(por Luiz Carlos De Oliveira e Silva)
1. A política se faz também por meio de
"narrativas", como se diz hoje em dia. A isto estavam atentos, desde
a fundação da democracia em Atenas, no século V a.C., Sócrates e os sofistas,
cada um a seu modo.
2. O embate que opôs Sócrates e os sofistas tornou-se
célebre devido ao testemunho interessado de Platão, e acabou por se constituir
num dos pilares da Civilização Ocidental.
3. Pode-se dizer que Sócrates é o pai da confiança de que
uma narrativa verdadeira é possível, e desejável, enquanto os sofistas são os
pais da compreensão de que “tudo são narrativas em disputa”, como se diz
atualmente.
4. Para os que consideram que “tudo são narrativas em
disputa”, tanto na Antiguidade como na atualidade, a Verdade não é, nem pode
ser, a medida dos discursos, e sim a sua eficácia em produzir efeitos na
consciência dos indivíduos e das coletividades.
5. Para Sócrates, a medida do discurso, pelo contrário, deve
ser a Verdade, porque só deste modo poder-se-ia produzir subjetividades
potentes e livres, situação a que todos deveriam almejar.
6. Podemos dizer que os sofistas foram derrotados – porque o
Ocidente fez da Verdade o seu valor supremo –, e submergiram nas trevas do
recalque histórico por séculos. A concepção de que a Verdade é o valor supremo
fez fortuna no Ocidente, onde descreveu uma história. Inicialmente ela foi
concebida como conceito filosófico, depois se transformou em experiência
religiosa, em seguida constituiu-se como critério da ciência para, por fim,
desaparecer do horizonte histórico.
7. O desaparecimento do valor Verdade como o valor supremo
foi anunciado por Nietzsche, na segunda metade do século XIX, como a “morte de
Deus”.
8. A “morte de Deus” abriu campos extraordinariamente
férteis para a criatividade humana, inclusive no terreno da religião, mas
possibilitou o retorno, com força inaudita, do que esteve recalcado durante
todos esses séculos: os sofistas e a sofística.
9. A “morte de Deus”, isto é, o desaparecimento do valor
Verdade como o valor supremo, tornou possível, dentre outras coisas muitos
positivas, práticas baseadas nos piores aspectos da sofística: marketing
político, imprensa pós-factual, fake News etc., tudo o que poderíamos resumir
pela expressão “pós-verdade”.
10. João Santana e Mônica Moura são marqueteiros políticos.
Eles que, com seus sortilégios de mágicos de circo mambembe, estariam agora,
com suas “delações premiadas”, falando a verdade?
11. Profissionais da mentira baseada no cálculo do frio interesse
que são não estariam agora sendo nada mais do que marqueteiros de si mesmos?
Afinal, “tudo são narrativas em disputa”?
12. Nunca saberemos por que já não é mais possível saber.
Deus morreu... O verdadeiro e o falso se interpenetram e se amalgamam num todo
viscoso, colorido e sedutor.
13. Sócrates e os socráticos venceram os sofistas e a
sofística. Mas, apesar da duração, não foi uma vitória cabal, porque não se
pode derrotar cabalmente o que pertence à nossa essência. Os derrotados estão
de volta, mais vivos do que nunca. E nós não temos mais a Verdade para
combatê-los...
14. A única Verdade que nos sobrou é a de que o marketing
político é a verdade da política e que “tudo são narrativas em disputa”.
15. Deus morreu e levou consigo a Verdade... Para o bem e
para o mal. Como combater a sofística sem o recurso à Verdade? Esta é a tarefa
que se impõe....
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