sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

A comercialização da alma





Robert Kurz

Foi-se o tempo em que as pessoas de vez em quando ainda ousavam pensar, envergonhadas, em outra coisa senão na sua própria venalidade e na de seu produto. Cada vez mais os indivíduos se transformam, de fato, naquele "homo economicus" que outrora era uma simples imagem da economia política clássica. Com a economização de todas as esferas da vida, a economização da consciência avançou num grau até havia pouco inconcebível -e isso, graças à globalização, nos quatro cantos do mundo, não só nos centros capitalistas. Quando até mesmo amor e sexualidade, tanto na ciência quanto no cotidiano, são pensados cada vez mais como categorias econômicas e estimados segundo critérios econômicos, a "comercialização da alma" parece irresistível. Não há mais, é lícito pensar, nenhum oásis emocional, cultural ou comunitário alheio às garras econômicas: o cálculo orientado pelo lucro abstrato e a política empresarial de custos perfazem, no início do século 21, todo o circuito da existência. Dessa tendência social à plena economização nasceu, evidentemente, um novo tipo de socialização: o modelo da família nuclear fordista (mãe, pai, um filho, um cachorro, um carro) foi reduzido ao modelo do celibatário pós-moderno assexuado ("mônada hermética", um computador, um celular). Aqui estamos às voltas, em certa medida, com indivíduos-concorrência solitários, municiados de alta tecnologia, que, ao mesmo tempo, regrediram socialmente ao estágio do ego infantil: "Célere, flexível, pronta para o trabalho, egoísta, traiçoeira, superficial" -assim descreve uma revista econômica alemã as qualidades essenciais da chamada "geração @". Pessoas com tal estrutura de caráter e forma de consciência teriam sido consideradas ainda nos anos 70 como perturbadas mentais e habilitadas a um tratamento sociopedagógico; hoje foram alçadas a modelo social. Isso porque somente uma combinação de inteligência tecnicamente reduzida a consertos domésticos, absoluto sangue-frio e imaturidade emocional pode possibilitar que a "adaptação ao mercado" por parte da pessoa chegue a extremos -e é justamente essa norma de conduta que requer o capitalismo global em crise. Não é à toa que se vêem com frequência sempre maior figuras púberes com a máscara do sucesso estampada no rosto. Esses são os supostos "fundadores" do novo empresariado na Internet, que trabalham feito loucos e se identificam com sua empresa a ponto de renunciarem a si mesmos. Regalando-se em suas fantasias de onipotência, imaginam mudar a face do mundo, embora seu conteúdo pessoal seja caracterizado por lastimável banalidade e redunde em efeitos tecnológicos mínimos ou em alguma forma de propaganda sem graça. Com o palavrório de entrevistadores pop, eles se vêem fazendo uma "revolução", ao passo que na verdade são acríticos e conformistas ao extremo perante a ordem dominante, num grau jamais alcançado por nenhuma geração nos últimos 200 anos.

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