sexta-feira, 18 de outubro de 2019

CANÇÃO DA MAIS ALTA TORRE




Inútil beleza
A tudo rendida,
Por delicadeza
Perdi minha vida.
Ah! que venha o instante
Que as almas encante.

Eu me digo: cessa,
Que ninguém te veja:
E sem a promessa
Do que quer que seja.
Não te impeça nada,
Excelsa morada.

De tanta paciência
Para sempre esqueço:
Temor e dolência
Aos céus ofereço,
E a sede sem peias
Me escurece as veias.

Assim esquecidas
Vão-se as Primaveras
Plenas e floridas
De incenso e de heras
Sob as notas foscas
De cem feias moscas.

Ah! Mil viuvezas
Da alma que chora
E só tem tristezas
De Nossa Senhora!
Alguém oraria
À Virgem Maria?

Inútil beleza
A tudo rendida,
Por delicadeza
Perdi minha vida.
Ah! que venha o instante
Que as almas encante!

 - Rimbaud

Maio, 1872

Tradução: Augusto de Campos

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