SEM ALMA
Recuso
meu corpo.
Companheiro desolado
ele foge de sua alma
quando por instantes
a ternura do diabo
me toma.
José Craveirinha.
GULA
Uivam
as suas maldições
as insidiosas hienas
própria sanha.
Rituais
de tão escabrosa gulodice
que até nos esfomeados
aldeões da tragédia
a gula dos quizumbas
se baba nas beiças
das catanas,
dos machados.
José Craveirinha
A BOCA
Jucunda boca
deslabiada a ferozes
júbilos de lâmina
afiada.
Alva dentadura
antónima do riso
às escancaras desde a cilada.
Exotismo de povo flagelado
esse atroz formato
da fala.
SUELTO
No laboratório
o lobo dirige a radioatividade
e concentra o cobalto.
Na igreja
pequenos esqueletos juntam
no catecismo os metacarpos
e rezam.
José Craveirinha
DE PROFUNDIS
Possessos de sangue
em abrenúncios
de gritos
Ao rosnar
da súcia,
em de profundis de facas.
José Craveirinha
José Craveirtinha -- Antologia Poética", organizado por
Ana Mafalda Leite e publicado pela editora da Universidade Federal de Minas
Gerais, na coleção "Poetas de Moçambique".
Fonte: Cláudio Daniel
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