terça-feira, 31 de agosto de 2010

O BARULHO DO MAR

Na tarde de domingo, volto ao cemitério velho de Maceió

onde os meus mortos jamais terminam de morrer

de suas mortes tuberculosas e cancerosas

que atravessam a maresia e as constelações

com as suas tosses e gemidos e imprecações

e escarros escuros

e em silêncio os intimo a voltar a esta vida

em que desde a infância eles viviam lentamente

com a amargura dos dias longos colada às suas existências monótonas

e o medo de morrer dos que assistem ao cair da tarde

quando, após a chuva, as tanajuras se espalham

no chão maternal de Alagoas e não podem mais voar.

Digo aos meus mortos: Levantai-vos, voltai a este dia inacabado

que precisa de vós, de vossa tosse persistente e de vossos gestos

enfadados e de vossos passos nas ruas tortas de Maceió. Retornai aos sonhos insípidos

e às janelas abertas sobre o mormaço.



Na tarde de domingo, entre os mausoléus

que parecem suspensos pelo vento

no ar azul

o silêncio dos mortos me diz que eles não voltarão.

Não adianta chamá-los. No lugar em que estão, não há retorno.

Apenas nomes em lápides. Apenas nomes. E o barulho do mar.



© 2009, Lêdo Ivo

From: La Aldea de Sal

Publisher: Calambur, Madrid, 2009

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