Todos os anos exterminamos comunidades indígenas, milhares
de hectares de florestas e até inúmeras palavras das nossas línguas. A cada
minuto extinguimos uma espécie de aves e alguém em algum lugar recôndito
contempla pela última vez na Terra uma determinada flor. Konrad Lorenz não se
enganou ao dizer que somos o elo perdido entre o macaco e o ser humano. Somos
isso, uma espécie que gira sem encontrar o seu horizonte, um projeto por
concluir. Falou-se bastante ultimamente do genoma e, ao que parece, a única
coisa que nos distancia na realidade dos animais é a nossa capacidade de
esperança. Produzimos uma cultura de devastação baseada muitas vezes no engano
da superioridade das raças, dos deuses, e sustentada pela desumanidade do poder
econômico. Sempre me pareceu incrível que uma sociedade tão pragmática como a
ocidental tenha deificado coisas abstratas como esse papel chamado dinheiro e uma
cadeia de imagens efêmeras. Devemos fortalecer, como tantas vezes disse, a
tribo da sensibilidade...
José Saramago, in 'Revista Universidad de Antioquia (2001)'
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