Carlos Heitor Cony
Nos domingos de Páscoa, como o de hoje, lá no seminário onde
estudei, acordávamos com o coro da “Cavalleria Rusticana”, “Inneggiamo il
Signore è risorto”, um dos mais famosos da lírica de todos os tempos. No rude
cenário de uma aldeia siciliana, o povo se reúne e louva o Senhor, que subiu à
glória do céu. Mal termina o coro pascal, num duelo por causa de mulher, um
homem mata outro.
Não é por falta de exemplos e melodias que a humanidade,
desde Caim, segundo a Bíblia dos judeus e cristãos, convive com a violência e
os baixos instintos, como o ciúme, a cobiça e a inveja. Os momentos de glória
passam depressa e depressa são esquecidos.
Santo Agostinho, falando sobre as prostitutas, e em parte as
absolvendo, dizia que elas sofriam a “nostalgia da virtude”. Creio que também
exista uma nostalgia do vício. Não podemos passar sem um vilão, um demônio no
qual podemos descarregar nossas culpas por causa da perdida inocência.
Deixando de lado outras considerações, vamos aos fatos de
nosso cotidiano, que também pode ser considerado rústico como a ópera de
Mascagni, baseada em peça de Giovanni Verga.
Inútil arrolar os vilões, o assassino nos Estados Unidos que
sem mais nem menos invade escolas e mata jovens alunos. Em termos prosaicos,
aqui no Brasil não podemos passar sem um vilão público, seja Ricardo Teixeira,
seja Carlos Cachoeira.
Isso sem falar no satã da vez, um senador que atuava como um
Catão, denunciando e cobrando moralidade na vida pública.
O que tem a Páscoa com nossas misérias? Somos diariamente
açoitados e crucificados. “Ecce homo”, num vastíssimo plural: eis os homens!
Mesmo assim, e apesar das evidências em contrário, pensamos que um dia
poderemos subir à glória do céu.
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