NON HABEMUS PAPAM
Já que dizem que a vida imita a arte outros dizem que
arte imita a vida, é impossivel não relacionar a auto exoneração do Papa Bento
16 com o filme- “ Habemus Papam”- de Nani Moretti, que ganhou a Palma de Ouro
em Canes em 2001. No Brasil, esse país que se gaba de ser o maior país católico
do mundo, o filme passou quase desapercebido. Os críticos bem que assinalaram as
virtudes da película, discutiram a comédia, a farsa, enfim, aquela crítica
quase fraternal e como Moretti brincou com a sucessão papal.
Os exibidores deveriam relançar o filme. Ou quem não o
viu deveria procurar o DVD. É uma instigante diversão. Tive a sorte de
assisti-lo numa circunstância especial- na Itália, depois de revisitar a Capela
Sixtina e o próprio Vaticano. Tudo ficou muito familiar, aliás, como ocorre com
o olhar italiano, para quem o Vaticano é território deles. Afinal, há 20
séculos que a maioria dos papas é italiana e tudo o que ocorre entre aquelas
cúpulas e colunas interessa a católicos ou não.
Não é exatamente que o filme seja profético, mas tem
tudo a ver com o momento que vivemos, Quem faz o papel de papa é Michel
Piccoli, que coincidente, tinha a mesma idade do renunciante Bento 16, ou seja,
85 anos, Reconstrói-se toda atmosfera do Vaticano, dos cardeais reunidos, a
fumaça anunciatória, o povo esperando pela aparição do eleito. Contudo, o novo
papa escolhido não se julga digno da eleição. Quer dizer, simetricamente
contrário ao que acontece com Bento 16, ele renuncia antes de aceitar o cargo.
Uma das coisas ousadas do filme é tratar das razões
porque o papa não quer assumir. Chegam a chamar um psicanalista, o mais famoso
do país. E o papa é submetido a várias sessões de análise. Não deixa de ser
irônico: aquele que ouve confissões de todos, acaba necessitando de um
confessor fora de sua grei, da cidade dos homens. Quem muito ouvia deve ter
muito que falar. Mas que perguntas fazer ao Papa? Pode-se perguntar a ele as
perguntas feitas aos simples mortais?
E o filme deriva para outras coisas insólitas. Levam o
papa em crise para for a do Vaticano, em busca até de uma mulher como
terapeuta. Ele vai a lugares em que geralmente não se espera um papa:
lanchonetes, hotel modesdo e até um teatro onde interpretam “A gaivota”de Anton
Tchecov .( Peça que tem algo a ver com a situação do papa).
O anúncio da eleição do papa, portanto, demora vários
dias. O homem não quer o poder e o povo não pode saber disto. Enquanto isto, do
lado de for a, os fiéis esperam fervorosamente. Mas do lado de dentro o colégio
de cardeais entrega-se a jogar volei, matar tempo e discutir os desígníos da
igreja.
O filme tem também algo de especulativo, muito
semelhante ao que ocorre nesses dias em que as pessoas imaginam quem sucederá
Bento XVI. Será um africano? Muitos acham que a hora é de um preto no Vaticano.
Depois de Obama nos Estados Unidos, isto seria uma sequência natural. E além do
mais, traria a África para o foco das atenções. Ou será a vez de um índio da
América Latina, já que este continente se desenvolve enquanto a Europa está em
crise?
Ora, a especulação dentro e fora do fiilme é
pertinente. Se já tivemos um papa que veio do mundo comunista ( Karol Wojtyla)
, se tivemos um papa que conheceu a história nazista (Joseph Ratznger), por que
não especular sobre outras variantes?
Há quem vislumbre que no futuro poderá haver uma
papisa, conforme a lenda do século XIII sobre Joana a Papisa. Dizem alguns
especuladores e historiadores que no Vaticano haveria a “cadeira gestatória”na
qual se verificaria se o papa tem orgãos sexuais masculinos ou femininos
.Aliás, as feministas e muita gente não entende porque as mulheres continuam em
segundo plano na hierarquia católica.
Enfim, aguardemos. Ou assistindo o filme ou esperando
que a quaresma acabe e a eleição do novo papa nos traga surpresas, Ou não.
(Estado de Minas.Correio Braziliense-17.02.2013)
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