Tradição experimental da poesia perde um de seus maiores porta-vozes, o decompositor de palavras Oskar Pastior.
Oskar Pastior
Duas semanas antes de receber oficialmente o prêmio literário Georg-Büchner, um dos mais renomados da Alemanha, o poeta romeno-alemão Oskar Pastior morreu aos 78 anos. Com Pastior, a literatura alemã perde um dos mais radicais representantes da poesia experimental.
O romeno de língua alemã nascido na Transilvânia e residente em Berlim desde 1969 marcou a poesia alemã com sua escrita lúdica de vanguarda, consagrando-se como um dos mais apreciados recitadores contemporâneos. Pertencente a uma geração que cresceu durante a Segunda Guerra, Pastior foi deportado em 1945 para um campo de trabalho forçado soviético na Ucrânia, onde passou cinco anos.
Retornando à Romênia, completou seus estudos secundários e cursou Letras Germânicas, tornando-se radialista. Em 1968, Pastior aproveitou uma estadia como bolsista em Viena para fugir para o Ocidente. Após ter passado por Munique, ele se instalou em Berlim Ocidental, onde viveria até sua morte, no dia 4 passado.
Desde seus dois primeiros livros, escritos na Romênia ainda sob pressão de fidelidade ao realismo socialista, Oskar Pastior já demonstrava sua preferência pela poesia das vanguardas modernistas. Enquanto sua obra inicial foi marcada pela linguagem mais simbólica da poesia expressionista e surrealista, os livros escritos depois de sua migração para a Alemanha demonstram cada vez mais um gosto pelo absurdo, o nonsense, a tautologia, inserindo-se na tradição dadaísta com sua denúncia à ausência de lógica na linguagem.
Membro do grupo literário francês OULIPO (Ouvroir de Littérature Potentielle), ao qual também pertenceram escritores como Georges Perec e Italo Calvino, Pastior enveredou de forma cada vez mais decidida pela poesia fonética, com a qual passou a ser diretamente identificado.
Apesar de a língua alemã, com suas possibilidades combinatórias, ter sido seu maior material de experimento, o poliglota Pastior explorou com ímpeto investigativo um amplo universo interlingual. Em suas próprias palavras, sua Babel particular se constituía do "dialeto transilvânio e saxão dos avós, o alemão levemente arcaico dos pais, o romeno das ruas e das repartições públicas, um pouquinho de húngaro, um russo primitivo adquirido no campo de trabalho, um resto de latim de escola, grego de bula de remédio, alemão antigo da universidade, francês e inglês de leituras". Pastior também fez traduções inovadoras de Petrarca, Velimir Khlebnikov e Gertrude Stein.
Cracking molecular
"Cracking molecular" era a expressão que Pastior usava para descrever seus procedimentos de desintegração da linguagem. Sua grande predileção por listas de palavras de sonoridade análoga, por palíndromos, anagramas e outros jogos autopoéticos de linguagem perpassa quase toda sua produção poética.
Diferentemente da vertente mais radical da poesia fonética, que reduz a linguagem à pura sonoridade, Pastior compunha textos híbridos, nos quais uma ponta de sentido se fazia escutar em meio ao expressivo ruído da fala. O mérito de Pastior foi ter mantido com insistência uma tradição da poesia experimental alemã bastante esquecida, fazendo a ponte entre as inovações das vanguardas do início do século 20 e o revival da poesia oral nos poetry slams desde década de 90.
Data 11.10.2006
Autor Simone de Mello
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