Tradução de José
Jeronymo Rivera
Quem os vê andar pela
cidade
se todos estão cegos?
Eles se tomam as mãos:
algo fala
entre seus dedos,
línguas doces
lambem a húmida palma,
correm pelas falanges,
e acima a noite está
cheia de olhos.
São os amantes, sua
ilha flutua à deriva
rumo a mortes na
relva, rumo a portos
que se abrem nos
lençóis.
Tudo se desordena por
entre eles,
tudo encontra seu
signo escamoteado;
porém eles nem mesmo
sabem
que enquanto rodam em
sua amarga arena
há uma pausa na
criação do nada
o tigre é um jardim
que brinca.
Amanhece nos camiões
de lixo,
começam a sair os
cegos,
o ministério abre suas
portas.
Os amantes cansados se
fitam e se tocam
uma vez mais antes de
haurir o dia.
Já estão vestidos, já
se vão pela rua.
E só então,
quando estão mortos,
quando estão vestidos,
é que a cidade os
recupera hipócrita
e lhes impõe os seus
deveres quotidianos.
Julio Cortázar
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