Sábio é o que se contenta com o espetáculo do mundo,
E ao beber nem recorda
Que já bebeu na vida,
Para quem tudo é novo
E imarcescível sempre.
Coroem-no pâmpanos, ou heras, ou rosas volúteis,
Ele sabe que a vida
Passa por ele e tanto
Corta à flor como a ele
De Átropos a tesoura.
Mas ele sabe fazer que a cor do vinho esconda isto,
Que o seu sabor orgíaco
Apague o gosto às horas,
Como a uma voz chorando
O passar das bacantes.
E ele espera, contente quase e bebedor tranqüilo,
E apenas desejando
Num desejo mal tido
Que a abominável onda
O não molhe tão cedo.
- Ricardo Reis [Heterônimo de Fernando Pessoa], (escrito em 19.06.1914), In
Poesia, Assírio e Alvim, ed. Manuela Parreira da Silva, 2000
Poemas escolhidos de Fernando Pessoa: http://www.elfikurten.com.br/2013/01/fernando-pessoa-o-poeta-de-multiplos-eus_30.ht
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