No dia 21 de outubro de 1985, o escritor e jornalista alemão
Günter Wallraff lançou o livro "Cabeça de Turco", em que descreveu as
dificuldades enfrentadas pela mão de obra estrangeira na Alemanha.
Künstler rufen zur Verteidigung des
Urheberrechts auf – Aktion: Wir sind die Urheber (dapd)
"Estrangeiro forte procura emprego. Pode ser trabalho
pesado, sujo e mal pago." Com este anúncio, publicado em vários jornais
alemães em março de 1983, o jornalista Günter Wallraff começou uma investigação
que iria abalar a Alemanha.
Foi o início da longa reportagem publicada no livro Cabeça
de Turco, em 1985. Disfarçado de turco, Wallraff sentiu na pele e denunciou de
forma contundente a discriminação contra os imigrantes no cotidiano alemão.
O autor descreveu detalhadamente o que vivenciou, sob o
pseudônimo Ali, em uma empresa mediadora de mão de obra, na metalúrgica Thyssen
e num restaurante McDonald's.
Ele desceu ao submundo da sociedade alemã para denunciar as
brutais jornadas de trabalho de 16 a 24 horas por dia impostas aos estrangeiros
na época, o tratamento desumano dispensado a trabalhadores braçais e pouco
qualificados e a falta de segurança nos locais de trabalho, principalmente para
operários turcos.
Ignorado pela mãe
Seu disfarce foi tão perfeito que Wallraff sequer foi
reconhecido pela mãe. O resultado foi um "livro-bomba", que já nas
seis primeiras semanas após o lançamento vendeu mais de um milhão de
exemplares. A Promotoria Pública alemã abriu inquérito contra o grupo Thyssen,
desencadeando uma verdadeira avalanche de processos contra empresas que
discriminavam ou maltravam imigrantes.
Na época do lançamento, Cabeça de Turco foi considerado
"o melhor livro alemão do pós-guerra". O livro não só foi um sucesso
inédito de vendas como teve consequências em vários países europeus. Por
sugestão de Wallraff, jornalistas franceses escreveram uma obra semelhante,
denunciando o racismo contra os trabalhadores árabes na França. A mesma linha
investigativa norteou uma publicação sobre a situação da mão de obra estrangeira
na Holanda.
Denúncias de efeito regional
Na Dinamarca, o Parlamento criou uma comissão para
investigar a situação dos estrangeiros no país, o que provocou uma série de
transformações. Era o que o autor esperava que acontecesse também na Alemanha.
"Mas, aqui, as denúncias tiveram apenas efeito regional. Por empenho
pessoal, o secretário de Trabalho e Assistência Social da Renânia do
Norte-Vestfália, por exemplo, descobriu dezenas, centenas de casos graves de
discriminação. Talvez fosse necessário publicar uma obra destas por ano",
comenta o jornalista.
O método de investigação jornalística usado por Wallraff foi
sido criticado desde o início. Muitos adversários ou empresas denunciadas –
como Thyssen e McDonald's – o enfrentaram até por via judicial, mas, salvo
raras exceções, o autor saiu vitorioso dos processos. Desde a publicação de
Cabeça de Turco, o nome Günter Wallraff é sinônimo de jornalismo investigativo
na Alemanha.
Um dos precursores do estilo de Cabeça de Turco foi o
escritor inglês Graham Greene (1904–91). Na crônica "Tocando Realejo"
(1928), em que relata sua perambulação por Hertfordshire disfarçado de mendigo,
ele fez uma espécie de antecipação do jornalismo praticado por Wallraff.
Antes da publicação do livro alemão, também o jornalista
brasileiro José Hamilton Ribeiro já havia usado a técnica do disfarce para
desvendar a realidade dos operários do ABC paulista, em reportagens para a
revista Realidade.
Autoria Maren Hellwege (gh)
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