Saragoça da Mata.....Jornal I...15 de agosto de 2014
"Quando se entrega o poder a demagogos e charlatães
(?), as instituições constitucionais e democráticas desaparecem tão depressa
como a confiança nas autoridades porque já ninguém acredita nelas"1
Um dos importantes livros escrito no novo milénio é uma pequena
obra de apenas 78 páginas com o título "O eterno retorno do
fascismo". O seu autor é um escritor Holandês: Rob Riemen. O pensamento
que Riemen verteu nessa obra pode suscitar discordâncias no que respeita à
origem do fenómeno que analisa. Mas há uma questão relativamente à qual nenhuma
dúvida pode remanescer seja em quem for: é na acuidade da análise feita por
Riemen ao momento cultural que vivemos. E consequentemente no acerto da leitura
que apresenta sobre o estado calamitoso (numa perspectiva de evolução da
civilização e de tutela dos direitos humanos) da política europeia e mundial.
É um livro que se devora em poucas horas, sem se imaginar
que se revisitará vezes sem conta. Com efeito, a cada nova convulsão
internacional, cabe reler Riemen. A cada nova crise política portuguesa,
impõe-se conferir Riemen. Perante o conhecimento do que fez a política e o
poder económico em Portugal nas últimas décadas, não pode deixar de se reler
Riemen. A cada novo anúncio do governo em matéria de "cortes", lá nos
vem Riemen ao pensamento. E com ele, Robert O. Paxton, autor da obra "A
anatomia do fascismo", de 2004, que Riemen cita.
E porque é sempre melhor ler o original do que uma tímida
recensão que triangule o pensamento do autor, peço ao leitor que julgue por si
mesmo:
a) "... no século XXI, nenhum fascista se designará a
si próprio como tal. (...) o fascismo, devido à sua angustiante falta de ideias
e ausência de valores universais, assumirá sempre a forma e as cores do seu
tempo e da sua cultura. (...). A técnica usada é idêntica em toda a parte: um
líder carismático, populista, para mobilizar as massas; o seu próprio grupo é
sempre vítima (das crises, da elite ou dos estrangeiros); o ressentimento
orienta-se todo para um 'inimigo'. O fascismo não necessita de um partido
democrático cujos membros sejam individualmente responsáveis; necessita de um
líder inspirador e autoritário ao qual se atribuem instintos superiores (...).
O contexto em que esta forma de política pode dominar é o de uma sociedade de
massas afectada pela crise que ainda não aprendeu as lições do século XX"
(pp. 72-73);
b)"Quando se entrega o poder a demagogos e charlatães,
que usam os mass media para cultivar a crença de que esse líder (...) é a única
pessoa capaz de salvar o país, as instituições constitucionais e democráticas
desaparecem tão depressa como a confiança nas autoridades porque já ninguém
acredita nelas" (p. 71).
"O eterno retorno do fascismo" é uma obra de tal
dimensão que deveria ser-lhe consagrada leitura obrigatória e acompanhada em
todos os canais televisivos nacionais à mesma hora do mesmo dia de semana,
assim tentando"obrigar" os telespectadores a ouvir o que Riemen
escreveu... para ver se acordam a tempo de exercer a soberania que o Direito
diz caber-lhes. Ou então, mais alienadamente, fazerem zapping para a Sport TV
ou jogarem Candy Crush, porque viver sem pensar é seguramente menos doloroso!
1 Rob Riemen, O eterno retorno do fascismo, Ed. Bizâncio,
Lisboa, 2012, p. 71.
Advogado
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