em
salários menores aos homens, isto é, uma igualdade nivelada por baixo.
Ao longo dessa luta também interessa ao sistema o foco
exclusivo na desigualdade entre homens e mulheres (isto é, na desigualdade de
gênero) ignorando-se completamente a igualdade de ambos como explorados (ainda
que em níveis diferentes).
A luta pela igualdade de direitos civis também é permitida,
desde que não atinja as bases da lógica de depreciação da força de trabalho.
Nos países onde a igualdade social transcendeu os interesses do sistema, é
importante se criar uma política militante e universal para destruir essa
igualdade, ressuscitando antigas divisões e criando novos sentimentos de ódio e
repugnância ao outro.
Não por acaso, todos os países onde a igualdade e os
direitos civis são mais avançados, se encontram hoje sob a ameaça de ataques
terroristas que possuem como efeito a desagregação do tecido social que antes
beneficiava a todos.
Dessa forma, podemos observar que divisões culturalistas,
divisões de gênero e a produção de uma sociedade aterrorizada pelo medo
daqueles que são "diferentes", em especial os imigrantes, atende aos
interesse do sistema produtor de mercadorias.
Um sistema que produz desemprego, preconceitos, divisões,
medo e ódio entre todos os que vivem dentro dele poderia ter vários nomes:
"sistema desumanizador", "sistema do ódio", "sistema
da destruição"... enfim... fica a cargo de quem quiser, nomear esse
sistema da maneira que lhe convir...
Seu nome de batismo é, entretanto, "sistema capitalista
de produção". Não é possível afirmar que a luta contra esse sistema
ocorrerá de forma efetiva e assertiva. A única coisa possível de se afirmar é
que o seu combate e superação é uma necessidade histórica.
Carlos D’Incao
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